Como interpretar e o que fazer depois da votação sobre a greve?

Por Ana Maria Cartaxo, Cynthia Campos, Marcos Ferreira, Maria Odete Santos e Paulo Horta*

O resultado da votação não encerrou o debate sobre os rumos do movimento docente. Seguimos em Estado de Greve. 

Mais de quinhentos docentes (cerca de 47 por cento dos votantes) apoiaram a entrada imediata na greve. A maioria que disse não, inclui aqueles que diriam não a qualquer greve e muitos que não se recusam à mobilização, mas resultam da precariedade das condições já estabelecidas para isso. 

Seguimos sem informação segura sobre o andamento da mobilização nacional. Resta inaceitável que até o momento de nossa votação, o sindicato majoritário em nossa categoria não tenha feito uma indicação explícita sobre essa mobilização. Por explícita referimos uma lista completa das ADs, com dados verificáveis sobre seus posicionamentos (incluindo número de participantes e número de votos em cada posição). Foi assim que sempre fizemos. 

Já apontamos a importância de conjugar três dimensões na mobilização: a luta por salários (e aposentadoria), a luta por verbas para a Universidade e o combate ao fascismo. 

Urge a apresentação de uma leitura sincera da evolução dos salários de docentes. Como foi a sua evolução nas últimas duas décadas? Eles foram recompostos frente à inflação? Eles chegaram a crescer acima da inflação, até o golpe jurídico/parlamentar de 2016? 

A mesma sinceridade precisa averiguar informações sobre a evolução (e possível crescimento) das verbas destinadas à

manutenção e investimento nas IFES, assim como aquelas destinadas à Ciência e Tecnologia, que impactam o cotidiano acadêmico, entre 2003 e 2015. 

Essa transparência precisa incluir em nossa história a inédita expansão das instituições universitárias federais no país, entre 2003 e 2016. 

A principal alteração contextual vivida por nós entre aquele período e os dias atuais corresponde ao crescimento da extrema direita no país. 

Com esse crescimento, que se materializa em número de parlamentares no Congresso Nacional, ganhou força a tese da famigerada austeridade na administração pública, que se materializa na exigência de déficit zero. 

Por que famigerada? Porque ela corresponde a uma criatividade de economistas neoliberais para manietar governos que pretendam atender a interesses populares. Trata-se de uma tese diversionista, já que o tal Mercado e seus títeres no parlamento nada fizeram enquanto o governo de extrema direita avançou o déficit em mais de meio trilhão de reais. 

Vale lembrar que a maior obra dos golpistas de 2016, foi o estabelecimento do teto de gastos, que eles mesmos furaram para atender a interesses não populares. 

Pois bem, seguimos em estado de greve, mesmo sem data para a sua instalação. Nos toca avançar na mobilização e debate dentro dos campi.

Defendemos um processo de acúmulo de forças do campo democrático, visando garantir não somente nossos salários e verbas, mas um crescimento político dos atores envolvidos. 

Defendemos o caminho da transparência sobre nossa história e andamentos atuais. Precisamos de um movimento que se construa sobre essa transparência. 

Defendemos ações que enfrentem as teses que a extrema direita e a direita oportunista se utilizam contra o desenvolvimento nacional soberano. Sem isso, nosso movimento corre o risco de se transformar em aparelho empregado ao desgaste do governo. 

P.S.: Uma atividade que poderia ter impacto sobre todos nós e sobre a sociedade seria um Júri Popular do Déficit Zero. Para uma denúncia da opressão da tese da austeridade. 

P.S.: O debate sobre a dívida pública, que jamais é olhada pelos defensores do déficit zero, poderia ajudar a oferecer substância para um possível posicionamento contra a tese da austeridade. 

P.S.: Tematizar as eleições de 2024 seria uma forma de contribuir para a compreensão do momento atual. Quase dez por cento dos prefeitos catarinenses foram presos ou estão em vias de sê-lo. Todos ligados a extremismos de direita (logo, defensores do déficit zero). Esse tema nos aproximaria dos docentes da rede estadual. 

P.S.: O comportamento da mídia na defesa dos interesses do tal Mercado valeria um segundo Júri Popular ou algo que o valha. Todos os dias, todos os meios empresariais de comunicação estão martelando a tal austeridade. 

*Ana Maria Cartaxo, Cynthia Campos, Marcos Ferreira e Maria Odete Santos são docentes aposentados da UFSC. Paulo Horta é professor do departamento de Botânica (BOT/CCB).