Aparelhismo ou “aparelhismo”?

No boletim da semana anterior (655) havia artigo de minha autoria intitulado “Aparelhismo na Apufsc”. Na semana passada (boletim 656) são publicados dois artigos polemizando com aquele: “Mateus 7, 1-5” de autoria do Professor Marcelo Carvalho e “Movimento Docente e “aparelhismo””, do Professor Paulo C. Philippi. Li os dois com atenção, li o trecho do Evangelho sugerido pelo Professor Marcelo e reli meu artigo. Os colegas, com seus textos, não me demoveram das posições que nele expressei. Reconheço, no entanto, que, na conclusão de meu artigo, inseri, sem maiores explicações, uma alusão a suposta possibilidade de aparelhamento da Apufsc pela reitoria, o que, talvez, tenha levado o professor Philippi a compreender que eu estaria caracterizando o movimento pela renovação da Apufsc como sendo “uma doença social decorrente de uma simples “Manobra de aparelhamento da Apufsc pela Reitoria””. Não fiz e não pretendo fazer tamanha generalização em relação a tal movimento e terminei o artigo com a seguinte frase: “Espero que não seja esta a intenção da atual administração em relação às próximas eleições da Apufsc e do DCE, ambas convocadas para outubro”. Quis apenas dar um recado à reitoria. Se todos consideram isso desnecessário, fico feliz. Certamente não haverá intromissão da máquina administrativa na eleição sindical.

A celeuma dá-se em torno do que compreendemos, ou do que queremos compreender, como sendo aparelhismo no sindicato. Eu considerei a aparição do presidente da Apufsc em programa eleitoral como sendo uma prática aparelhista. E reitero. Isto é inaceitável, em que pesem todas as explicações. Mais inaceitável, ainda, é ser publicada, na primeira página do Boletim, nota do coordenador de campanha de uma coligação partidária para explicar que a referência à presidência da Apufsc era de responsabilidade do comitê de campanha, isentando de responsabilidade o professor Armando Lisboa, que teria levado seu apoio enquanto cidadão. Seria possível fazermos tal divisão entre um indivíduo e o cargo que ocupa? Efetivamente não. Um presidente não fala em seu nome próprio, mas de toda a categoria. Devemos nos perguntar o porquê de tal nota de esclarecimento ter sido divulgada pelo boletim da Apufsc e não pelo próprio programa televisivo. Podemos nos perguntar também sobre o que estaria ocorrendo na UFSC caso o reitor tivesse aparecido em programa eleitoral. Esta pergunta não cabe porque sequer existe esta hipótese, pois legalmente o reitor está impedido de fazê-lo porque é dirigente de um órgão público e fala em nome da instituição.

Os dois artigos vêm comprovar a correção de minha crítica de que os apoiadores do professor Armando, certamente não em sua totalidade, de alguma forma, o autorizam a agir movido pelo que lhe dá na cabeça. E o professor Marcelo é explícito: “Ora, ser identificado como presidente da Apufsc não implica que a Apufsc esteja oficialmente apoiando tal candidato (da mesma forma que o presidente da CNBB defender a revisão da lei da anistia não implica ser esta uma posição oficial da igreja católica”).
Para os dois autores eu não estaria moralmente autorizado a fazer críticas sobre aparelhismo porque eu mesmo seria conivente com práticas deste tipo no sindicato nacional, do qual participei das duas últimas diretorias, sendo que na última como presidente. Eu mesmo seria um aparelhista praticante e tentam comprovar as afirmações que, de concreto, não comprovam nada. Os dois artigos são de qualidades diferentes, mas têm em comum a compreensão de que o aparelhismo no Andes dar-se ia, principalmente, pela sua filiação e participação na Conlutas, “uma entidade política que tem como objetivo organizar a luta contra as reformas neoliberais do governo Lula” (Philippi) e “é sabido do alinhamento do Andes com a cartilha de partidos como PSOL e PSTU via sua filiação (agora ratificada) ao Conlutas” (Carvalho). “Ora, não foi o próprio professor Rizzo que como presidente ajudou a manter o aparelhismo no Andes com sua aliança imoral ao Conlutas?” (Ibid.)

Philippi toma sua informação sobre o objetivo da Conlutas da própria página da entidade e pergunta: “Dá para acreditar?”

Ora, é claro que dá para acreditar que o objetivo da Conlutas seja o de “organizar a luta contra as reformas neoliberais do governo Lula”, o que para Philippi a caracteriza como sendo “uma entidade política”, expressão que não se encontra presente na referência por ele apresentada (www.conlutas.org.br/exibedocs.asp?tipodoc=noticiaEampd+id=105). Lá encontramos: “A Conlutas – Coordenação Nacional de Lutas – é, como o próprio nome diz, uma coordenação, composta por entidades sindicais, organizações populares, movimentos sociais etc.” e, para além do objetivo citado, lutar “contra o modelo econômico que este governo aplica no país, seguindo as diretrizes do FMI.”

Seriam tais objetivos contraditórios com os interesses dos professores? Por acaso não fizemos uma greve em 2003 contra a reforma da previdência do governo do Sr. Lula da Silva apoiada pela CUT, que, agora, cria um sindicato paralelo? Quem serão nossos aliados quando tivermos que enfrentar uma terceira reforma da previdência, ou as conseqüências de uma recessão anunciada pela crise financeira de Wall Street? Seriam estes assuntos partidários? Seria alinhamento do Andes com o PSOL e com o PSTU?
Será que para não corrermos o risco de partidarização do sindicato devamos despolitizá-lo? A filiação a outra organização de caráter sindical ou sindical e popular comprometeria a autonomia do sindicato? Seriam ilegítimas as deliberações dos congressos do Andes, antidemocráticas e aparelhistas?

Nós não temos acordo sobre o significado da palavra aparelhismo. Na seqüência da citação acima do professor Marcelo Carvalho lemos: “E que nos tentou enfiar de forma antidemocrática e goela abaixo uma greve em 2007 e que foi rejeitada de forma democrática numa votação em urna?” Estou na Universidade desde 1982 e não me lembro de uma vez sequer que uma diretoria do Andes tenha tentado enfiar greve goela abaixo dos professores. Teria isso ocorrido exatamente quando eu estava na presidência, em 2007? Desde quando propor uma greve é agir antidemocraticamente? É tentar enfiá-la goela abaixo? É exemplo de aparelhismo?

Desta culpa eu não padeço e afirmo mais. Sentir-me-ia culpado se, enquanto dirigente do sindicato nacional, não tivesse proposto a luta quando ela se mostrou necessária. Parece que o professor Marcelo considera como sendo aparelhismo a direção do sindicato propor coisas com as quais ele discorda. Mas o professor Marcelo não está muito interessado em trabalhar com informações precisas e vamos a uma que ele faz sobre este que aqui escreve:

“Mais adiante, professor Rizzo escreve: “Questionava, portanto, que o presidente não tinha o direito de agir diferentemente das definições emanadas pelas instâncias de deliberação”. Ora, o professor Rizzo fez exatamente isso no último congresso do Andes quando, contrariando deliberação dos associados, se absteve de votar pela desfiliação do Andes ao Conlutas e que o Andes representasse somente Ifes. Nesta ocasião, segundo relato de um membro do CR que esteve presente no congresso, o professor Rizzo alegou que não se sentia obrigado a votar de acordo com o que havia sido deliberado pelos associados. Estaria o professor Rizzo então se autorepresentando? Se for, com que mandato?”

Trata-se de uma acusação bastante grave. Parece um grande furo de reportagem. Paulo Rizzo teria deixado uma brecha para ser atacado. Teria, enquanto delegado, votado contra uma deliberação dos associados e, burro, o fez na presença de testemunhas, os demais delegados da Apufsc, sendo que um deles, membro do CR, teria informado que Paulo Rizzo teria alegado não se sentir obrigado a votar como decidiram os associados.

Acho interessante que eu seja informado pelo boletim que eu teria feito determinadas coisas que eu não sabia que tinha feito. Mas, vamos aos fatos.

Primeiro, não houve deliberação de qualquer instância, mas uma consulta eletrônica que tinha por objetivo balizar a delegação. Segundo, nenhum dos delegados votou a favor de que o Andes representasse somente os professores das Ifes, porque esta proposta não estava posta em discussão no Congresso. Havia duas propostas referentes apenas à retirada das particulares do Andes e toda a delegação votou nestas. Defendi isso em artigo no Boletim da Apufsc que antecedeu o Congresso e, nele, batalhei muito pela sua aprovação. No entanto, perdemos. Como eu tenho uma razoável experiência nos fóruns do Andes, apoiei entre as duas, aquela que tinha mais chances de ser aprovada. Portanto, não me abstive neste assunto. Fui atuante.

No tocante à Conlutas, havia uma única proposta, apresentada pela Aspuv (Viçosa). Ela defendia a indicação da desfiliação à Conlutas para um debate na base e para deliberação no próximo Congresso Ordinário. Eu estava no mesmo grupo do Presidente da Aspuv. A grande maioria dos presentes no grupo, e no Congresso como um todo, sequer se sensibilizaram com a proposta e ia, como de fato aconteceu, derrotá-la fragorosamente. Pelo regimento do Congresso são apreciadas em plenária apenas as propostas que tenham obtido, no mínimo, 30% dos votos em pelo menos um grupo, ou que, por falta de tempo para a discussão, um grupo as remeta para discussão em plenária. Em nove grupos, a proposta não obteve 30% de votos favoráveis nos oito grupos em que foi discutida e ela só foi para a plenária porque um grupo, que não a discutiu, a remeteu. Mais uma vez, por ser familiarizado com aquele ambiente, sabia que dificilmente a proposta chegaria ser apreciada em plenária, apresentei no grupo um substitutivo, em respeito aos proponentes e para tentar estabelecer algum espaço de discussão sobre o assunto no próximo período, com o seguinte teor.

“O III Congresso Extraordinário delibera que o Andes-SN promova um balanço de sua participação no processo de reorganização da classe trabalhadora, levando em conta, dentre outros aspectos sua filiação à Conlutas, a reforma sindical, a legalização das centrais sindicais, com vistas a definições relativas ao seu fortalecimento. As seções sindicais serão estimuladas a debater o assunto e este será pautado no XXVIII Congresso.”

O grupo não aceitou esta proposta e aprovou outra com o seguinte teor:

“O III Congresso Extraordinário delibera: O Andes-SN deverá realizar estudos e seminários objetivando analisar o processo de reorganização da classe trabalhadora, identificando dificuldades, avanços e desafios para a construção do pólo classista, considerando a contra-reforma trabalhista e a sindical e a criminalização das lutas sociais.”

Esta acabou sendo aprovada pela plenária, mas é muito genérica e não faz qualquer referência à relação do Andes com a Conlutas.

É fato que, na plenária, me abstive e fiz uma declaração de voto oral e que está registrada em atad+
“A Assembléia da Apufsc-S.Sind. não definiu posição sobre os TR (textos de resolução) e definiu a realização de uma consulta eletrônica sobre os TR a fim de balizar o posicionamento dos delegados, mas que não se constitui em um fórum de deliberação. Apresentei no grupo um substitutivo ao TR4 a fim de acolher todas as intenções de promoção de debates em torno da participação do Andes-SN no processo de reorganização da classe trabalhadora”

Uma vez mais, afirmo que não sinto qualquer culpa. Ao contrário, fui o delegado da Apufsc mais atuante no sentido das referências dadas pela consulta eletrônica. Os mais envolvidos com o processo de mudanças no regimento da Apufsc sabem como é trabalhoso fazer uma organização mudar. Quem esteve no recente congresso extraordinário do Andes pode testemunhar que as dificuldades são maiores em uma organização nacional do porte de nosso sindicato. Pessoalmente não defendo a desfiliação, mas reconheço a necessidade da discussão. Batalhei e continuarei batalhando para que ela seja feita. Minha proposição no grupo e minha declaração de voto tiveram como objetivo tirar um pouco da cera dos ouvidos dos que sequer queriam escutar.

É muito curiosa a referência do Professor Marcelo ao Evangelho na conclusão de seu artigo. “A crítica é louvável, mas quando se vai muito além da crítica começamos a julgar os outros. Acerca disso deixo-lhe uma boa sugestão de leitura: Mateus 7, 1-5 (a mensagem vale para mim também e para todos) uma alternativa ao já tão falido mantra marxista ao qual o senhor parece aderir.” Mas, seu artigo é apenas julgamento do início ao fim, não importando sequer se está caluniando ou não. Seria uma adesão, com alguns séculos de atraso, aos métodos intolerantes da inquisição? Ao stalinismo (marxismo degenerado, em minha opinião) percebe-se que não é.