A Submissão do Curso de Serviço Social ao Marxismo
Recentemente, a justiça federal no Maranhão determinou a suspensão, em caráter liminar, das atividades do “Centro de Difusão do Comunismo” (CDC), programa de extensão vinculado ao departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
Na ação popular que solicitou a suspensão do CDC, o requerente da ação argumenta que: “o programa, sob o pretexto da autonomia universitária, fere os princípios da moralidade e da legalidade da administração pública, prevista na Constituição, ao usar recursos públicos para divulgar ideologia político-partidária”.
Já em nota, a UFOP afirma que o CDC não é “um programa acadêmico com objetivos político-partidários, e sim, trata-se de extensão, vinculado ao Curso de Serviço Social, para organizar e articular quatro ações de extensão (dois cursos e dois projetos) e oferecê-las de forma gratuita a toda a comunidade, que se insere no programa por livre escolha”.
A abordagem das sutilezas contidas em uma e outra assertiva certamente constituirá um elemento de discussão acalorada entre as partes. Contudo, não é preciso se engajar nesse exercício de retórica para perceber algo mais sintomático e perverso. Com efeito, a questão aqui é outra: O que leva um curso de serviço social a dar tanta importância a difusão do comunismo, a ponto de fazer disso um projeto de extensão que vai muito além da universidade? Tal questão é relevante, pois ilustra como a omissão de pessoas (supostamente) esclarecidas acaba por permitir que uma ideologia (marxismo) acabe se tornando dominante, subjugando cursos que, numa perspectiva mais ampla, não precisariam buscar no marxismo nenhum elemento conceitual relevante.
O que ocorre no departamento de serviço social da UFOP aponta para algo que deve ser, com as devidas gradações, caso comum em outros lugares. Na UFSC, não é diferente. Tomemos, por exemplo, a análise de um vídeo de apresentação do curso de serviço social produzido pelo PET e o Centro Acadêmico Livre do Serviço Social, disponível em http://www.youtube.com/watch?v=rGve25SrgNQ.
O material do vídeo de autoria de Giovanny Simon, Mayara Gelsleichter e Davi Perez apresenta o seguinte conteÚdo ao qual transcrevi abaixo:
“Uma Breve Introdução ao Serviço Social”
O Serviço Social é uma profissão liberal que tem por objeto de intervenção a questão social. A questão social é uma expressão da classe trabalhadora lutando pelo seu reconhecimento enquanto sujeito político e social.
A classe trabalhadora é o conjunto populacional que somente possui a sua força de trabalho e a vende para a burguesia em troca de um salário.
A burguesia é uma classe de interesses opostos à classe trabalhadora e é detentora dos principais meios de produção.
Os meios de produção compreendem todo o conjunto de instrumentos utilizados na produção dos bens de consumo da sociedade, também conhecidos como: terras, fábricas, indÚstrias, minas de extração, maquinário e tecnologias em geral. No capitalismo atual, esses meios de produção são propriedade da burguesia monopolista. O monopólio é um estágio do capitalismo onde os meios de produção concentram-se nas mãos de poucos, neste caso, a livre concorrência entre empresas é anulada.
Cada vez mais a riqueza é produzida por todos e é apropriada por poucos. Uma consequência disso é o desemprego estrutural, com a decorrência de fome, miséria, analfabetismo, violência e todas as outras mazelas dessa sociedade. Essas são expressões da questão social onde o profissional do serviço social atua. A sua atuação se efetiva através das políticas sociais e da organização popular. A organização popular é um meio que a classe trabalhadora em geral utiliza para reivindicar seus direitos. Os direitos são, na maioria das vezes, efetivados através das políticas sociais. As políticas sociais são instrumentos de atuação do assistente social inserido nas mais diversas áreas como, previdência, habitação, educação, o meio sócio-jurídico, a saúde, criança e adolescente, idoso, assistência social, assessoria, e movimentos sociais.
Os movimentos sociais são a materialização da organização popular, ou seja, o povo organizado que luta pela resolução de seus problemas mais sentidos que são as expressões do capitalismo e da questão social. O assistente social, neste contexto, é um agente político que se coloca do lado do povo e da classe trabalhadora na luta pelos seus direitos.
Fica evidente deste texto que Davi Perez e seus colegas pensam o serviço social unicamente dentro de uma crítica ao capitalismo (será que eles estenderiam sua crítica a condição de miséria e degradação dos trabalhadores em Cuba?). No texto, o viés marxista se manifesta explicitamente em vários elementos (ênfase na dicotomia classe trabalhadora x burguesia) e expressões típicas (organização popular etc.) e, por isso, resulta num material de propaganda doutrinária que não pode ser tomado como representativo de um curso, já que se revela deteriorado, superficial e tendencioso na forma com que trata o serviço social É inaceitável que tal material vexatório tenha tido a anuência do departamento de serviço social, pois custa acreditar que departamentos de serviço social em outros países (democráticos) apresentem o curso da mesma maneira (talvez haja alguma semelhança com alguma universidade em Cuba, Vietnam, Coréia do Norte,…).
Ora, mas a situação é de todo confusa, pois, se pensarmos no que constitui os elementos do “social work” esperaríamos identificar um escopo de conceitos mundialmente reconhecidos e categorizados. Mas, o que dizer se no Brasil as pessoas pensam o serviço social dentro de uma ótica puramente marxista correndo o risco de serem desacreditados pelo que mundialmente se concebe por serviço social? Tal absurdo não ocorre em outras áreas. Por exemplo, um colega da área de equações diferenciais parciais que trabalhe com equações elípticas investiga problemas que o aproxima de colegas da mesma área de equações elípticas em qualquer lugar do mundo. Vemos então que a insistência no Brasil de submeter o serviço social a uma leitura marxista indica que ele não existe como um departamento independente, mas constitui um mero apêndice de um departamento (virtual) de “crítica marxista”, que congrega vários cursos que padecem do mesmo mal.
Não deixa de causar repulsa a assumida presunção de Davi Perez e seus colegas de acharem que “os problemas mais sentidos da classe trabalhadora são a expressão do capitalismo e da questão social”, e que “o assistente social, neste contexto, é um agente político que se coloca do lado do povo e da classe trabalhadora na luta pelos seus direitos.” Com efeito, uma afirmação deste tipo ignora a exploração e degradação a que os trabalhadores estão submetidos nas ditaduras comunistas (afinal, isso sequer é mencionado, e Davi Perez é um bem conhecido apologista do comunismo) , que passa a ser então um modelo a ser construído pelo assistente social. Essa visão que Davi Perez e seus colegas tentam imprimir ao curso de serviço social é maléfica para o Brasil, pois comprova a conotação ideológica a que estarão submetidos os jovens que decidirem cursar serviço social. Definitivamente, a sociedade que financia a universidade precisa ser consultada se aprova o funcionamento de um curso serviçal de uma ideologia.
Quanto a Davi Perez e seus colegas autores do vídeo espera-se que, uma vez formados, tenham a honestidade intelectual de por no seu portfólio o vídeo onde expressam sua visão da função a ser desempenhada pelo assistente social e que não venham a trabalhar numa empresa privada. Isso seria um próprio atestado do fracasso de sua ideologia, afinal, que consistência há num indivíduo que enquanto estudante posava de revolucionário, se depois, por falta de opção, tiver que trabalhar para aquele a quem mais despreza?
*Marcelo Carvalho
Professor do Departamento de Matemática