Armadilhas do discurso: ciência e religião

O professor Marcelo Carvalho me solicita, respeitosamente, reescrever meu texto sobre a PEC 55 porque ele continua a favor da mesma.

A economia não é uma ciência com leis como a física a nível macroscópico. Não são leis, são probabilidades estatísticas como na física quântica, porque o comportamento individual não pode ter predição. Paul Krugman procura com seus trabalhos mostrar um comportamento geral, universal, de alguns fatos econômicos dentro de um sistema determinado, nosso sistema econômico atual, caso contrário não seria ciência econômica, mas história de casos particulares.

Grant Osborne se refere à hermenêutica da interpretação da Bíblia, livro escrito há milhares de anos, em outros idiomas, com significados de palavras diferentes para cada época e região.

Evidentemente o trabalho de exegese e interpretação da Bíblia é bem mais complicado que aquele de Paul Krugman, que escreve em 2014, para nosso sistema econômico, não de sistemas de milhares de anos atrás A analogia do prof. Carvalho, entre a hermenêutica da Bíblia e de Krugman, é totalmente irreal.

O prof. Carvalho em seu desejo de persuadir em sentido contrário, ao que Krugman claramente indica assigna a Krugman uma frase (*) que foi proferida numa palestra por Christina Romer, que é atual, e que se aplica perfeitamente a nosso país como a toda Latino América.

A amostra, considerada por Krugman, são 173 casos em países avançados, assim classificados por pesquisadores do Fundo Monetário Internacional, que paga aproximadamente 500 mil Euros, mais 60 a 80 mil para gastos de representação, a seu  presidente para obedecer e beneficiar os bancos, o US$, não as pessoas de carne e osso. Essa amostra é estatisticamente, totalmente significativa, mais ainda em nosso Brasil, que não está muito avançado.. Ou seja, demonstra uma clara tendência para um resultado negativo das políticas de ajuste na depressão.

Se o prof. Carvalho lê a introdução do livro de Krugman poderá observar que ele escreve da crise de países como Grécia, Irlanda e Espanha com um desemprego de 23%d+ e entre jovens de 50%.  Escreve que a falta de trabalho penaliza a muitas pessoas, no Brasil a 12 milhões de pessoas. Comenta da Grande Crise de 1929, relacionada com a de 2008, comenta a opinião de Keynes, outro destacado economista, que não compactuo com o poder do dinheiro, que escreveu uma frase essencial: “No auge, e não na depressão, é a hora da austeridade”.

O prof. Carvalho não observa o terrível dano que a PEC 55 fará com respeito a pesquisa, educação e saúde. Até Gandhi, o grande libertador da Índia, quando se procurava reduzir os gastos para pesquisa porque era um país pobre, indicou: “Precisamente porque os pobres necessitam da pesquisa para se desenvolver”.

Nossa própria experiência, que o Prof. Carvalho deve conhecer respeito da economia Argentina, demonstra que a PEC é completamente errada. Ao assumir o mandato o ex-presidente Nestor Kirchner, a Argentina estava, talvez, em sua pior depressão da história, com dívidas que não poderiam ser pagas, e foi quando foram estimulados os gastos em salários, saúde, educação, obras públicas etc. etc. além de reduzir a dívida externa usaria em 70%,  recuperou-se a economia e o crescimento de Argentina para 10% anual por vários anos.

A Argentina repatriou aproximadamente entre 1200 e 1500 cientistas e conseguiu em poucos anos ser o oitavo país em lançar dois satélites para comunicação, por uma empresa privada, apoiada pelo Estado, que atualmente pela nefasta política de austeridade está em vias de desaparecer.

É evidente que estas políticas são desenhadas no exterior, não no Brasil. O prof. Carvalho não observa a entrega do patrimônio nacional, do pré-sal sem participação da Petrobrás, PEC 55 que corta gastos fundamentais para desenvolver um país soberano, juros de 14% usurários, que representam gastos imorais muito maiores que os de previdência, Ciência e Tecnologia, saúde etc. Manifestam claramente o verdadeiro poder que governa: o dinheiro.

Segundo levantamento da consultoria brasileira Infinity Asset, Brasil ainda ocupa a liderança entre os maiores pagadores de juros reais no mundo, descontando as projeções medias de inflação futura: 8,49%, Rússia 4,27%, Colômbia 3,61%, Argentina 2,55%, China 2,30%, México 1,35%, Índia 0,95%, estão no topo da lista. Estes juros usurários sugaram a sangue de nosso país não permitindo seu desenvolvimento.

O prof. Fernando Nogueira da Costa, da Unicamp, especialista em Teoria Monetária e Financeira escreve que a economia brasileira não esta viciada como acreditam os neoliberais, em políticas keynesianas de dinheiro “farto e barato”, mas em dinheiro “raro e caro” pelos juros altos. Isto criou um vício, a agradável sensação de enriquecimento sem fazer força.  Qualquer pessoa que tinha aplicado R$ 230,000 em 2002, e deixasse seu dinheiro capitalizando com juros compostos a base de 100% da Selic nominal teria no final de 2014 R$ 1.001.618,00.

Imagina o sr.  professor quanto ganhou Soros, o capitalista americano, que depositava milhões de US$, com Malan e Armínio Fraga seu empregado, no governo neoliberal do PSDB com juros de 26% e agora novamente no poder. Esse capital especulativo, sem dúvida nenhuma foi nefasto para nosso país. Como sempre este capitalismo selvagem não beneficia os pobres que acordam as 4 ou 5 horas para levar nosso lixo, nem as generosas enfermeiras que trabalham por salários miseráveis, nem as 11 milhões de famílias que moram em favelas e que agora observam que o programa minha casa minha vida será paralisado, beneficia aos Ricos capitalistas que realmente não fazem nada mais que especular.

O senhor professor acredita em pessoas, sem princípios, que são meras marionetes do poder econômico e que trocam de posição segundo sua cobiça, numa fictícia democracia onde a informação, base fundamental da mesma na atualidade, é monopolizada fundamentalmente por poderosos grupos econômicos donos de jornais, TV, internet etc. etc. que repito, deveria ser dada, democraticamente, manifestando todas as opiniões, pelas universidades comprometidas com o país real.

O Sr. professor acredita em Meirelles, autor da PEC 55, que preside o Conselho de Administração da JEF Investimentos dono do Banco original, JBS, Vigor e outras empresas, acredita que ele vai trabalhar para o povo o para os bancos dos quais foi empregado?

Foi o poder da Rede Globo que levou Collor a presidência do país. Ele como primeira medida para satisfazer aos usuários de carros de luxo, abriu os mercados, isto levou a quebrar aproximadamente 1200 indústrias químicas incipientes, de fármacos, aditivo alimentar etc. que não podiam competir com as poderosas do exterior. A Índia conservou suas empresas e atualmente nos vende 10 bilhões de US$ de produtos químicos para formular os genéricos.

Collor destruiu assim um trabalho realizado durante 10 anos pela Codetec, da Unicamp, que realizou uma excelente hermenêutica, pode-se dizer assim, das patentes protetoras de síntese de produtos químicos. Este trabalho aplicado para desenvolver indústrias, um exemplo para todas as universidades, que igualmente foi eliminado como símbolo de nossas possibilidades tecnológicas.

Estes são os claros motivos que levaram o Papa Francisco, falar aos movimentos populares (Roma 05/11/16) “Quem governa então? O dinheiro. Como governa? Com o chicote do medo, da inequidade, da violência econômica, social, cultural, e militar que engendra mais e mais violência num espiral descendente que parece não terminar jamais.d+ !Quanto dor, Quanto medo! Existe um terrorismo de base que emana do controle global do dinheiro sobre a terra e atenta contra a humanidade inteira. Do terrorismo básico se alimentam os terrorismos derivados como o narcoterrorismo, o terrorismo de estado e o que erroneamente se denominam étnico ou religioso”.

Compreendo que toda atitude política tem um componente religioso e que toda religiosidade tem um componente político por isto como o prof. Carvalho citou um evangelista, Grant Osborne, desejaria perguntar respeitosamente ao prof. : 1) O Reino de Deus predicado por Jesus e para os que sofrem agora e serão recompensados no céu?  Ou o Reino de Deus é uma obrigação nossa de construir um mundo de irmãos, com um pai comum, um Reino de solidariedade, de amor, de cooperação e não de competição mortal como a atual?.3) Acredita que a PEC 55 contribuirá com o Reino de Deus ou do Dinheiro?


Rosendo A. Yunes

Professor aposentado