Nota sobre o Conselho Universitário de 06/06/2025

Por Alex Degan*

Prezada Comunidade Universitária da UFSC,

Nos últimos dias foi divulgado um vídeo, gravado no auditório da Reitoria em 06/06/2025, em que apareço protagonizando uma manifestação inadequada no início de uma sessão do Conselho Universitário (CUn). Trata-se de um vídeo que não dura mais do que alguns segundos, mas que está sendo propositalmente divulgado em câmera lenta e fora de contexto, com o intuito de atacar a universidade e o que ali se discutia. A verdade precisa ser restabelecida e por isso me dirijo à Comunidade Universitária com a presente nota.  

Em primeiro lugar, a referida sessão do CUn tinha como pauta deliberar sobre o relatório final da Comissão Memória e Verdade, o que incluía as recomendações sugeridas pela comissão, como publicar e disponibilizar o relatório na forma de livro; realizar uma sessão de homenagem aos membros da comunidade da UFSC que foram perseguidos durante a ditadura civil-militar; e revogar as homenagens concedidas pela UFSC para indivíduos que reconhecidamente colaboraram com o regime de exceção e até mesmo se beneficiaram dele, o que pode implicar a mudança no nome do campus sede da UFSC.

Em segundo lugar, antes mesmo da sessão do CUn acontecer, houve intensa movimentação em setores políticos, sociais e econômicos de Santa Catarina, como é o caso da ALESC, da Câmara dos Vereadores de Florianópolis e de entidades de interesse patronal, os quais se manifestaram contrários aos trabalhos da Comissão Memória e Verdade. Não obstante, a família do ex-reitor, já havia contratado uma advogada, a qual fora ouvida em reunião exclusiva com a Comissão, além de ter se manifestado na sessão do CUn ocorrida em 06 de maio de 2025, quando também o próprio neto do ex-reitor foi autorizado a fazer uso da palavra na plenária. 

Dado o contexto, no dia 06 de junho, ao chegar para a sessão do CUn, os conselheiros se depararam com um auditório ocupado por algumas dezenas de indivíduos de fora da universidade, entre os quais, figuras políticas locais, acompanhadas de seus assessores e apoiadores. A participação de membros externos ao CUn é permitida pelo Regimento da UFSC, desde que não participem das votações e solicitem autorização para fazer uso da palavra. Infelizmente, não foi o que se viu: durante toda a sessão escutaram-se gritos, xingamentos e tentativas de intimidação. Palavras de baixo calão e expressões misóginas, homofóbicas e preconceituosas incitavam à violência, obstruindo a sessão, o que resultou em diversos pedidos de prorrogação de tempo e em solicitações de questão de ordem, pois os conselheiros mal conseguiam escutar as pessoas efetivamente inscritas para falar. 

Filha do medo, a raiva é mãe da covardia”, cantou Chico Buarque em uma canção. E eles são covardes. Covardes por xingarem de todas as palavras possíveis os membros da nossa Comunidade Universitária. Covardes ao ofenderem o reitor e a vice-reitora de nossa instituição. Covardes por reafirmarem estereótipos e preconceitos sobre Estudos de Relações de Gênero, História, Artes, Sociologia e Filosofia. Covardes por louvarem, durante a sessão, autocratas e torturadores de ontem e de hoje. Covardes por mobilizarem os canais da imprensa local. Covardes ao falsear a história para defender a manutenção do status quo.

A universidade foi severamente atacada, em especial os cursos de Ciências Humanas, Sociais e Artes, acusados de serem frequentados por usuários de drogas, incompetentes, promíscuos e desocupados. Além disso, o trabalho árduo e sóbrio da Comissão foi completamente desqualificado aos berros, sem conhecimento acadêmico e técnico para elaboração das críticas, centradas exclusivamente em atributos morais, inverdades e agressões. Diante de tantas ofensas, reagi protagonizando o tal vídeo, uma tentativa de responder com deboche às tantas agressões que os presentes sofriam. Enquanto eles bradavam ódio, minha intenção foi reagir com humor. Lamento se minha reação tenha causado constrangimento aos meus colegas docentes, técnicos ou estudantes, razão pela qual ofereço meu sincero pedido de desculpas. Sou um péssimo dançarino, como restou evidente, mas saliento que além de não responder com agressividade, tentei acalmar os ânimos, apartei brigas e, ao lado da discente Amanda, fomos os responsáveis pela elaboração e apresentação do parecer sobre o relatório da Comissão Memória e Verdade, que foi aprovado por ampla maioria.   

Ao deixar o auditório na última sexta-feira, ainda impactado pela enormidade da violência que sofremos, refleti sobre a colossal vitória que conquistamos ao aprovar a implementação de TODAS as doze recomendações da Comissão Memória e Verdade. Em um país marcado por uma anistia irrestrita a golpistas, torturadores e beneficiários da ditadura civil-militar, e em que um político inelegível chegou a declarar sobre o trabalho de apuração dos desaparecidos políticos no Brasil que “quem gosta de osso é cachorro”, nota-se como a reparação histórica ainda hoje incomoda aquele que defendem a impunidade. Não permitiremos que sequestrem a narrativa com inverdades, ao mesmo tempo em que não aceitaremos que desrespeitem o trabalho de excelência, compromisso científico, humano, artístico e ético desenvolvido por nossa instituição. 

Juntos. Nós construímos. Juntos. 

E seguiremos unidos, oferecendo a nossa contribuição para um país mais justo, solidário e democrático.

*Alex Degan é diretor do Centro de Filosofia e Ciências Humanas

Artigo recebido às 10h do dia 9 de junho de 2025 e publicado às 10h54 do dia 9 de junho de 2025