A assombração da PEC 241

Prof. Nestor escreve em seu texto “PEC 241: Pode combater sem medo (quarta parte)” que a PEC 241 é “muito mais do que uma questão econômica”, e prossegue afirmando que o atual governo tenta, na verdade, “definir o rumo do país nos próximos 20 anos”, (ou seja, cinco mandatos presidenciais) ao delimitar os percentuais dos investimentos em saúde, educação e outras áreas.

Ao afirmar isso, vemos que o prof. Nestor aposta na desinformação ao compreender erradamente os objetivos da PEC 241, já que a idéia geral do projeto de emenda a constituição é controlar o gasto público colocando um teto para esses gastos, limitado ao que foi dotado no ano anterior corrigido pela inflação daquele ano. Ao contrário do que afirma o prof. Nestor, colocar um limite para os gastos públicos não implica em delimitar como o governo deverá gerir os recursos que arrecada, mas sim em ordenar de forma racional como serão feitos esses gastos. Vamos a um exemplo. O sistema de saúde no Canadá oferece um serviço médico que dá acesso gratuito a hospitais e a consultórios médicos. Inicialmente, pensou-se também na cobertura odontológica que, no entanto, acabou não ocorrendo (pelo menos na província de Ontario) dado ao alto custo de manter tal benefício. Ora, vemos aqui um exemplo de como definir prioridades em função do que se tem para gastar. Não parece então nenhuma heresia definir prioridades fixando um limite superior para os gastos, especialmente numa época de escassez de receitas.

Prof. Nestor volta a insistir numa argumentação difusa e falaciosa ao opor o gasto do governo com a dívida pública (algo que segundo ele consome a maior porcentagem do orçamento) junto ao teto dos gastos proposto pela PEC 241. Inconformado, prof. Nestor escreve que “… É claro que dentre as áreas em que NÃO foram restritos os gastos está o pagamento de juros da dívida. Isso é, está se retirando recursos de áreas essenciais para manter os lucros dos rentistas do sistema financeiro.”

O que mais surpreende nesta declaração do prof. Nestor é que o comprometimento da receita com o pagamento da dívida pública não é algo novo, mas algo iniciado com os governos anteriores e, curiosamente, não lembro de nenhum texto do prof. Nestor criticando isso (por que será?). Mas, afinal, está sugerindo o prof. Nestor que o Brasil faça o mesmo que fez a maravilhosa Argentina e dê um calote, deixando de pagar o que deve?1. Fica evidente que prof. Nestor não propõe soluções, tampouco presta atenção na análise de economistas em artigos de jornais que em linguagem menos técnica mostra a necessidade de se equacionar as contas públicas como condição necessária para baixar a taxa de juros, que por sua vez permite a retomada do investimento por parte de empresas, que por sua vez gera empregos etc. Não acredito que esses economistas e suas análises (muitos inclusive críticos do governo em outros aspectos) se enquadre no perfil descrito pelo prof. Nestor quando escreve que “especialistas (do governo) em economia  tem um papel preponderante, precisam esconder o que está sendo feito com o dinheiro público, utilizando linguajar complicado para que o grosso da população não entenda e perca o interesse”. Curioso, ao escrever textos neste boletim abusando de argumentos oblíquos e tendenciosos tenho a impressão que o prof. Nestor faz exatamente a mesma coisa.

Notas

1 Uma outra possibilidade seria talvez recorrer aos colegas do IELA para que socorram nossa economia, afinal, o modelo bolivariano é mesmo maravilhoso, e a Venezuela é um modelo.


Marcelo Carvalho

Professor do Departamento de Matemática