*Por Lauro Mattei
Na Constituição Federal está explicitamente registrado que o Brasil é um Estado laico. Portanto, todas as instituições públicas federais devem respeitar essa laicidade. Recentemente dezenas de instituições acadêmicas, movimentos sociais e entidades sindicais lançaram um manifesto em defesa da laicidade do Estado Brasileiro, implicando que as instituições públicas federais – a UFSC aí incluída – não devem atuar sob o prisma da religião, seja ela qual for.
Na UFSC esse assunto já fez parte – e ainda faz – de muitas discussões desde a época em que foi construído um templo na praça da cidadania ao lado da Reitoria. Lembro-me muito bem que logo após tal construção recebi alguns colegas de outras IFES para um evento acadêmico por nós organizado. Ao visitarmos a praça central da universidade todos ficaram atônitos ao saber que na UFSC existe um templo, inclusive para atividades religiosas.
Recentemente esse assunto retornou a minha agenda de preocupações com o destino atual da UFSC, preocupações estas que estão embasadas em dois casos que passarei a relatar na sequência:
Caso 1: Atividade religiosa clandestina no Auditório do CSE
Ao buscar materiais acadêmicos na sala que ocupo na ala do Departamento de Economia em um domingo de manhã, percebi a realização de uma atividade no auditório do referido centro, porém como as cortinas e as portas estavam fechadas não consegui saber o que se passava lá dentro. Ao indagar o vigilante da portaria do CSE sobre tal evento, o mesmo informou que “é um culto evangélico que está sendo realizado todo domingo de manhã”.
Como todos sabem, no CSE existe um sistema eletrônico rigoroso de controle do uso dos espaços físicos (salas, mini-auditórios e auditórios), o qual não permite que nenhum espaço seja utilizado sem a devida autorização da direção do CSE. Verifiquei se havia algum registro dessa atividade, pois estava estupefato com a informação recebida do vigilante. No sistema não há nenhum registro, o caracteriza o uso indevido daquele espaço, permitindo-me qualificar tal atividade como clandestina uma vez que não está seguindo os trâmites institucionais que todos os membros da comunidade acadêmica são obrigados a seguir.
Diante desse fato, há 8 dias fiz os seguintes questionamentos à direção do CSE, os quais permanecem sem resposta até o momento:
a)Por que a atividade que está sendo realizada aos domingos de manhã no auditório do CSE não está registrada no sistema?
b)Que tipo de atividade está sendo realizada naquele local?
c)Desde quando essa atividade vem sendo realizado e quem é o responsável pela autorização da mesma?
Sem as respostas institucionais necessárias, hoje (10.11.24) me dirigi ao local e fotografei e gravei a atividade religiosa clandestina que está sendo realizada numa universidade pública que se diz ser laica, com o agravante que tal ação não deixa rastro nos registros oficiais.
Caso 2: 1º Culto da Comunidade de Floripa no CFH
Nesta semana circulou nas redes sociais a convocação para esse “culto” que será realizado dia 17.11.2024, às 10 horas, no auditório B do CFH-UFSC. Além disso, informa-se que já estão confirmadas as presenças do Pr Edson Nunes (que imagino ser o pastor) e de Felipe Valente. Como nunca tinha ouvido falar nessas pessoas fui verificar suas biografias na internet.
No instagram do senhor Edson Nunes informa-se que ele é casado com Vanesa Nunes e tem dois filhos. É pastor da @umlugarcomunidade e possui doutorado em Bíblica Hebraica. Já no instagram do senhor Felipe Valente informa-se que ele é cantor e que desde 2022, após sair da Igreja Adventista do Sétimo Dia, pertence à igreja Um Lugar Comunidade, sendo um de seus fundadores.
Em síntese, parece que os preceitos constitucionais anteriormente mencionados não fazem mais parte das ações da UFSC. Com a palavra as direções das duas unidades acadêmicas mencionadas e também a atual administração da universidade!
*Lauro Mattei é professor de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Administração, ambos da UFSC. Coordenador Geral do NECAT-UFSC e Pesquisador do CPDA/UFRRJ.
Artigo recebido às 9h37 do dia 11 de novembro de 2024 e publicado às 11h15 do dia 11 de novembro de 2024