Água e óleo não se misturam

O Prof. Carlos Alberto Marques publicou em 22 de abril, um artigo de opinião na página da Apufsc “A Universidade e seus desafios” Leia aqui.

O texto está muito bom e trata de maneira sutil e cuidadosa dos desafios de nossa universidade pública e com opiniões com as quais eu concordo em sua maior parte. O mesmo artigo recebeu um comentário do Prof. João Cândido Lima Dovicchi do INE. Seguem abaixo as minhas opiniões sobre os pontos com os quais eu discordo no artigo do Prof. Marques e sobre o comentário do Prof. Dovicchi.

Rede

Não concordo com o Prof. Dovicchi. Assistir a jogos de futebol transforma alguém em um craque?…Certamente não…e, da mesma forma, não é o acesso que hoje temos à informação que nos possibilita a formação de quadros capazes de produzir mudanças significativas no país, por maior que seja a base que este acesso proporciona. O conhecimento não é uma enciclopédia estática, mas um processo dinâmico que resulta da interação entre vários atores e que se modifica com este processo. E sem querer tirar a importância de termos, hoje, o pleno acesso à esta base, não há “base” ou “enciclopédia” que eduque alguém ou mude alguma coisa. Quem faz isto é o seu processo de construção…e este não está na rede.

Nosso futuro e a eleição para Reitor

Também não concordo com o Prof. Marques, quando ele afirma em seu texto que “…nosso futuro não depende da forma de eleição para reitor“. De fato, “não dependeria” em condições ideais, caso as decisões de nosso Conselho Maior fossem o resultado de Eacuted+saberesEacuted+ e o nosso Reitor fosse apenas um Gestor, capaz de implementar estas decisões (como sói acontecer nas boas universidades do planeta).

Contradição

Mas estamos muito longe disto aqui na UFSC, como o próprio autor admite (e, lamento, mas aqui pinta uma contradição em seu texto). Nossas decisões são norteadas pela política, pela ideologia e pela busca do poder. E basta acompanhar as reuniões do CUn para constatar isto. Parafraseando o Prof. Rosendo Yunes, isto nos levou à uma crise de autoridade, onde o nosso verdadeiro valor institucional (o saber) deixou de ter qualquer valor diante da medíocre busca do poder via articulações políticas e/ou sobre ideologias, também políticas.

Liderança

Neste universo e, considerando este contexto, o Reitor (e a forma de escolha do Reitor) passa a ter um papel chave no futuro da universidade. Nossa universidade, hoje, não precisa apenas de um Gestor, mas de alguém com um profundo conhecimento da vocação e do papel da universidade em um país como o nosso e que tenha liderança suficiente para convencer os seus pares para esta empreitada.

Democracia

Democracia é uma palavra bonita, mas mal compreendida. E, aqui, não há como não lembrar que a UFSC é uma instituição do Estado (…não, absolutamente não, uma “república”) e precisa ser eficiente. Não será se não for meritocrática. E meritocracia implica em proporcionalidade entre direitos e deveres. De fato, é com esta proporcionalidade que se dá o processo democrático, pois, de outra forma, premiando deveres desiguais de modo igual, estaremos sendo injustos e, em consequência, antidemocráticos. E o prejuízo acaba na conta da instituição…e no bolso do povo.

Pluralidade

Esta é outra palavra bonita, mas mal empregada. Ainda que concorde com o Prof. Marques e que seja muito bom que convivamos em uma comunidade com uma grande diversidade de conceitos, cabe também lembrar que a pluralidade encontra o seu limite na linha que separa o dever para com a instituição em seus propósitos do dever para com os nossos próprios propósitos. De um lado desta linha temos água… e do outro, óleo.

E água e óleo não se misturam.

*Paulo Cesar Philippi
Professor do Departamento de Engenharia Mecânica da UFSC