MEC estuda adotar ‘CVM’ para fiscalizar universidades privadas

Ideia reforça o modelo de autorregulação do mercado financeiro aplicado no ensino superior privado, defendido por Weintraub

Com experiência de duas décadas nos bancos Votorantim e Andbak, o economista e novo secretário de ensino superior do Ministério da Educação (MEC), Ricardo Braga, acredita que o modelo de autorregulação do mercado financeiro pode ser replicado no ensino superior privado. O tema, que já causou racha entre grupos educacionais, é sua prioridade neste ano.

“A autorregulação no mercado financeiro, na minha opinião, funciona muito bem”, diz Braga, que tomou posse em novembro. Foi indicado pelo ministro de Educação, Abraham Weintraub, com quem trabalhou no banco Votorantim, entre 1997 a 2012.

A ideia de Braga é que sejam criados órgãos como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e BSM, empresa da B3 que faz supervisão do mercado financeiro, para fiscalizar as instituições de ensino superior. Esses órgãos poderiam ser entidades independentes como há em outros países. Ou a própria Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres) do MEC, que hoje é responsável por todos os despachos burocráticos, poderia desempenhar o papel da CVM. A segunda opção é preferida do secretário.

Os trabalhos de fiscalização e aprovação de processos, por exemplo, poderiam ser transferidos a um agente externo. Mas, na visão de Braga, “as normas políticas, o desenvolvimento do setor e a última instância sempre ficam com o governo. Isso não pode sair”.

O MEC encomendou à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e para a Unesco estudos sobre as experiências internacionais de autorregulação, regulação e supervisão no ensino superior. Mas ainda não há uma data de quando serão concluídos. Eventuais mudanças poderão ser implementas via portaria ou projetos de lei.

Segundo Braga, o setor privado será convidado a apresentar suas ideias e participar do processo.

Enquanto os estudos não ficam prontos, Braga diz que pretende mudar e melhorar os fluxos dos processos internos para que eles sejam mais rápidos. Uma das principais reclamações do setor é a lentidão da Seres para analisar os pleitos das instituições de ensino para, por exemplo, abrir cursos novos ou expandir um campus.

Questionado sobre uma proposta de decreto assinada por Weintraub, que eliminava exigências para a abertura de novos cursos – como a presença de mestres e doutores, a avaliação prévia do MEC e a redução de carga horária miníma -, Braga disse desconhecer o assunto, que circulou no mercado no ano passado. Segundo fontes do setor, o ministro desistiu da ideia do decreto porque demandaria grandes mudanças regulatórias. Passou, então, a defender a autorregulação no ensino superior. “A oportunidade é gigantesca. Vocês estão diante de um governo liberal”, disse o ministro, em setembro do ano passado, durante evento do Semesp, sindicato das instituições privadas.

Ainda de acordo com fontes, a fala de Weintraub defendendo a autorregulação levou alguns interlocutores do setor a se movimentarem novamente no sentido de tentar uma flexibilização mais ampla nos moldes da proposta do decreto. No entanto, outros grupos vêm se opondo à desregulamentação mais radical com o argumento de que as medidas poderiam provocar queda na qualidade do ensino.

Em outros países como Chile e Colômbia, a autorregulação não levou a uma melhora na qualidade do ensino. Fábio Reis, diretor do Semesp, chegou a escrever um artigo sobre o tema. Em um trecho, ele diz: “No Chile, em 1980, houve uma mudança na legislação educacional, realizada pelo governo militar liberal de Augusto Pinochet. Uma das intenções era fortalecer a autorregulação, com maior autonomia e pouca interferência acadêmica e administrativa do Estado na organização das IES. Segundo José Maria Lemaitre, essa atitude gerou um avanço do sistema privado, o que não é um problema. Todavia, esse setor não se mostrou comprometido com parâmetros de qualidade que já estavam consolidados. Da mesma forma, a legitimidade das instituições privadas passou a ser questionada pela sociedade”.

Leia na íntegra: Valor Econômico