A crise no Departamento de Serviço Social: uma questão de “interesse público”

O interesse público é princípio basilar da administração pública da qual nós, professores/funcionários públicos federais, formamos parte.

Seguindo os ditames do interesse público e acolhendo um apelo das autoridades da época, em 1999 o Curso de Graduação em Serviço Social duplicou o número de entradas passando a contar com quatro entradas ao ano (duas no período matutino e duas no período noturno) resultando numa ampliação de vagas de 80 para 140 novos acadêmicos. No mesmo sentido da qualificação do ensino público, em 2001 o Departamento de Serviço Social cria o Programa de Pós-Graduação em Serviço Social em nível de Mestrado. Lamentavelmente, durante um longo período, nem a ampliação de vagas na graduação, nem a criação da pós-graduação, foi acompanhada do correspondente processo de expansão do quadro docente, como acordado na época com a Reitoria da UFSC, que deveria ter alcançado o número de 34 professores, acompanhando assim a mencionada expansão de vagas e a criação do Mestrado.

Lembremos que no momento da duplicação do número de entradas o DSS contava com 17 professores efetivos e poucos professores substitutos (de 2 a 4 dependendo do semestre). Com o aumento do número de turmas e alunos, a contratação de professores substitutos se tornou corriqueira chegando, em 2003, ao grave quadro de 12 professores efetivos e 16 professores substitutos.

O tipo de admissão de professores substitutos praticada é uma violação da Lei 7.845/93 e da Portaria Nº 678/GR/98 que estabelece no seu Art. 1 que a contratação de Professor Substituto deverá atender a “necessidade temporária de excepcional interesse público”, em situações específicas: exoneração, demissão, falecimento, aposentadoria, afastamento ou licença de concessão obrigatória de professores efetivos. E estabelece no §2 que essas contratações “ficarão limitadas a 10% do total de cargos docentes das carreiras do magistério na Universidade”. Cabe mencionar que a Portaria número 678/GR/98, no §3, ainda estabelece que a infração do disposto no artigo 1º. importará na responsabilidade administrativa da autoridade contratante e do contratado…”. 

Contudo, o que era para ser em caráter provisório, no Departamento de Serviço Social, virou permanente, naturalizando-se na prática administrativa da Universidade.

Apesar de nos últimos anos o DSS ter aumentado seu quadro docente permanente, em boa parte para repor vagas por aposentadorias, hoje ainda depende da contratação de professores substitutos para dar conta das atividades regulares de ensino. Neste sentido, o DSS não tem deixado de tornar pública a sua situação, nem de reivindicar a necessidade urgente de contratar professores efetivos para sanar o desequilíbrio iniciado em 1999. 

No mês de julho de 2007, ainda antes do início do segundo semestre, depois de ver-se obrigado a invalidar três disciplinas no primeiro semestre devido à saída de dois professores substitutos e a concomitante não autorização por parte da PREG e da PRHS de contratação de novos professores (devido à auditoria do Tribunal de Contas da União – TCU, processo nº. 017.323/2006-6, na UFSC), o DSS se encontrou novamente com o dilema dos substitutos. Nesta ocasião, o Colegiado Departamental deliberou por não resolver a situação mediante a assunção de uma carga horária maior por parte dos professores do quadro permanente.

A situação combinada da crise estrutural do DSS e as conseqüências conjunturais da auditoria do TCU sobre a contratação de substitutos deflagrou uma crise política no DSS e no Curso de graduação em Serviço social. Os estudantes do Curso de Graduação em Assembléia Geral, realizada em 09/08/2007, deliberaram pela não continuidade do ciclo perverso de contratação de professores substitutos para desempenhar funções de professores permanentes e decidiram a paralisação das atividades acadêmicas como forma de pressão.

Em 10 de agosto, contornada a situação deflagrada pelo TCU, a Reitoria libera a contratação dos professores substitutos. Contudo, retomando a exigência de solução permanente da crise estrutural do quadro docente e apoiando o movimento iniciado pelo segmento estudantil, o Colegiado de Departamento de Serviço Social reunido no dia 14 de agosto de 2007, deliberou pela não solicitação de contratação de mais professores substitutos e pela manutenção da distribuição das atividades dos professores efetivos, resultado do qual algumas disciplinas ficariam sem professor. A decisão se fundamentou na defesa da qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão e na recusa à ilegalidade de contratos temporários fora dos casos contemplados na lei 7.845/93. Por sua parte, o segmento estudantil, através do Centro Acadêmico Livre de Serviço Social – CALISS, no dia 17 de agosto de 2007, entrou com pedido de representação junto ao Ministério Público Federal contra a UFSC, protocolo nº. PR/SC-SECAD-004272/2007, solicitando a contratação de professores efetivos. Depois de uma intensa mobilização, os estudantes decidiram retornar às aulas em assembléia realizada em 31 de agosto.

Instalada a situação de crise, em 13 de setembro, é comunicado pela PREG que o DSS não poderia se recusar a alocar professores nas disciplinas já oferecidas para matrícula e que efetivamente tivessem alunos matriculados. Caso contrário será passível das medidas administrativas cabíveis, incluída a possibilidade imediata de intervenção e processos administrativos diversos. Realizada consulta junto à assessoria jurídica da Apufsc, a mesma se pronunciou no mesmo sentido: os professores não poderiam se recusar a garantir as aulas para os alunos matriculados, pois estão obrigados a agir no sentido de assegurar o interesse público maior, que aqui se manifesta no direito dos estudantesd+ no caso de fazê-lo, estariam praticando irregularidade funcional punível na forma da lei 8.112/90. 

Eis aqui o dilema do quadro docente do DSS: caso não contratemos mais professores substitutos a fim de serem alocados nas disciplinas ainda sem professor estaremos agindo contra o interesse público e praticando irregularidade funcional. Caso contratemos mais professores substitutos fora dos casos legalmente previstos, estaremos praticando ilegalidade.

Em face de tal situação, e tão somente devido a esta, em caráter de urgência, o Departamento de Serviço Social, reunido no dia 19 de setembro deliberou por aceitar a contratação dos professores necessários para o atendimento das turmas que se encontravam sem aula. Mas o assunto não se reduz à contratação ou não contratação de mais um, ou dois, ou três professores substitutos. Também não se trata somente de não compactuar com a ilegalidade dos contratos temporários. As reivindicações do DSS também são uma questão de interesse público: a luta pela garantia de um ensino de qualidade para nossos alunos e uma dignificação tal do trabalho docente que nos permita recuperar o prazer do convívio pedagógico em sala de aula, nos devolva as condições de realizar um trabalho de pesquisa qualificado,  nos permita cumprir adequadamente as funções de extensão social exigido por nosso contexto societário e propiciada pelo exigente projeto ético-político construído historicamente pela profissão. Dignificação e qualificação do trabalho que nos permita restabelecer uma vida intelectual digna desse nome. O quadro docente do DSS entende que o interesse público geral exige, portanto, o compromisso por parte da Reitoria em resolver definitivamente a situação de crise estrutural desencadeada pela ampliação de vagas em 1999, o que em tempos de Reuni significa reivindicar a contrapartida de ter-se adiantado quase em dez anos à atual política de expansão.