Governo quer reestruturar remuneração dos docentes

Andes considera que Proposta apresentada na negociação do dia 18 de outubro se encaixa na lógica do Reuni

O Reuni é um projeto de reestruturação das Ifes, que se inspira, entre outras coisas, na reestruturação produtivista que vem ocorrendo nas empresas privadas. Nestas, para incrementar a produtividade do trabalho e conseqüentemente reduzir os custos, diversas mudanças têm sido feitas com a adoção de tecnologias, reestruturação dos ambientes de trabalho e, principalmente, o comprometimento dos trabalhadores com a competitividade da empresa. A remuneração do trabalhador, agora chamado de colaborador, passa a depender dos resultados obtidos pela empresa na competição no mercado. Ele é então chamado a “vestir a camisa” da empresa para que possa ser complacente em exaurir-se e estimular a exaustão dos seus companheiros de trabalho em favor do lucro da empresa do qual não participa.

O governo trata a educação como uma fábrica que necessitaria ter sua produtividade incrementada e, para se tornar um bom negócio, seus custos de produção reduzidos. Trata-se de uma fábrica de certificados. No caso do Reuni, a meta do governo é a de reduzir o custo médio anual do aluno de graduação de aproximadamente R$ 6,5 mil atuais (descontadas as despesas com os hospitais universitários e com as aposentadorias e pensões) para R$ 4 mil. Para isso, pretende elevar a relação média de alunos por professor para dezoito. Pretende, ainda, a redução da evasão e atingir a meta de 90% de taxa de conclusões.

Para reduzir os custos de produção, a empresa privada tem que fazer investimentos, sendo que muitas vezes altos valores monetários são investidos para obter, no tempo, a redução dos custos. Ao anunciar que cada universidade que aderir ao Reuni poderá ter até 20% a mais de recursos ao longo de cinco anos, o que é um investimento muito baixo, o governo pretende, com isso, incentivar uma reestruturação curricular que resulte na redução dos custos.

Para obter “melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais” (Decreto nº 6.096/07, artigo 1º.), o governo precisa promover uma reestruturação do trabalho nas Ifes. Para obter isso, ele precisa redefinir a forma de remuneração dos “recursos humanos”, em particular dos docentes. Eles terão que ser incentivados a darem mais aulas e para número maior de alunos.

Nesse sentido, a primeira medida foi a criação do banco de professor equivalente. Com o banco, as universidades adquirem autonomia para substituir um docente em regime de Dedicação Exclusiva (DE) que se aposentou por três professores em regime de 20 horas que podem, somados, dar mais aulas que um em regime de DE. A segunda medida aparece, agora, com a proposição do governo de conceder um reajuste salarial maior para o regime de 20 horas e menor para o regime de DE.

Os parâmetros para a nova composição da malha salarial dos professores pretendida pelo governo vieram a revelar uma reestruturação mais profunda. A exemplo da GED, criada em 1988, a remuneração por produtividade é retomada de uma forma a exacerbar ainda mais o individualismo e a competição. Esta mudança em relação à GED se dá quando a remuneração do professor passa a ser dependente da combinação de resultados da instituição (80%) e de resultados do indivíduo (20%). Portanto, para receber quantidade elevada de pontos na gratificação, não basta ao indivíduo dar muitas e muitas aulas, é preciso que seu departamento, seu curso, sua universidade, alcancem bons resultados, nas metas definidas pelo Reuni. Lembremos que as metas não se limitam a quantidades de alunos, mas também de certificações. Portanto, no limite, a remuneração do docente dependerá também da redução da evasão e dos índices de conclusão dos cursos. A reprovação de alunos poderá ser sentida no bolso dos professores. O governo, incapaz de implementar uma política educacional que permita aos alunos um bom desempenho escolar, impõe a diplomação sem mérito acadêmico. E agora, para atingir esse objetivo, busca uma fórmula para obter pelo “bolso” a cumplicidade dos professores. Pretende o governo que cada professor seja não alguém dedicado ao seu trabalho, mas um feitor a exigir o produtivismo dos seus colegas. Desgraçadamente, esse envolvimento dos docentes, pretendido pelo governo, levará à degradação da qualidade do ensino.

É importante observar que a elevação anual dos valores do ponto da gratificação, expressa nos parâmetros apresentados pelo governo, tem por objetivo assegurar as etapas de implantação do Reuni. A cada ano, a parcela da remuneração que depende do desempenho assumirá proporção maior em relação aos demais componentes da remuneração: o vencimento básico e a titulação – esta última tornada fixa e que poderá ficar com valor congelado por longo tempo.

Opor-se a essa forma de remuneração não significa ser contrário à avaliação institucional e individual e, tampouco, fazê-la de forma dissociada. A avaliação, no entanto, deve ter por objetivo a melhoria da instituição e da qualidade do trabalho individual. Portanto, ela não pode estar resumida a aspectos quantitativos e particularmente a metas que comprometam a qualidade da educação. A valorização do mérito se dá no desenvolvimento da carreira.

A recusa do governo em tratar, na mesa de negociação, da remuneração dos docentes da Carreira de 1º e de 2º grau, neste momento, e deixá-la para depois de tratar dos docentes do ensino superior é expressão de uma discriminação. Deve-se, ainda, ao fato de o governo não ter, até o momento, uma definição em relação a que tipo de composição remuneratória ele precisará para a implantação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – IFET (Decreto nº 6.095/07). A pauta de reivindicações do Andes-SN trata das duas carreiras e busca uma isonomia remuneratória entre elas. Pede equiparação dos vencimentos básicos, dos incentivos de titulação e entre GED e GEAD, com paridade entre ativos, aposentados e pensionistas.

O que o governo apresenta para os docentes da Carreira do Magistério do Ensino Superior e o não-tratamento simultâneo da remuneração dos professores da carreira de 1º e 2º grau, caminham no sentido inverso das reivindicações do sindicato, democraticamente definidas.

Pior ainda em relação aos aposentados. Os representantes do governo foram explícitos ao dizer que, em razão de serem poucos os recursos, não há como atender às reivindicações dos aposentados, sem que isso implique prejuízo para os docentes em atividades. Esse posicionamento perverso é bem visível na proposta, pois, além do novo perfil da gratificação anunciada, há indução a mudanças de conceito sobre aquilo que era gratificação e passaria a ser salário, de um lado, e aquilo que era salário e passaria a ser gratificação, de outro, implicando certamente maior distanciamento na remuneração dos aposentados em relação aos professores que permanecem em atividade.

A reunião do setor dos docentes das Ifes, de 19/10/07, considerou, então, que o Sindicato deve continuar exigindo que se paute na mesa de negociação a remuneração de 1º e 2º grau, a paridade entre ativos e aposentados e a rejeição do que está sendo proposto pelo governo para o magistério do ensino superior. A incorporação da GAE, já feita para os técnico-administrativos, deve ser feita para os docentes como está na pauta de reivindicações, mas não se pode aceitar a separação do incentivo de titulação do vencimento básico e tampouco a instituição de gratificação por desempenho. 

A reunião reafirmou, ainda, a necessidade de aprofundar a luta contra a aprovação do Reuni nas Ifes e exigir do governo sua revogação. É preciso que todos os professores sejam alertados sobre todas as conseqüências desse projeto. É preciso ampliar a mobilização. Como visto, na atual negociação, está em jogo não apenas os valores da remuneração, mas o futuro das condições para o exercício do trabalho docente e o futuro da universidade fundada no princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. De fato, o governo pretende desestruturar a malha remuneratória, um dos pilares que têm garantido o princípio citado.