A quebra da unicidade sindical

O DOU de 11/11/2010 publicou um ato do MTE suspendendo provisoriamente a “anotação” no Cadastro Nacional de Entidades Sindicais quanto à exclusão da Andes da representação sindical dos professores das universidades federais de SC.

É através deste Cadastro que se respeita e se exercita o princípio da unicidade sindical definido na Constituição Federal (Art. 8, Inciso II): uma categoria não pode ser representada por mais de um sindicato em uma mesma base.

Trata-se dum ato fragrantemente inconstitucional do MTE, além de também ser irregular na medida em que este Ministério deixa de cumprir as suas atribuições impostas pela Portaria 186 pela qual o MTE fiscaliza o exercício sindical.

Esta decisão do MTE não se deve aos movimentos de contestação da Andes ao registro da Apufsc, mas a um projeto que tomou forma nos bastidores do MTE com forte presença da CUT e aporte da cúpula do Proifes-Sindicato, representada por seu Presidente Gil Vicente Reis de Figueiredo e Vice, Eduardo Rolim de Oliveira.

De fato, desde junho deste ano, temos resistido às pressões da CUT e do Proifes-Sindicato para que renunciemos à anotação onde consta que a Andes perdeu a representação sindical dos professores das universidades federais em Santa Catarina.

No final de junho, depois da nossa frustada festa de entrega do diploma sindical, fomos convidados pela CUT e pelo Eduardo Rolim para comparecermos ao MTE numa reunião com a Zilmara (SRT-MTE) para discutirmos uma eventual republicação do nosso registro onde seria retirada a restrição de que a Andes não podia atuar em Santa Catarina.

Estranhamos aquela proposta vinda da CUT (e do Eduardo Rolim). A Andes é desafeta da CUT. Qual seria o interesse da CUT nesta proposta?…

Evidentemente, recusamos o convite por dois motivos: i) não era um convite ou uma convocação do MTEd+ e ii) a proposta contrariava a CF. Com o tempo descobrimos que a intenção da CUT era viabilizar o registro do Proifes-Sindicato.

Há dois Proifes: o Proifes-Fórum e o Proifes-Sindicato. O Proifes-Fórum é uma associação de entidades com as quais a Apufsc vem mantendo um bom relacionamento já desde 2008. O Proifes-Sindicato é um candidato a sindicato de base nacional, fundado em uma assembléia em setembro de 2008 na sede da CUT em São Paulo. A “pedra no sapato” do Proifes-Sindicato é a Andes, que é quem detém a base nacional. A curto prazo, não há como o Proifes-Sindicato ter o seu registro a não ser derrubando o princípio constitucional da unicidade.

A unicidade é um princípio que se mantém na CF desde a época de Vargas. Ao mesmo tempo que este princípio restringe a liberdade de organização sindical, ele estabelece que quem decide a representação é a categoria naquela base. Foi usando este princípio que nos desvinculamos da Andes e conseguimos que o nosso registro fosse publicado em 20 de maio no DOU.

De junho para cá  o  PDT perdeu força em função dos resultados eleitorais e a CUT (e, junto com ela, o Gil e o Eduardo) ganhou força no MTE em função do crescimento do PT e da eleição da Dilma.

Em questão de 10 dias após o segundo turno das eleições:

a) o MTE convocou as entidades do Proifes-Fórum e que também buscam seus registros sindicais e colocou a renuncia à unicidade como condicionante para o registro:  “Quem renuncia à anotação tem o registro, quem não renuncia não tem”d+

b) convocou a Andes e disse para os andesianos que para eles recuperarem as suas bases locais eles teriam que dividir a representação nacional com o Proifes-Sindicato.

Quando a Andes concordou com a proposta, estabeleceu-se uma decisão de conciliação num âmbito administrativo. Todas as entidades presentes, exceto a Apubh, aceitaram os termos do acordo e os seus registros sem a anotação. A Apufsc não tinha sido convidada ou convocada pelo MTE.

O primeiro resultado foi a publicação, em 11.11, no DOU da Suspensão de Anotação: O Chefe de Gabinete do Ministro do Trabalho e Emprego, no uso de suas atribuições legais e com fundamento na Portaria 186, de 14 de abril de 2008, conforme Nota Técnica nº.324/2010/DIAN /SRT/MTE, resolve SUSPENDER a anotação de exclusão da categoria dos Professores das Universidades Federais da representação do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES, processo administrativo nº. 24000.001266/90-77, CNPJ nº. 00.676.296/0001-65.

Mesmo com as reuniões de conciliação, a anotação é uma atribuição administrativa do MTE (Portaria 186) com o objetivo de resguardar um princípio constitucional: uma categoria não pode ser representada por duas entidades diferentes na mesma base. As entidades em disputa não podem por elas mesmas quebrarem um mandato constitucional.

Voltando atrás

O registro da Apufsc foi o apogeu de um processo legítimo e democrático iniciado em 2007. Em 2009 decidimos nos desvincular da Andes em assembléias nunca antes vistas, que contaram com a participação de mais de 1.000 professores num universo de 2.500 associados, a metade dos quais aposentados. O passo seguinte foi requerer o registro, usando o nosso direito ao desmembramento explícito no Art. 8 da CF. Em 20 de maio de 2010 nosso registro foi publicado e abria-se uma nova era para o sindicalismo universitário: “Se Santa Catarina obteve o dela qualquer entidade local pode obter o seu”.

Porém, a concessão do registro à Santa Catarina batia de frente com os interesses do Proifes-Sindicato. Por dois motivos: a) O registro da Apufsc com a anotação de exclusão, define o fim do conceito de Sindicato Nacional para os professores das IFES, impedindo o Proifes-Sindicato obter o seu registro, ao menos, a curto prazod+ b) O risco das entidades locais constituírem uma terceira via, em uma federação fora do Proifes.

De lá para cá, o Proifes-Sindicato, a CUT e a Andes procuraram bombardear este esforço, considerando os seus interesses.

Conseqüências do desabrigo constitucional e quem ganha com isso

O fim da unicidade fará das IFES “terra de ninguém”. Como um espelho do que a Andes está a fazer em SC, o Proifes também fundará seu “clube de amigos” no Rio de Janeiro, Pará, Paraíba e em outras universidades cujos docentes são representados pela Andes.

Isso resultará na inevitável fragmentação do movimento docente, pois ambas entidades, configuradas pelo conceito de sindicato nacional (antagônico à organização federativa) manterão fictícias “seções sindicais” nos locais onde não tiverem hegemonia.

No caso do Proifes-Sindicato isto é mais grave, pois o mesmo resigna-se a abrigar, nas bases da Andes, os poucos colegas sindicalistas que historicamente fazem oposição à corrente dominante da Andes, mas não conseguem motivar seus pares para a reconstrução do movimento docente em suas bases.

Esta estratégia mostra-se ainda mais limitada diante da renovação obtida pela Apufsc. Santa Catarina era um território em que o Proifes renunciava disputar, pois se avaliava como um baluarte histórico da Andes. Aqui inauguramos um processo novo, que surpreendeu os velhos militantes sindicais. Demonstramos que, através dum debate amplo e respeitoso, é viável, democraticamente e sem uso de procurações, renovarmos profundamente o sindicalismo universitário.

Em outubro de 2009 nos transformamos na Apufsc-Sindical. Na seqüência, em processos semelhantes ao nosso, através de AG”s democráticas  e legítimas, fomos seguidos pela Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, e, mais recentemente, por Goiás. Todos com resultados muito parecidos ao obtido em SC.

A acomodação resultante da criação do Proifes-Sindicato apenas prolongará irresponsavelmente a sobrevida da Andes, cuja representatividade já tinha sido perdida em todo Brasil, dificultando gravemente a geração de um autêntico movimento docente universitário.

Princípios

Acreditamos que todos nós sejamos dignos de respeito, independentemente de nossas ações em busca do que consideramos ser a melhor forma de organização sindical. Mas também acreditamos que um Movimento como o nosso deve apoiar-se sobre princípios. Sobretudo quando corremos o risco de contaminar este movimento com o carreirismo burocrático-sindical e com o”peleguismo”, que aparece sempre de mãos dadas com a renúncia a princípios fundamentais em função de vantagens e conquistas mais imediatas. Manter estes princípios é, ao nosso ver, a única esperança de termos um Sindicalismo Universitário verdadeiramente Novo, sobre uma federação de sindicatos independentes.