Ato lança Comitê de apoio à Papanduva

Foi lançado, na última quarta-feira, dia 25, o Comitê Unificado Papanduva – Pela Restituição das Terras Invadidas pelo Exército, uma articulação entre entidades do campo e da cidade que busca corrigir uma arbitrariedade cometida pela ditadura militar e que até hoje ainda não foi reparada.

O ato de lançamento do Comitê aconteceu no Centro de Cultura e Eventos da UFSC e reuniu cerca de 300 pessoas. Representantes das famílias acampadas em Irineópolis, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Movimento das Mulheres Camponesas e de outras entidades, que participaram da ocupação realizada em Papanduva no dia 15 de abril, fizeram seus relatos sobre os acontecimentos daquele dia, quando o Exército mobilizou tanques e carros blindados para enfrentar os sem-terra.

Para o coordenador nacional do MST, João Pedro Stédile, que participou do ato, Papanduva é uma herança da ditadura militar. “Parece que lá não houve a luta pelas diretas, pela redemocratização, que não houve eleições para presidente”. Para ele, a solução para a questão é uma dívida moral do Exército para com o povo de Santa Catarina. Stédile considera ainda que a situação revela o tamanho do desmonte do Estado feito pelas políticas neoliberais. “O fato de ter que arrendar terra para arrecadar algum dinheiro, demonstra a falência do Exército”, ressaltou. O coordenador do MST destacou ainda que a briga do movimento não é com as Forças Armadas. “Queremos apenas que esse erro histórico seja reconhecido e reparado”, disse Stédile.

Ele entende que a tarefa do Exército não é expulsar os agricultores de Papanduva, mas expulsar as empresas estrangeiras de celulose que compraram 60 mil hectares na fronteira do Rio Grande do Sul com a Argentina e a seita do reverendo Moon que adquiriu milhares de hectares na fronteira do Mato Grosso do Sul com o Paraguai, o que é expressamente proibido pela Constituição. brasileira.

Calcula-se que a área tem cerca de 13 mil hectares. Parte dela pertencia à Lumber, empresa do grupo de Percival Farquar, que teve participação decisiva na Guerra do Contestado. O Exército herdou a área, em 1952, e instalou o Campo de Instrução Marechal Hermes. Como o tamanho foi considerado insuficiente, o Exército desapropriou, em 1956, 7.595 hectares pertencentes a 89 famílias. O decreto de desapropriação continha uma série de irregularidades, como a ausência da localização exata da área expropriada, o que impedia o cálculo correto das indenizações e passou a ser contestado judicialmente pelos proprietários das terras.

O Exército passou a pressionar diretamente os agricultores, até que em 1963 a Justiça concedeu a posse provisória da área à instituição. Com o golpe militar de 1964, a situação das famílias ficou ainda mais complicada e elas passaram a ser reprimidas de forma mais violenta pelo Exército sempre que tentavam reaver suas terras. Enquanto isso, partes da área eram cedidas, de forma irregular, para grandes fazendeiros da região. Os agricultores, no entanto, nunca desistiram de lutar por seus direitos e mantêm os acampamentos e as manifestações desde a década de 1970.

AULA INAUGURAL – Depois do lançamento do Comitê, foi realizada a aula inaugural do cursos de especialização em Agroecologia e Educação Camponesa, parcerias do Centro de Ciências Agrárias (CCA) e do Centro de Educação (CED), respectivamente, com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o MST. Sob o tema “segurança alimentar e soberania nacional”, o coordenador do MST, João Pedro Stédile, ministrou uma palestra no auditório principal do Centro de Cultura e Eventos da UFSC.

Stédile destacou que o modelo neoliberal implementado no Brasil a partir dos anos 90 teve conseqüências nefastas para a universidade, afastando-a do povo, além de afetar o debate de idéias dentro da instituição. Para ele, o MST tem lutado para conquistar espaço e hoje conta com 42 convênios com universidades.

O coordenador destacou, no entanto, que esses convênios não são fruto de uma política da universidade. São marginais, resultado do empenho pessoal de muitos professores e militantes, e mesmo depois de implantados, precisam enfrentar uma batalha diária para funcionar, porque são boicotados sistematicamente por parte da burocracia acadêmica.