Reforma ou Golpe: mudar o que no Regimento da APUFSC?

A falta de quórum nas assembléias da APUFSC deve ser vista sempre comparativamente com o número de associados junto ao sindicato. Assim, em uma situação em que o número de associados se mantêm estável podemos inferir que a falta de quórum em uma Assembléia Geral (AG)  revela tão somente um desinteresse com a forma de deliberação, mas não com o sindicato em si. Assim, no que consiste a proposta de reforma do regimento da APUFSC? Dependendo do que for proposto podemos estar diante de uma reforma (vista em um sentido positivo) ou de um golpe.

 

Assim, parece um golpe propostas de diminuição do quórum de instalação de AG”s, quer seja da assembléia ordinária ou de greve, ou  mesmo da assembléia que valida ou não a  mudança de regimento/estatuto. Com efeito, nosso regimento determina que AG”s ordinárias sejam instaladas com pelo menos 5% de associados, cerca de 140 docentes, enquanto que AG de greve deve seguir um formato de AG permanente de dois dias, onde o primeiro dia é destinado a discussão e o segundo dia é destinado a deliberação com voto em urna e contemplando um universo de pelo menos 25% de associados. Ora, não deixa de ser suspeito o caráter golpista de uma proposta de redução de quórum de AG, pois a redução não resolve o problema da pouca participação, com o agravante que tampouco legitima as decisões da AG em deliberações importantes. O risco que se corre nestas propostas de redução de quórum fica bem explícito nas AG”s do SINTUFSC e do ANDES, onde decisões importantes de greve são decididas por uma margem muito pequena de associados, algo que de modo algum pode ser tomado como legítimo indicador da vontade da maioria.

 

Ano passado, vimos a ilegítima tentativa de um grupo de docentes em deflagrar uma greve na UFSC criando um vergonhoso “comando unificado de greve” (ou algo parecido) a revelia da APUFSC . Tal movimento não logrou êxito e os grevistas tiveram que voltar ao trabalho por determinação do MPF. Na ocasião, os grevistas alegaram ao MPF que “a greve é da categoria e não do sindicato”, numa tentativa de tomarem para si a condução do movimento de greve. A tese é a princípio aceitável, contudo, o MPF ressaltou que em lugares onde existe um sindicato legalmente reconhecido como representante da categoria cabe a este sindicado conduzir o processo e não um grupo que decide formar um obscuro “comando unificado de greve”. Mas, o que deve ser devidamente compreendido aqui são as razões que levaram esses docentes a passarem por cima da APUFSC, organizando o comando unificado de greve, e de como o regimento da APUFSC foi decisivo para desautorizá-los. A explicação é simples. Com os 5% de quórum atual exigidos em uma AG ordinária da APUFSC, esses docentes precisariam de somente 140 colegas para forçar a instalação de uma AG de greve na APUFSC, contudo, não fizeram isso por duas prováveis razões. Ou não tinham no seu movimento unificado sequer 140 colegas filiados a APUFSC e habilitados a participarem de uma AG ordinária para instalar  o processo de greve, ou não quiseram fazer isso para não se submeterem  as exigências de um quórum mínimo de 25% de associados para deliberar pela greve, que nos moldes da  APUFSC prevê inclusive a votação aberta a não associados, temerosos que a maioria decidisse contra a greve e, neste caso, teriam que aceitar  a decisão negativa da maioria e voltar ao trabalho. Obviamente, não estavam dispostos a correr tal risco.

 

Afim de alertar para a importância de um quórum mínimo qualificado em AG”s é interessante observar que se os docentes que instituíram  o tal “comando de greve unificado” sequer conseguiram 140 docentes para instalarem uma AG ordinária na APUFSC, qual seria o quórum com que eles validavam as sua decisões nas deliberações do comando unificado?

 

Vemos então deste episódio que o quórum mínimo para a instalação de AG, como consta no regimento atual, é uma defesa natural do sindicato contra manobras de grupos minoritários que no passado dominavam a APUFSC, fazendo-a um satélite obediente da ANDES e subserviente à sua militância ideológica que em nada lembra um sindicato que se diz representante de docentes. Não é isso que a maioria deseja para a APUFSC, como ficou demonstrado na desfiliação da APUFSC da ANDES.

Como proposta de reforma do regimento, é possível pensar não numa redução do quórum mínimo, mas sim em uma diversificação dos processos de deliberação da AG, fazendo com que a AG contemple uma sessão presencial (onde os associados podem  discutir e expor visões divergentes) seguida por uma deliberação via consulta eletrônica, algo que se revela um meio legítimo, mais inclusivo e democrático de deliberação. Aos que se opõe a tal ampliação do leque de formas de deliberação, é bom lembrar que a AG de greve da APUFSC já contempla isso, pois a deliberação não se dá num único e pontual instante, evitando que na balbúrdia de uma AG surja um iluminado que decide por a questão em votação (isso após passadas longas horas), evidentemente, depois de estar  seguro que ganhará a votação.

Outro ponto importante refere-se a atuação do Conselho de Representantes. É um fato notório que se as AG”s estão esvaziadas, algo parecido vai se manifestar na atuação do conselheiro junto aos seus colegas de departamento que provavelmente não participarão de discussão alguma. O que se vê então é uma situação onde o conselheiro se auto representa nas reuniões do CR, e isso é tão nocivo quanto a redução do quórum mínimo em AG. Persistindo a auto representação de conselheiros, não se deve propor dar ao CR atribuição deliberativa em questões que são hoje atribuições de AG e que digam respeito a pontos que afetam os associados como um todo.

O sindicato talvez possa se revigorar enxugando de forma racional a ocorrência de AG”s, afinal, não parece razoável que docentes deixem semanalmente suas atividades para se tornarem sindicalistas, tendo que participar  de forma rotineira de discussões do sindicato, grupos de trabalho etc.. Neste sentido, a praticidade da utilização de consultas eletrônicas também deve ser contemplada na reforma do regimento.

 

Os tempos mudaram e os docente, que no passado eram combativos e viveram sua época dourada contestando tudo e todos, percebem agora uma nova dinâmica que não dá espaço à dispersão do tempo, e onde os novos docentes ditam outro ritmo de trabalho e outra percepção de sindicato e sociedade. O desafio do sindicato é exatamente se reinventar de forma a agregar (não necessariamente agradar) a todos.

 


Marcelo Carvalho

Professor do Departamento de Matemática