Em carta aberta, professores substitutos da UFSC pedem renovação de contratos

Docentes querem que situação seja levada ao Conselho Universitário, que se reúne nesta sexta; contrato de substitutos não está na pauta

Professores substitutos da UFSC divulgaram nesta quinta-feira (16) uma carta aberta solicitando que seus contratos sejam renovados até 31 de dezembro de 2020 ou enquanto perdurar a situação de calamidade pública em decorrência da pandemia de covid-19. O Conselho Universitário (Cun) fará nesta sexta-feira, 17 de julho, uma reunião para decidir sobre a retomada do ensino na UFSC, mas o assunto não está entre os pontos que serão votados na sessão.  

O manifesto, assinado até o momento por docentes do Centro de Ciências da Educação (CED) e Centro de Comunicação e Expressão (CCE), pede que seja apresentado um posicionamento junto ao Cun para garantir o atendimento da demanda com “extrema urgência”.

Além disso, o documento ressalta que “para cada renovação de contrato tem se observado que a legislação vem sendo interpretada e aplicada de forma diferente” e que as justificativas para a não renovação de contratos têm se restringindo a aspectos burocráticos.

A falta de atividades de pesquisa e extensão por parte dos professores temporários, por exemplo, é apontada como uma das motivações para as não renovações. “Esta não é, no entanto, opção nossa, mas mais um reflexo da falta de isonomia em vários aspectos que envolvem o trabalho do professor substituto e do efetivo, tais como horas aula de ensino, vencimentos conforme titulação, garantias trabalhistas, entre outros”, diz um trecho da carta.

Confira a carta na íntegra:

CARTA ABERTA DOS PROFESSORES SUBSTITUTOS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA SOBRE A SITUAÇÃO DOS CONTRATOS DURANTE A PANDEMIA

A situação de contratos de professores substitutos não consta entre os pontos que serão votados na reunião do Conselho Universitário (CUn) no dia 17 de julho de 2020. Entretanto, compreendemos que não é possível pensar em propostas de retomada das atividades de ensino na UFSC sem levar em consideração a presença destes para tal. Disto decorre esta manifestação dos professores substitutos na expectativa de que seja apresentado um posicionamento junto ao CUn que garanta o atendimento de nossa solicitação com extrema urgência e com a participação destes professores.

Os entraves com relação aos contratos de professores vêm se acumulando no ano de 2020 e são anteriores à situação de calamidade pública declarada. O que temos observado em relação às renovações ou não de contratos é a distância entre decisões administrativas e pedagógicas, pesando o fato de que para cada renovação de contrato tem se observado que a legislação vem sendo interpretada e aplicada de forma diferente. A Instrução Normativa Nº1, de 27 de agosto de 2019, impossibilitou a renovação para alguns professores substitutos com a declaração de que não seria possível alterar a justificativa para qual professor se estava substituindo, mas em outros casos foi possível alterar a justificativa. Além disso, em outras situações não se menciona a normativa, mas se associa as não renovações ao fato de a UFSC “não estar realizando atividades de ensino” neste momento de pandemia.

Temos sido penalizados por não realizarmos atividades de pesquisa e extensão, o que poderia “garantir” as renovações. Esta não é, no entanto, opção nossa, mas mais um reflexo da falta de isonomia em vários aspectos que envolvem o trabalho do professor substituto e do efetivo, tais como horas aula de ensino, vencimentos conforme titulação, garantias trabalhistas, entre outros.

Infelizmente a estrutura da universidade, da forma como se apresenta, amplia o poder discricionário da gestão desta instituição que por vezes não consegue realizar análises fundamentais em relação às renovações de contratos e se limita apenas a aspectos burocráticos, deixando as questões pedagógicas a encargo das chefias que, em geral, não têm condições materiais para suprir as demandas de professores para atender às demandas do ensino. Consequentemente, isso gera sobrecarga de trabalho aos professores, chefias e até mesmo promove situações mais ou menos momentâneas de ausência de professores, como é o caso do curso de Pedagogia em mais de uma disciplina e do Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI) que precisou reorganizar grupos para que todas as crianças matriculadas continuassem sendo atendidas.

As justificativas que nos têm sido apresentadas para a não renovação de contratos têm em geral se restringido a aspectos burocráticos, desconsiderando ou sugerindo desconhecimento, desrespeito e/ou indiferença ao que essencialmente significa o ensino, tanto na educação básica quanto no ensino superior. A questão orçamentária, por exemplo, não se justifica uma vez que, conforme o artigo 8º, inciso IV, da Lei Complementar nº 173/2020, a limitação de gastos públicos com pessoal em razão da calamidade pública decorrente da pandemia de Covid-19 permite excepcionalmente a realização de contratações temporárias. A impossibilidade de troca de justificativa, por sua vez, precariza ainda mais o trabalho de outros professores, que possivelmente precisarão ser responsabilizados pelas aulas/turmas dos professores com contratos rescindidos, comprometendo a formação de nossos estudantes, com prejuízos em seu processo de aprendizagem, podendo levar a desistências e índices de evasão mais acentuados.

Apresentada esta breve contextualização, trazemos alguns questionamentos relativos à possibilidade de não renovação de nossos contratos, são eles:

– Em um cenário em que processos seletivos e homologações de concursos encontram-se suspensos, quem fará contato/ interação/ atividades pedagógicas não presenciais com famílias, crianças e demais estudantes matriculados na educação básica e no ensino superior da UFSC se os professores substitutos destas turmas/ disciplinas não tiverem seus contratos renovados?

– E em um possível retorno presencial? Outros professores precisarão ser contratados, o que além de requerer tempo hábil, desconsidera nós, professores, que já temos contratos em vigor e que poderiam, portanto, ser renovados.

– E a responsabilidade da gestão desta universidade para que não nos somemos aos mais de 12 milhões de desempregados deste país, numa conjuntura em que não é possível sequer ser recolocado no mercado de trabalho, dadas as atuais circunstâncias?

– Ao associar o “não ensino” à justificativa de não renovação, se ignora o fato de que as atividades acadêmicas seguem acontecendo por meio de reuniões diversas, contatos com as famílias e estudantes atendidos na educação básica, grupos de estudos, análises e estudos de relatórios e documentos oficiais, produção de conteúdos importantes para as atividades de ensino. Como professores substitutos também representamos a UFSC em debates, lives e outras atividades remotas durante a pandemia. Também participamos de grupos de pesquisa, para além do previsto em contrato, e contribuímos com a produção de conhecimentos importantíssimos às atividades de ensino.

Temos plena consciência da pressão exercida por diferentes segmentos da sociedade civil, órgãos de controle e até mesmo da própria opinião pública sobre a gestão da universidade e respectivas chefias, centros e departamentos. No entanto, compreendemos que a justificativa de nossas contratações seja para substituir professores efetivos que, por diferentes motivos, encontram-se ausentes. Isto tem se consolidado de forma arbitrária nos centros de ensino onde trabalhamos, inclusive gerando demandas muito intensas às chefias, que muitas vezes precisam recorrer a outros departamentos e centros para “emprestar” vagas. Entendemos também que esta universidade possui um corpo jurídico e técnico/pedagógico capaz de justificar de forma plausível as renovações, baseadas na compreensão ampla do que é ensino e que portanto, para cumprir esta tarefa com qualidade é necessário a presença de professores. Também não parece ético, nem coerente com as políticas da UFSC, que professores substitutos não possam ter seus contratos renovados ou com justificativas alteradas em plena situação excepcional de calamidade pública.

Antecipando possíveis questionamentos de que na iniciativa privada, muitos contratos precisaram ser rescindidos pela conjuntura atual, frente a esta afirmação, argumentamos que não fazemos parte da iniciativa privada e sim de uma instituição pública, onde temos ainda condições mínimas de requerer não só melhores condições de trabalho, como lutar por uma educação pública, gratuita e de qualidade socialmente reconhecida, o que fica impossibilitado na iniciativa privada, frente a ameaça de ser demitido e outro trabalhador substituí-lo. A liberdade para nos manifestarmos e lutarmos por um ensino de qualidade é um dos fatores que gerou e gera conquistas para os trabalhadores desta instituição, bem como contribui para a oferta de ensino de excelência que reconhece a UFSC como 9ª melhor Universidade da América Latina, e a 3ª entre as Universidades Federais.

Deixamos um convite aos gestores e administração direta desta universidade para que participem e dialoguem de forma mais profunda com os diversos grupos de estudo, pesquisa e extensão desta instituição, que tem se debruçado a analisar e apresentar à sociedade diferentes produções sobre a temática do ensino, este que muito superficialmente vem sido reconhecido apenas como atividades diretas de “interação com estudantes”.

Gostaríamos de esclarecer também que optar por não renovar os contratos de professores substitutos na atual conjuntura é corroborar com políticas públicas de desmonte da educação pública de qualidade, pressionando professores para sobrecargas de trabalho, desrespeitando o direito de aprendizagem dos estudantes matriculados nesta instituição. Também trata-se de descaso e indiferença com este grupo de professores substitutos que podem não ter outra forma de suprir suas necessidades básicas, frente ao atual momento que vivemos. Por fim, é uma opção a favor do absurdo e da desumanidade que tem sido ampliada e escancarada ao mundo com a pandemia de COVID-19.

A luta pela sobrevivência num momento em que milhares de vidas têm sido dizimadas, o medo do desconhecido e a falta de certezas em relação ao que sabemos tão bem fazer, que é ensinar, já bastam neste momento! Que não precisemos nos preocupar e adoecer por mais esta ameaça que é o desemprego de professores em situação de pandemia de COVID-19. Por tudo isto que apresentamos, solicitamos que os contratos dos professores substitutos sejam renovados até 31 de dezembro de 2020 ou porquanto perdurar a situação de calamidade pública (aquele que ocorrer depois).

Enfim gostaríamos de tornar pública nossa realidade e que se forem cometidas injustiças, que a comunidade universitária e a sociedade brasileira tenham plena ciência dos fatos que essencialmente se apresentam. Aguardamos que os responsáveis por tais contratações se manifestem, bem como esperamos que a administração central da UFSC aja com compromisso, responsabilidade e respeito para com seus trabalhadores, não nos deixando desassistidos neste momento tão cruel que enfrentamos juntos.

PRECEDENTES LEGAIS

Diante de todo o exposto, deixamos abaixo referências de documentos da legislação que foram analisados para apresentar este manifesto. Nosso objetivo não consiste em violar a autonomia universitária, mas sim solicitar à universidade a adoção, por decisão própria, de medidas burocráticas/administrativas, bem como ocorreu em outras esferas (municipais e do estado de Santa Catarina), para atendimento de nossas demandas porquanto perdurar a situação de calamidade pública ou até 31 de dezembro de 2020 (o que ocorrer depois). Assim sendo, apresentamos a seguinte legislação consultada:

– Lei Complementar nº 173, de 27 de maio 2020 – “Estabelece o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19), altera a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, e dá outras providências.”

– Lei nº 12.314, de 19 de agosto de 2010 – “Altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, 8.745, de 9 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, e 8.029, de 12 de abril de 1990, que dispõe sobre a extinção e dissolução de entidades da administração pública federal; revoga dispositivos da Lei no 10.678, de 23 de maio de 2003; e dá outras providências.”

– Instrução Normativa nº 1, de 27 de agosto de 2019- “ Dispõe sobre critérios e procedimentos gerais para autorização de contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.”

– Lei nº 10.701, de 22 de abril de 2020 – “autoriza o regime especial de atividades de aprendizagens não presenciais para a educação básica da rede municipal de ensino de Florianópolis, para fins de validação da carga horária mínima anual exigida para o cumprimento do ano letivo de 2020, em consonância com a prevenção da pandemia do coronavírus (covid-19) e dá outras providências.”

– Portaria Normativa nº 353/2020/GR- “Estabelece procedimentos e rotinas nas atividades acadêmicas, técnicas e administrativas para atendimento de medidas de contingência frente à emergência de saúde pública decorrente do coronavírus (COVID-19)”.

– Lei nº 17.934, de 24 de abril de 2020- “Altera a Lei nº 16.861, de 2015, que “Disciplina a admissão de pessoal por prazo determinado no âmbito do Magistério Público Estadual, para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, sob regime administrativo especial, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição da República”.

– OFÍCIO CIRCULAR n.° 007/2020/DEN/PROGRAD- “Orientação para renovação e não renovação dos substitutos.” – “Altera a Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, no tocante à contratação de professores.”

Lei nº 12.425, de 17 de Junho de 2011, onde § 1º A contratação de professor substituto de que trata o inciso IV do caput poderá ocorrer para suprir a falta de professor efetivo em razão de: I – vacância do cargo; II – afastamento ou licença, na forma do regulamento; ou III – nomeação para ocupar cargo de direção de reitor, vice-reitor, pró-reitor e diretor de campus.

Assinam esta carta até o momento:

Beatriz Garcia Nunes – NDI/CED

Marilia D Tessarin Watashi- NDI/CED

Carla Brito Sousa Ribeiro – CEM

Mayra Othero Nunes Jardim Mugnaini – NDI/CED

Ti Ochôa – MEN/CED

Mariana Barbosa de Amorim – MEN/CED

Leonardo Victor Marcelino – MEN/CED

Rosilene Silveira – MEN/CED

Ana Carolina Rosa Posuelo de Oliveira – MEN/CED

Éverton Vasconcelos de Almeida – EED-CED

Marcelo Barcelos – DEJOR/CCE

Jessica Gustafson Costa – JOR/CCE

Cristiane Fontinha Miranda – JOR CCE

Maíra Caroline Defendi Oliveira – EDC/CED

Mayra Othero Nunes Jardim Mugnaini – NDI/CED