Estudo expõe desvantagens enfrentadas por pesquisadores que não têm o inglês como primeira língua

Apenas duas das revistas analisadas declararam categoricamente que o autor não se expressar de modo satisfatório em inglês faz com que seu paper seja rejeitado

Um time de pesquisadores de 10 países analisou as políticas de publicação de 736 revistas científicas de ciências biológicas e identificou barreiras impostas a autores que não têm o inglês como idioma nativo. Alguns desses obstáculos são bastante conhecidos. Como o inglês é a língua franca da ciência, não é incomum que editores de revistas sugiram aos autores a contratação de serviços de empresas especializadas em edição ou tradução de textos científicos para assegurar que o conteúdo de um manuscrito esteja expresso de forma clara e seguindo a norma culta inglesa – e isso amplia os custos de publicação, prejudicando principalmente autores de países pobres.

Também há barreiras menos tangíveis. Das 736 revistas analisadas, só duas delas, Nature e Nature Plants, declararam categoricamente em suas diretrizes que um paper não será rejeitado apenas porque o autor não se expressa de modo satisfatório em inglês – o essencial é avaliar a pertinência e a qualidade de seu conteúdo. Além de analisar regras de publicação, o grupo entrevistou editores-chefes de 262 desses periódicos – e só 6% deles instruíam revisores a não rechaçar preliminarmente artigos em inglês com problemas de gramática, clareza e fluidez. Cerca da metade dos editores sugeria a autores o uso de serviços on-line e gratuitos de edição em inglês para correção gramatical ou os encaminhava a tutoriais na internet. Só 1% das revistas ofereceram assistência por meio de programas de mentoria gratuitos. Uma novidade do estudo, publicado no repositório EcoEvoRxiv e ainda não revisado por pares, foi apontar exemplos de revistas que fornecem suporte a pesquisadores cujos manuscritos precisam de ajustes no idioma. Periódicos mantidos por sociedades científicas tendem a ser mais inclusivos. A Sociedade para o Estudo da Evolução, sediada nos Estados Unidos, dispõe de um programa de mentoria em inglês para apoiar quem submete trabalhos à revista Evolution. De forma gratuita, editores com experiência em escrita científica podem sugerir mudanças leves e discutir diretamente com os autores maneiras de tornar o manuscrito mais claro. Os autores podem solicitar o suporte antes de apresentar o artigo ou durante o processo de revisão.

Outro exemplo é o do Journal of Field Ornithology, vinculado à Associação dos Ornitólogos de Campo, uma organização científica norte-americana que conecta autores que não têm o inglês como língua primária com voluntários que podem ajudá-los a aperfeiçoar seus textos. A Sociedade Americana dos Mamalogistas criou um esquema de parceria gratuito, o ASM Buddy System, no qual zoólogos especializados em mamíferos ajudam a melhorar o nível de inglês de manuscritos, enquanto o Journal of Ecology, da Sociedade Ecológica Britânica, disponibiliza um serviço gratuito de revisão por inteligência artificial, o Writefull. O apoio aos autores é bem recebido. Germana Barata, pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados de Jornalismo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), disse à revista Nature que teve uma boa experiência ao publicar em inglês no periódico Cultures of Science. “As correções e edições não mudaram em nada minhas ideias, a essência do que eu estava escrevendo ou o estilo”, diz ela. “Isso não acontece em muitas outras publicações.” O estudo propõe um conjunto de ações para enfrentar as barreiras linguísticas, como um compromisso público dos periódicos com a avaliação justa do conteúdo de papers, mesmo os que têm problemas de escrita, ou a oferta de serviços gratuitos para tornar mais legíveis em inglês artigos com conteúdo relevante.

Leia na íntegra: Jornal da Ciência