Remanejamento de recursos para o CNPq não garante bolsas até o fim do ano

O remanejamento de recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) anunciado no início da semana pelo Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTIC) não garante o pagamento de bolsas de pesquisa até o final do ano. É o que afirmam representantes do ministério e do conselho que participaram, na quinta-feira (5), de audiência pública conjunta das comissões de Educação (CE), de Ciência e Tecnologia (CCT) e de Fiscalização e Controle (CTFC).

A audiência foi requerida por senadores das três comissões em razão da ameaça de paralisação de pesquisas por falta de recursos para o pagamento de bolsas. De acordo com o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), autor de um dos requerimentos, 83 mil bolsistas poderiam deixar de receber, o que comprometeria pesquisas em todo o país.

O secretário executivo do MCTIC, Júlio Francisco Semeghini, que representou o ministro Marcos Pontes na audiência, explicou que o déficit para honrar o pagamento das bolsas de setembro a dezembro era de cerca de R$ 330 milhões. O valor diminuiu com o remanejamento de recursos pelo ministério. Foram R$ 82 milhões remanejados no CNPq, da área de fomento em pesquisas para a área de bolsas. O remanejamento, no entanto, só garante o pagamento das bolsas de setembro, a ser feito em 5 de outubro.

Recursos

O representante do Ministério da Economia na audiência, José Ricardo de Souza Galdino, explicou que o governo está trabalhando para tentar resolver o problema dos recursos que faltam para o pagamento das bolsas. Ele afirmou que a Junta de Execução Orçamentária do governo deve se reunir em setembro para analisar as possibilidades de cancelamento de dotações em outras áreas para cobrir o que falta.

Uma das saídas para cobrir as despesas com as bolsas é usar  uma parcela do fundo formado por recursos recuperados pela Operação Lava Jato, a partir dos desvios da Petrobras. Os recursos seriam usados em outros projetos do ministério, mas em caso emergencial,  Marcos Pontes já declarou que poderiam ser destinados ao pagamento dos pesquisadores.

O CNPq é a principal agência de fomento à ciência do governo federal, ligada ao MCTIC. Além de financiar projetos de pesquisa, o conselho apoia bolsistas em universidades e institutos de pesquisa. De acordo com o diretor de Gestão e Tecnologia da Informação e presidente substituto do CNPq, Manoel da Silva, a quantidade de bolsas não acompanha o crescimento da comunidade científica.

“A comunidade científica está crescendo. O número de bolsas do CNPq continua num patamar de 80 mil bolsas, ao passo que na última mensuração da Plataforma Carlos Chagas [que reúne dados sobre bolsas de pesquisa], já estávamos com 200 mil pesquisadores. Isso quer dizer que há uma demanda reprimida muito grande”, alertou.

Desvios

O presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, afirmou que o orçamento dos principais fundos de apoio à pesquisa científica e tecnológica no Brasil vem caindo desde 2015. Para ele, a situação da ciência é grave e uma das principais razões é o desvio de finalidade dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, já que recursos recolhidos das empresas para apoiar a pesquisa são usados para pagar a dívida pública.

“Esses recursos foram obtidos por meio de impostos de empresas que trabalham nas áreas de recursos hídricos, eletricidade, petróleo e gás. E essas empresas têm o imposto recolhido destinado a apoiar pesquisas que interessam a esses setores e, no entanto, esses recursos têm sido contingenciados, ou seja, desviados da sua finalidade original, para quitar a dívida pública. É uma questão séria. Eu me pergunto até sobre a legalidade disso”, lamentou Davidovich.

O presidente da Associação dos Servidores do CNPq, Roberto Muniz Barretto de Carvalho, também apontou desvio de finalidade no fundo. Ele afirmou, ainda, que o valor destinado a atividades de fomento à pesquisa no orçamento do CNPQ para 2020 é insuficiente, e que não adianta pagar as bolsas e retirar dinheiro de insumos e laboratórios, por exemplo.

“Essa política não é cega porque eu acho que tem intenção. Essa reestruturação busca desmontar um projeto de país autônomo e soberano, quebrar um sistema que favorece a inclusão social. Quem está hoje no poder não tem essa visão, infelizmente, e enquanto perdurar essa reorientação do sistema nós vamos perder autonomia, nós vamos perder soberania, nossa população vai ficar desassistida”, criticou Barretto.

 As informações são da Agência Senado