Violência na UFSC: nada justifica

Em um ano, ocorreram quatro casos de estupro no campus

Quinta feira, dia 26 de abril, um estupro violentíssimo ocorreu na UFSC. Uma moça de 25 anos estava andando (à noite) na trilha que fica atrás do RU em direção à ELASE foi barbaramente violentada por três rapazes. Houve luta corporal, a vítima desmaiou e foi encontrada por um vigia em estado de choque deitada numa vala toda enlameada pela chuva, com um braço quebrado, e uma garrafa de detergente dentro da vagina.

Um ato de extrema violência! No prazo de um ano foram registrados quatro casos de estupro na UFSC ! Este fato nos leva a refletir sobre dois pontos: 1. a barbaridade que é um ato de estupro e a importância das vítimas darem queixa e recorrerem ao “Protocolo da Violência”, um programa específico para este fim, que existe em Florianópolis. 2. Como está a questão da segurança no Campus da UFSC, uma vez que temos vários cursos noturnos e centenas de estudantes caminhando à noite, pelas trilhas e calçadas?

O estupro é mais que uma forma de violência física. Segundo o dicionário Oxford “estuprar é: tomar à forçad+ cometer estupro contra a mulherd+ arrebatar à forçad+ intercurso sexual forçado ou fraudulento imposto especialmente sobre mulher”. Essas palavras, no entanto, são poucas para explicar o horror, a ira e a controvérsia que ele desperta, mais do que qualquer crime violento. O ultraje que um caso de estupro traz à tona basta para indicar que percebemos que a violação vai muito além do corpo apenas. O estupro realmente despersonaliza, e a ofensa do ato é multiplicada porque, em nossa cultura, a identidade sexual é considerada parte importante de nossa identidade pessoal. Portanto, o estupro é uma infração extrema do direito à liberdade sexual de qualquer pessoa.

No Brasil, a cada 15 segundos uma mulher é espancada pelo marido ou companheiro. Mais de 70% dos incidentes violentos são de espancamentos de mulheres por seus companheiros, que escapam de penas alegando ter agido “sob forte emoção”. São registrados 15 mil estupros por ano no Brasil. Oitenta e quatro bilhões anuais, ou seja, mais de 10,5% do PIB brasileiro, são gastos com os problemas decorrentes da violência contra a mulher. A tentativa de suicídio é três vezes mais freqüente em mulheres agredidasd+ uma em cada cinco dias de falta ao trabalho é causado pela violência contra as mulheres dentro de suas casasd+ a violência doméstica faz com que a mulher perca um ano de vida saudável, a cada cinco anos. O estupro está caracterizado como um medo feminino e, pelas estatísticas atuais, de cada cinco mulheres, uma será vitima ou sofrerá uma tentativa de estupro até o final de sua vida (Fórum Estadual Lei Maria da Penha, 2007).

O estupro causa um trauma muitas vezes irreversível na vítima. Portanto, é imprescindível que o sistema legal, os serviços públicos de saúde e outros tipos de políticas públicas para mulheres vítimas de violência estejam disponíveis para que a pessoa tenha a quem recorrer. Em Florianópolis, temos o “Protocolo da Violência”, que funciona junto ao Hospital Universitário e à Maternidade Carmela Dutra. Ali, a pessoa vítima de estupro recebe acompanhamento direto, desde atendimento médico, exames de HIV/AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis, prevenção da gravidez, até o registro do Boletim de Ocorrência. Com a aprovação da Lei Maria da Penha em agosto de 2006, agora violência sexual é crime, os agressores são presos e sofrem penas severas, mas muitas mulheres ainda não têm coragem de denunciar. É importante que as pessoas vítimas de estupro denunciem e saibam da existência dos serviços disponíveis como o Protocolo da Violência e recorram a eles sempre que necessário.

Em relação à Segurança do Campus Universitário, no ano 2002 foi criado um Fórum sobre a Violência sob iniciativa do Sintufsc, pois desde aquela época já estavam acontecendo casos de estupro, roubo e tráfico de drogas no Campus, mas o Fórum não vingou por falta de integrantes e falta de apoio da reitoria. A maioria das pessoas que compareciam às reuniões do Fórum tinha alguma questão pessoal a resolver: o meu carro foi roubado, a minha bolsa, a minha segurança… Poucos estavam preocupados com o coletivo e por este motivo o Fórum não foi adiante.

Ao percorrer o Campus à noite, constata-se que vários locais de passagem dos estudantes que saem das aulas do curso noturno estão sem iluminação. Já foram ventiladas propostas de utilizar a energia solar como fonte de iluminação e outras sugestões que não foram colocadas em prática.

Uma conhecida jornalista da UFSC que participou do Fórum de Segurança informou-nos que os trabalhadores da segurança no Campus, são seguranças patrimoniais, portanto, sua função – e para isso são capacitados – é cuidar do patrimônio da UFSC, o patrimônio físico, bem entendido, de coisas, móveis, prédios, etc., e não de pessoas. Por conta disso, eles não estão capacitados para lidar com questões como estupro, agressões, roubo de automóveis, etc. Os poucos seguranças que se preocupam com estas questões vivem angustiados porque a regra é esta: se eles vêem alguém roubando um carro não podem agir! Alguns de nossos seguranças, inclusive, respondem a processo na justiça por terem algemado pessoas que estavam roubando. Isso é proibido aos seguranças patrimoniais!

Geralmente pensa-se em segurança quando acontecem casos pontuais como este estupro no campus. É importante nos conscientizarmos que as reações não devem ser pontuais, que as coisas acontecem todos os dias, violências de todo tipo, por isso há que haver uma reflexão permanente e proposições factíveis! Portanto, sugiro que levantemos uma bandeira aqui na UFSC: uma política de segurança voltada a proteção das pessoas e não somente dos materiais e bens patrimoniaisd+ mais iluminação nos caminhos, trilhas, pontos de ônibus no Campus da UFSC e treinamento para os vigilantes ficarem mais atentos para as pessoas que transitam pelo Campus, principalmente no período noturno!

Infelizmente este estupro não é um caso isolado. Sobre as mulheres paira sempre a ameaça da violência masculina. Sem mudanças radicais na cultura e na subjetividade humana quanto as relações de gênero não corrigiremos nunca esta dramática situação que torna as mulheres objetos do ataque masculino. Uma universidade é lugar onde se forjam novas tecnologias e novos padrões de sociabilidade. Cabe iniciar uma campanha permanente contra o sexismo e a violência nas relações entre homens e muheres, de forma a desconstruir as representações estereotipadas que alimentam o predador comportamento masculino e impedem as mulheres caminharem livremente a qualquer hora e de qualquer jeito pelos trajetos que traçarem.