Deputada Fátima Bezerra fala sobre educação em entrevista ao Proifes

No último dia 10 de maio, o Proifes entrevistou a deputada federal pelo Rio Grande do Norte (RN/PT) Fátima Bezerra. A deputada que atualmente preside a Comissão de Educação e Cultura da Câmara falou sobre o cenário de avanços e desafios da educação nacional, equiparação da carreira entre docentes de Ifes e EBTT, Plano Nacional de Educação e sobre a atuação do Proifes na luta pela melhoria na qualidade da educação. Ao final da entrevista, a deputada deixou uma mensagem aos professores de Ifes e EBTT.

Mécia Menescal e Rui Sintra

Como está a educação no Brasil?

De um lado, temos a celebrar os avanços e conquistas importantes no que diz respeito à expansão e fortalecimento da educação brasileira que nós conseguimos construir nos últimos oito anos. Refiro-me ao fato de conseguir aprovar matérias importantes como por exemplo o ensino fundamental de nove anos e o Fundeb, que traz dentro de si uma concepção inovadora, de caráter universal e que resgata o conceito uma política de financiamento que olha de forma global para a educação básica na medida em que conseguimos incorporar na política do Fundeb desde a questão da creche até o ensino médio.

Quero também destacar medidas como Proúne que inegavelmente tem contribuído, e muito, para democratizar o acesso dos estudantes das camadas de menor poder aquisitivo da população e que conseguiu, enfim, colocar muitos jovens desse perfil dentro da universidade.

Destaco ainda a emenda 59 (59/2009) que foi um marco na luta da defesa da educação brasileira na medida em que conseguimos não só retirar a DRU (Desvinculação das Receitas da União) – que durante muitos anos tirou dinheiro da educação – como ainda garantir a obrigatoriedade do ensino de 4 a 17 anos, ou seja, o Brasil tem até 2016 para universalizar este ensino. Bem como colocamos na DRU, que no novo Plano Nacional de Educação os investimentos tenham como premissa o percentual do Produto Interno Bruto e que este terá que ter a duração de 10 anos.

Outra conquista importante foi o Plano de Expansão e Fortalecimento da Educação Profissional no Brasil que promoveu uma revolução, porque há 100 anos nós tínhamos 147 escolas técnicas, e num espaço de oito anos, foram construídas, instaladas e já estão em funcionamento mais de 214 novas escolas técnicas no país a fora, os chamados Institutos Federais de Educação Profissional e Tecnológica.

Por fim, e não menos importante, o REUNI – Plano de expansão e fortalecimento da universidade pública, que tem se constituído num instrumento muito importante para ampliar o número de vagas na universidade e fazer isso, inclusive, sem perder a qualidade, porque essa é a nossa luta. Não basta apenas oferecer vagas e colocar mais jovens na universidade. Não podemos perder o foco na questão da qualidade do ensino que é o grande desafio do Brasil. Mas em que pese esses avanços todos, para que a educação caminhe como nós todos queremos e sonhamos, ainda temos uma longa estrada a percorrer.

O PNE é quase como uma luz no fim do túnel para o desenvolvimento da educação no Brasil?

É um dos instrumentos e muito importante, porque o Projeto de Lei 8035 que está tramitando aqui na casa e vai instituir o novo Plano Nacional de Educação, não é um plano de governo apenas, é uma política de estado. É um projeto ousado, que possui 20 metas e mais de 150 estratégias que vão dizer como cada meta daquela vai ser implementada ao longo dos 10 anos. Ele trata desde a questão da universalização e ampliação do atendimento escolar da creche à pós-graduaçãod+ da questão da formação, da gestão, da valorização salarial e profissional do magistério dos trabalhadores em educação e a questão do financiamento. Então é um Projeto de Lei que vai traçar os rumos e destinos da educação brasileira no próximo 10 anos.

Há críticas sobre o PNE classificando que o Plano é uma carta de intenções, bem elaborada, mas que não foca como se chegará a determinadas estratégias.

Parto da premissa que o Projeto de Lei 8385 que está aqui é um projeto bom. Ele não é um projeto de gaveta. Diferente do PNE 2001-2010, cuja implementação acabou sendo um fiasco, o atual projeto foi debatido com a sociedade. A base, referência do ponto de vista do conteúdo do PNE nasceu nas conferências municipais e estaduais que precederam a Conferencia Nacional de Educação, realizada em abril. Sem contar os seminários que foram realizados inclusive pela Comissão de Educação e Cultura. Então o conteúdo do PNE nasceu do debate amplo, plural, onde todos os seguimentos envolvidos com a temática da educação tiveram a oportunidade de participar. Agora, significa que este projeto está pronto, 100%? Não está. Até porque o projeto não incorporou o conjunto de todas as propostas que nasceram no debate da sociedade civil.

Qual é a responsabilidade que o Congresso, Câmara e Senado federal teriam nesse momento? É o de promover o debate, amplo, plural e fazer os ajustes necessários. Ou seja, tentar compatibilizar as deliberações que saíram da Conferência e as novas propostas que surgirão, com o projeto do governo. Isso com a perspectiva de aperfeiçoar o projeto.

E de arranjar verbas, porque isto é um dos pontos fundamentais para dar corpo ao próprio PNE.

Sem dúvida, a meta 20 é a última, mas não menos importante. Eu diria que é a meta ancora. Porque como vamos ampliar o número de vagas na universidade, na educação profissional, universalizar o ensino de 4 a 16 anos, ampliar e universalizar o acesso à creche, como vamos de uma vez por todas definir esta década, como a década de construir uma política pública que responda ao desafio de prestigiar, de respeitar o professor. Ou seja, o tema da valorização salarial do profissional de educação. Como vamos fazer isso se não tiver um financiamento adequado?

Quando falo que o PNE precisa melhorar, aperfeiçoar, é porque o PNE repito, não incorporou todas as deliberações que saíram da CONAE.

Um exemplo disso foi que a sociedade civil, Proifes, CNTE, UBIS, UNE, Campanha pelo Direito à Educação, todas elas defenderam com muita intensidade que o percentual do PIB pela educação deva ser 10%. Entretanto a proposta que o governo enviou a esta casa fala de 7%. É fato que houve um avanço, porque saiu dos atuais 5% de investimento e irá para 7%, mas é importante essa mobilização da sociedade civil para defender a proposta de 10%.

Sem falar nas perspectivas que o Pré-sal possa trazer para a educação. Mas ainda é um grande ponto de interrogação, mas que vai dar uma forte implementação às metas propostas do PNE.

Sem dúvida. Eu tenho dito que vamos defender o financiamento à luz das propostas do PNE. O Ministro da Educação apresentou uma proposta de 7 % porque responde às metas que estão no projeto original. Como eu tenho a convicção de que com o debate conclusivo, as metas serão alteradas, no sentido de serem mais ousadas…

Por exemplo, a questão das creches. A proposta original é de se chegar 50 até 2020. Mas há propostas da sociedade civil, lideradas pela campanha Pelo Direito à Educação, é que não deve apenas ampliar, mas universalizar.

Já a questão do Ensino Superior. É uma tragédia. No Brasil nós temos apenas 14% dos nossos jovens que têm o direito de fazer universidade. Uma injustiça. Perdemos para países como Uruguai, Argentina, sem falar dos países europeus. E no Nordeste brasileiro essa realidade é mais dramática, porque a média lá cai para 7%.

Bem, o projeto original coloca que nos próximos 10 anos nós deveremos chegar a garantir que no mínimo 33% dos jovens tenham acesso à universidade. Mas há proposta, já apresentada de ampliar mais, de se chegar a 40%.

O que eu quero dizer, é que à medida que nós vamos alterar metas do PNE, significa que também tem que alterar metas do financiamento, do contrário as contas não fecham. E o Pré-sal é o caminho que a gente tem de concreto do ponto de vista de definir a fonte de financiamento.

Este debate é muito importante. Temos que encontrar o caminho de onde virá o financiamento, os novos recursos. E acho que pré-sal é uma bela aposta. Tem todo um debate, uma legislação que diz que estes Royalties oriundos do Pré-sal serão destinados à educação, cultura, meio ambiente, enfim, para outros programas. Já há um entendimento, ou um convencimento de “por que não, metade desses recursos virem para a educação?”.

Para quando se prevê a tramitação do PNE na comissão especial?

Estamos trabalhando com a idéia, a mesma que os movimentos sociais e entidades defendem, que é concluir esse processo da aprovação do PNE até dezembro de 2011. Nós da Comissão da Educação defendemos que até agosto finalizássemos a aprovação do relatório aqui na Câmara, setembro outubro e novembro no Senado, e até dezembro fechar e a presidenta Dilma sancionar.

Até porque se não for aprovado esse ano, somente em 2013 seria aplicado.

É um risco, tendo em vista que 2012 é ano de eleições. E sabemos como os funcionamentos das casas legislativas se tornam atípicos. Tenho receio, mas daí importância da mobilização social, da participação dos representantes dos gestores, trabalhadores, estudantes e seus pares em geral. Tenho esperança e estou muito empenhada nisso junto com vários outros companheiros e colegas parlamentares para que possamos concluir este trabalho até o final do ano. Mas o relator do projeto, deputado Angelo Vanhoni, é muito sensibilizado com a temática de educação e está atento à questão do calendário.

Educação Universal e de Qualidade. Um projeto para o Brasil. A deputada leu este trabalho? Qual a sua apreciação?

Primeiro o de parabenizar o Proifes. Belo trabalho, muito consistente e fundamentado. Acho uma contribuição muito importante que o trabalho do Proifes traz por dizer respeito à questão do financiamento. Ou seja, o Proifes levanta um debate central que é a questão o do custo-aluno. Isso tem que ser definido. Educação custa caro. Tem um pensador que diz que a ignorância é muito mais caro.

Carreira dos professores das Instituições Federais de Ensino Superior e do EBTT. Como a senhora vê a tentativa de convergência e de unificar entre essas duas grandes classes que acabam por ser imprescindíveis para a educação nacional.

Primeiro acho que o caminho de buscar a unificação e unidade. Segundo, é essencial o processo organizativo da categoria e de mobilização. Ao longo destes nove anos, estou no terceiro ano como deputada federal, meus mandatos sempre tiveram vínculo muito presente com a luta, com a pauta de reivindicações dos professores com os trabalhadores da educação. Até pela minha origem… venho da luta social, do movimento sindical, sou professora.

Eu tive a alegria de ser a relatora do plano de reestruturação da carreira dos servidores técnico-administrativo das Ifes. Não respondeu a toda problemática dos servidores técnico-administrativo, mas a própria Fasubra reconhece que foi um avanço muito importante a aprovação daquele plano.

Temos dialogado muito com Proifes, já dialogamos muito com Andes também, enfim, temos ajudado neste processo de busca de valorização de melhoria salarial dos professores das universidades públicas brasileiras, assim como dos profissionais dos institutos federais de educação profissional e tecnológica.

Mas quero nesse momento reafirmar aqui a disposição não só do nosso mandato, mas hoje enquanto presidente da Comissão de Educação e Cultura para continuar essa parceria com o Proifes e com as demais entidades e ajudar na negociação junto ao governo. O caminho tem que ser uma mesa de negociação permanente. Agora, tem que ter proposta concreta, fundamentada, com conteúdo. O papel do movimento é não baixar a guarda, mobilização, vigilância.

Reafirmo que o núcleo de educação da bancada do PT também está à disposição, e quem coordena é o companheiro Valdenor, do PT da Bahia que inclusive foi reitor da universidade estadual da Bahia.

Como consegue gerir na sua vida, tudo isto que acontece ao seu redor, família, grandes questões nacionais a sua própria vida aqui dentro. O que tem ficado para trás?

Infelizmente a vida pessoal. Ela tem sido muito sacrificada. Mas isto faz parte da luta, do processo. Eu sou oriunda do Rio Grande do Norte e lá só tem direito a representação de oito vagas para deputados federais. Eu fui eleita em 2002 e fui a primeira deputada pelo Rio Grande do Norte que tem um perfil e origem social diferente. Porque até então, só quem era eleito deputado federal pelo meu Estado eram os filhos ou parentes das famílias tracionais de lá. São duas, três famílias que controlam politicamente o Estado há décadas. O processo de oligarquização no meu Estado é muito forte.

Mensagem da deputada para professores das IFES e EBTT

Nós não podemos desanimar. Pelo contrário, temos mais é que renovar cada vez mais nossa capacidade de sonhar, de lutar. Acho que 2011 é um ano muito emblemático para a universidade, educação básica, profissional, enfim educação brasileira como um todo. Taí o debate do PNE a exigir de todos nós muito envolvimento, responsabilidade e dedicação militante. Por fim dizer que quero compartilhar meu sentimento: Eu não estou com pessimismo, ceticismo, mas sim esperançosa. Acredito na capacidade de mobilização e de luta das pessoas. A educação brasileira não vai bem ainda. Pra ela ficar no patamar que a gente deseja, temos ainda uma longa estrada a percorrer.

Conheça o perfil da deputada:

Paraibana de Nova Palmeira, a deputada federal Fátima Bezerra emigrou ainda adolescente para o Rio Grande do Norte e lá se formou em pedagogia pela UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte). Começou, então, uma vida voltada para a defesa da educação pública.

Professora da rede pública de ensino (prefeitura de Natal e governo do estado), Fátima Bezerra foi presidente, por dois mandatos, do Sindicato dos Trabalhadores em Educação no RN e deputada estadual de 1995 a 2002. Na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte, ela foi presidente da Comissão de Direitos Humanos e da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Interior.

Como deputada federal, cargo que exerce desde 2003, foi relatora da lei 11.494/07, que regulamentou o FUNDEB (Fundo de Manutenção do Desenvolvimento e de Valorização dos Profissionais da educação). Durante as discussões da PEC 53/06, que criou o FUNDEB, apresentou proposta para a criação do Piso Salarial do Magistério, o que deu origem à lei 11.738/08. É coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa do Piso Salarial do Magistério.

Na área de cultura, Fátima Bezerra foi relatora do Plano Nacional de Cultura (lei 12342/10) e co-autora da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 150/03, que trata do financiamento para a cultura.

Outra marca da deputada nos últimos oito anos foi a luta pela expansão e fortalecimento da educação tecnológica e profissionalizante no país. Nos seus dois mandatos ela conseguiu que fossem implantados no Rio Grande do Norte 13 unidades de IFRNs (Institutos Federais do Rio Grande do Norte), ampliando de 2 para 15 o número desses estabelecimentos de ensino do estado.

Nas últimas eleições, ela foi a deputada federal mais votada no Rio Grande do Norte, obtendo mais de 13% dos votos válidos no estado, sendo a quinta mulher mais bem  votada no país.