Presidente da SBPC fala sobre versão virtual da Marcha pela Ciência

Ildeu de Castro concedeu entrevista à revista Scientific American Brasil sobre o evento do dia 7 de maio; confira

No próximo dia 7 de maio acontecerá a Marcha Virtual pela Ciência, uma edição digital da já tradicional Marcha pela Ciência que tem sido feita no mês de maio nos últimos anos. A manifestação é organizada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), com o apoio de mais de 80 entidades de todo o país. Durante todo o dia 7, diversas atividades serão transmitidas pelas redes sociais, a fim de chamar a atenção para a importância da ciência no enfrentamento da pandemia de COVID-19. A Apufsc vai participar com uma live às 9 horas na página do Facebook no sindicato.

A Scientific American Brasil conversou com o presidente da SBPC, o físico Ildeu de Castro, sobre o evento. Uma transcrição editada da conversa segue-se abaixo.

Por que fazer a marcha  nesse momento?

Nós temos uma tradição de chamar uma marcha pela ciência no mês de maio. Fizemos isso nos últimos dois anos. É uma iniciativa que começou nos Estados Unidos, uma marcha para resgatar a importância da ciência para a sociedade, para o contexto maior econômico social do país.

Estávamos pensando em fazer essa marcha esse ano mas, obviamente, por conta da pandemia a situação mudou radicalmente. Decidimos mantê-la como uma marcha virtual pela ciência, e agora evidentemente com o coronavírus atingindo profundamente o mundo, e em particular o Brasil, decidimos colocar como tema central o enfrentamento da pandemia, e também como a ciência pode ajudar no enfrentamento dessa crise.

Esse ano a marcha também está vinculada a um manifesto, que é o pacto pela vida e pelo Brasil.

As duas coisas são diferentes. O pacto pela vida e pelo Brasil foi feito por várias entidades, dentre as quais CNPQ, OAB, ABI, CNBB, Comissão Arns, Academia Brasileira de Ciências e CPC, no sentido mais geral para o país. Essa iniciativa de discutir realmente um pacto pela vida no sentido de enfrentar essa pandemia que está matando brasileiros, matando gente pelo mundo inteiro. E também a preocupação pelo Brasil, com a questão da economia, os efeitos que ela traz. Ela acirra as desigualdades sociais, as camadas desprotegidas da sociedade estão sofrendo muito.

Como a SBPC ia organizar a marcha, e esse termo pacto pela vida é algo importante relacionado à ciência, nós também decidimos absorver na marcha virtual esse lema, #paCTo pela vida, com o ‘c’ e o ‘t’ destacados, simbolizando que a ciência e a tecnologia são parte dele, e podem ajudar muito nesse pacto pela vida.

E como vai funcionar uma marcha virtual?

As atividades já estão acontecendo a todo tempo. Todas as universidades já estão fazendo debates variados, no Brasil inteiro, utilizando a internet, e depois também vamos continuar nisso certamente. No dia 7 em particular vamos ter dois painéis nacionais, um de manhã e outro a tarde, com especialistas discutindo a questão do coronavírus e da pandemia: médicos, pesquisadores, estudiosos explicando  como a pandemia está se propagando, junto com os mais diversos comentaristas especializados.

Na parte da tarde vamos discutir mais a situação da ciência brasileira. Em particular, o financiamento:  como  está a situação que estamos vivendo. E diversos estados ou instituições estão organizando também atividades em outros horários, e nós estamos convidando as pessoas também, ao meio dia.

No final da tarde nós vamos fazer um twittaço com essas palavras fortes da marcha: ‘fica em casa’, ‘consciência’, ‘paCTo pela vida’, ‘investimento é essencial’, ‘ciência é essencial’.

Também vamos ver se conseguimos reproduzir uma coisa que surgiu agora na Europa:  uma manifestação virtual. Estamos vendo como fazer. Já temos o aplicativo desenvolvido na França, que permite que as pessoas se coloquem como se estivessem  em uma manifestação pública, por exemplo no Congresso Nacional, ou na Cinelândia, ou na Avenida Paulista, mas virtualmente. Ela leva sua bandeira, leva sua palavra, se coloca lá,  faz uma adesão política aquela manifestação. Mas virtualmente. A ideia é debater com a sociedade brasileira como enfrentar a crise do coronavírus que estamos vivendo, que é  uma crise sanitária e também , uma crise econômica. E ver como é que a ciência e a tecnologia também são um instrumento importante, os profissionais de ciência e os profissionais de saúde, nesse momento em particular.

No Brasil, o enfrentamento da pandemia está sendo marcado pelo debate  entre a necessidade de combater o vírus através da ciência, e uma grande pressão para evitar um aprofundamento da crise econômica. Quais devem ser os caminhos para superar essa visão dual do debate?

É real que uma pandemia desse tipo afeta profundamente a economia. Muitas medidas tomadas para prevenir o contágio, para segurar o crescimento muito acelerado que explodiria o sistema de saúde, como já está acontecendo em algumas cidades brasileiras, e como já acontece em alguns países do mundo, restringem o funcionamento de parte da economia. Isso é real, impacta profundamente.

Em vários países do mundo o Estado tem agido de duas maneiras, uma delas é criando os mecanismos para prevenção. O isolamento social horizontal é um mecanismo sugerido por todos como um dos mais eficientes para conter aquele crescimento excessivo do número de pessoas contagiadas e que necessitam de atendimento médico que explode o sistema de saúde. Outros países tem feito também. O Brasil está muito atrás nisso e não deveria estar, na testagem em massa que permite localizar onde estão as questões mais críticas. Isso vai ser fundamental para a saída do processo do isolamento.

Ao mesmo tempo, [esses países estão tomando] medidas emergenciais para populações que estão profundamente atingidas. As pessoas que dependem do seu trabalho de todo dia. Esse recurso emergencial que está sendo distribuído no Brasil é fundamental para a sobrevivência das pessoas. Inicialmente, o governo tinha proposto 200 R$, depois aumentou para 600R$, que já está sendo pago em parte. Isso é fundamental, assim como as medidas de apoio a pequenas e médias empresas, aos trabalhadores informais.

Os governos têm de investir recursos pensado nisso, porque é a questão de sobrevivência das pessoas. É muito mais importante do que dar recursos para os bancos, que é um setor nos últimos anos que tem ganho muito mais na economia brasileira e do mundo do que qualquer outro.

Nesse momento é até fundamental que essas populações estejam apoiadas. Ou elas não terão condições  de seguir  essas regras fundamentais de isolamento que estão colocadas pela Organização Mundial da Saúde.  Há medidas que tratam das duas questões. Por isso dizemos que é um pacto pela vida: que é importante também para as pessoas sobreviverem porque a economia existe com as pessoas vivas e com saúde, e paralelamente é preciso um apoio sério e significativo por parte do governo, que deve ter  recursos e decisão política para fazê-lo.

Scientific American Brasil