Modelo de Guedes, governo do Chile teve que reformular projeto após protestos

Piñera propõe aumentar impostos dos mais ricos, taxar propriedades imobiliárias, aumentar aposentadoria dos mais pobres e implementar renda mínima

Nova reforma tributária no Chile prevê aumentar alíquota de imposto de renda de 35% para 40% para quem ganha acima de US$ 20 mil e a criação de sobretaxa sobre patrimônio imobiliário de mais US$ 532 mil. O presidente do Chile, Sebastián Piñera, enviou na quarta-feira (18) ao Congresso novo projeto de reforma tributária, reformulado após os protestos que começaram em outubro.

Dentre os pontos mais importantes estão elevação da alíquota de imposto de renda de 35% para 40% para quem ganha acima de 15 milhões de pesos chilenos (US$ 20 mil), a criação de sobretaxa sobre patrimônio imobiliário de mais de 400 milhões de pesos (cerca de US$ 532.127) e a manutenção para pequenas e médias empresas da chamada integração, quando se abate o IR devido pela pessoa física do IR pago pela pessoa jurídica.

Tudo o que era o centro da reforma tributária proposta por Piñera na campanha eleitoral em 2017 teve de ser substituído por outros pontos, afirma Patricio Rojas, da consultoria Rojas Jimenez & Associados Economistas. “Além de manter a integração da declaração do IR para grandes empresas, elevou a alíquota do IR para os mais ricos e incluiu imposto sobre patrimônio”, disse. “A ideia é aumentar a progressividade do sistema tributário.”

A agenda de Piñera antes dos protestos era uma e hoje é outra, afirma Eugenio Rivera, diretor do centro de estudos Chile 21. “Se antes falava em reduzir a alíquota de IR das empresas de 27% para 25%, depois teve de abrir mão da ideia e se sentar com a oposição para chegar a uma nova reforma tributária que taxasse os mais ricos”, diz.

Rivera lembra também que está em debate diminuir isenções como a ganhos de capital, o que poderia gerar US$ 800 milhões anuais, aumentar o imposto sobre o valor agregado (IVA) hoje em 19%, obrigar empresas a investir 1% do total dos investimentos na região onde operam, e criar um imposto a plataformas como Netflix e Spotify. “A oposição pressiona ainda para aumentar a carga tributária do Chile de 20,4% atuais para 25% do PIB”, acrescenta, ao lembrar que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da qual o Chile faz parte, é de cerca de 34%.

Hoje a agenda de Piñera dista bastante do que foi proposto antes de ele ser reeleito, em 2017. “As prioridades são completamente distintas, com medidas sociais muito mais presentes, como o aumento de aposentadorias para os mais pobres e debate sobre a implementação de uma renda mínima”, diz. “Outro ponto é em relação à possibilidade de reforma constitucional, que não estava nos planos do presidente.”

Rojas argumenta, no entanto, que a nova reforma tributária que começa a tramitar no Congresso chileno dificilmente cobrirá o aumento dos gastos que as novas medidas sociais implicam. Ele alerta para o risco de aumento do déficit orçamentário, ao redor de 2,1% do PIB hoje, assim como da dívida pública, em cerca de 30% do PIB.

Até agora, afirma, o total de recursos que a agenda social demandará permanentemente é de US$ 3,5 bilhões anuais, afirma. A reforma tributária que começará a ser debatida prevê arrecadação de US$ 2,3 bilhões até 2023.

“O governo terá de buscar maneiras de aumentar a arrecadação porque dinheiro vai faltar de qualquer maneira”, diz. “É uma situação bastante complicada. A sustentabilidade fiscal está em jogo.”

O aumento dos gastos sociais representa uma quebra em relação à agenda conservadora e fiscalmente prudente de Piñera, afirma Quinn Markwith, da consultoria Capital Economics.

“O governo não cumprirá as metas fiscais às quais se propôs a cumprir no início de seu mandato, o que é uma grande mudança do ponto de vista econômico”, diz. “Hoje Piñera busca algo completamente diferente do que prometeu, ao expandir os gastos em vez de consolidar o orçamento.”

Os detalhes finais da agenda social estão sendo discutidos entre governo e oposição e devem ser anunciados entre a última semana de dezembro e a primeira de janeiro.

Valor Econômico