UFSC aos 65 anos: a urgência de um projeto e de reinvenção

*Por Carlos Alberto Marques (Bebeto)

A UFSC nasceu como uma instituição “maiúscula”. Única no estado à época de sua criação, tinha um propósito claro: formar quadros da elite e servir ao funcionamento do Estado catarinense. Pode-se discordar desse objetivo, mas ele estava alinhado ao pensamento dominante daquele momento histórico, o que conferia direção administrativa e função social bem definidas.

Sessenta e cinco anos depois, o quadro é distinto. A universidade carece de um projeto institucional claro, apresenta enormes fragilidades de gestão, tornou-se excessivamente corporativa e encontra-se cada vez mais submetida a controles de agências externas. Como consequência, a UFSC vai se tornando “minúscula” diante dos enormes desafios contemporâneos e das demandas de uma sociedade profundamente desigual.

Há quem discorde dessa leitura, argumentando que a UFSC é bem ranqueada e, afinal, funciona. Sim, funciona — muitas vezes apesar da reitoria — e é ranqueada segundo critérios altamente controversos, que tendem a moldar não uma universidade, mas uma prestadora de serviços educacionais.

No Brasil, as agências de fomento regulam fortemente a pós-graduação e a pesquisa, orientando o trabalho docente e sua busca por distinção meritória. O que deveria ser um modelo de apoio e salutar indução, vira mecanismo que desloca o modelo de universidade baseado na unidade do tripé ensino–pesquisa–extensão. Por meio desses mecanismos de dirigismo, somados às ações de extensão, não é exagero afirmar que o docente passa a atuar como um microempreendedor: financia a si próprio, mantém seu laboratório e gerencia seus bolsistas-funcionários. Um dos efeitos colaterais é o desinteresse pelo ensino de graduação e o afastamento da vida institucional, política e administrativa, retomada apenas quando o Estado — na figura da reitoria — se manifesta sob a forma de burocracia e/ou ineficiência.

O desenvolvimento científico, a inovação e a prestação de serviços à sociedade são sempre desejáveis e devem ser estimulados. A questão central, porém, é: a quem servimos e com que finalidade?

O individualismo acadêmico excessivo fragiliza a instituição, enquanto a pulverização das ações de extensão compromete o engajamento com estratégias de desenvolvimento econômico e socioambiental sustentável, em âmbito nacional e regional. Debater essas questões e alinhar-se a tais objetivos é uma obrigação de uma universidade pública e federal que, financiada com recursos públicos, deve ser inclusiva e democrática.

Com o passar dos anos, as universidades públicas — a exemplo da UFSC — vêm perdendo força como centros formadores nos cursos de graduação. A evasão estudantil é um sintoma alarmante. Suas causas são múltiplas e tendem a se agravar com a presença crescente da Inteligência Artificial (IA). O jovem contemporâneo convive com a informação e com experiências criativas desde muito cedo, para além dos muros acadêmicos.

Ignorar essa realidade pode gerar custos elevados para as universidades e para a sociedade. No mundo das redes sociais e da IA, os estudantes se dispersam, os currículos perdem relevância, as projeções de empregabilidade tornam-se obsoletas e o ideal de inclusão e ascensão social é abortado antes mesmo de se concretizar.

A universidade que não debater e não se reinventar diante desse cenário desafiador não apenas deixará de atrair os jovens, como também se tornará refém de si mesma — presa ao corporativismo, recorrendo a apelos vazios por relevância e cada vez mais criticada pela sociedade.

No mundo atual, se a universidade se reduz a um lugar, ela se perde. Se, ao contrário, afirma-se como espaço de formação e criatividade, ela se reinventa.

Celebrar 65 anos não deve servir à mera autorreverência, mas a um exame profundo de virtudes e fragilidades, à correção de rumos e à reafirmação de valores e compromissos. Melhor fazê-lo por iniciativa própria — ou outros o farão em nosso lugar.

*Carlos Alberto Marques (Bebeto) é professor do CED/UFSC

Artigo enviado às 15h27 de 14 de dezembro de 2025 e publicado às 7h57 de 15 de dezembro de 2025