O ano de 2007 corre depressa, a largos passos, é como rio que flui e arrasta consigo tudo o que encontra pelo seu curso, arrasta tanto as coisas boas como as más. Não tem volta, o ritmo pode ser alterado ao sabor do tempo. Se chove em demasia: o volume e a velocidade aumentam, sua fúria a tudo derruba, seu mau humor é visível, ruge e acelera o passo, não tem piedade, é forte e indomável. Se o tempo é de pouca chuva: ele escoa mansamente, sem pressa, parece querer ganhar mais tempo, apreciar a paisagem, escolher com o quê ou quem pode interagir, é lânguido e preguiçoso, suave como uma brisa noturna, tem todo o tempo do mundo para um dedo de prosa.
Assim somos nós, seres humanos, ou pelo menos deveríamos ser assim. As tarefas do dia a dia, quando em excesso e com certa cobrança, podem muito bem acelerar o nosso rio interior e conduzir-nos com fúria e louco desatino aos objetivos finais. Se, pelo contrário, nossos afazeres estão dentro da medida do possível e as cobranças são aquelas de praxe, suportáveis e digeríveis, teremos tempo de focar nossa atenção em assuntos que também são de nosso interesse. E assim corre o ano de 2007, o sistema já foi todo montado, o rio corre furioso, atropelando o próprio tempo, todas as pontes foram derrubadas, estamos trancados em nosso próprio “eu” interior, preocupados em cumprir prazos, em concluir projetos pendentes, em correr atrás de mais uma bolsa ou de mais um trabalhinho para mantermos nossas famílias com dignidade.
Enquanto este maquiavélico sistema estiver desta forma montado, com certeza não teremos tempo e não conseguiremos visualizar o que se arquiteta à nossa volta. Exemplos estão aí para quem tiver um pouquinho de perspicácia e discernimento, o famigerado e eligíaco bolsa família, que já chega a um em cada quatro brasileiros, e, no Nordeste brasileiro um a cada dois nordestinos. E, o que no meu ver, é muito pior, criou-se uma dependência total destas pessoas à este sistema assistencialista de esmolas, sem chance alguma de que elas possam deixar este quadro. A bolsa família transformou-se num meio de vida, de sobrevivência, com seus míseros 15 reais por mêsd+ nas regiões mais pobres, já há falta de mão de obra para as lavouras e outras atividades agrícolas. Isto representa uma perversa redistribuição de rendas, nós trabalhadores, financiamos esta perversidade, sim perversidade, pois sem investimento em educação, sem programas de desenvolvimento auto-sustentável, sem acesso ao crédito, sem investimento em infra-estruturas de transporte e de saúde, fica praticamente impossível achar uma saída para este ciclo de miséria.
Outros exemplos não faltam, estão aí o Pró-Jovem (programa eleitoreiro pois só atingirá jovens em idade de votar), o PAC, o PDE, o Ruine, o regime de cotas, etc…. Aliás, quanto a este último item, gostaria de indicar o livro: Não Somos Racistas do diretor executivo de jornalismo da Rede Globo, Ali Kamel. Ele faz uma análise séria e coloca ao final, o que todos já sabíamos, que o problema nacional não é o racismo, mas a pobreza – que não diferencia negros, mulatos ou brancos ou quem quer que seja, basta ser pobre para ser excluído e ser escravo do sistema. Independência… Quando de ti ouviremos brado retumbante?
E da podridão que ronda os porões de nosso barco sem rumo, à deriva neste caudaloso rio que é nossa sociedade? O que podemos dizer? O que podemos esperar? Todos os mensaleiros do congresso, todas as falcatruas no Senado, todos os desvios de verba pública, todas as operações ilícitas, todos os políticos corruptos e desonestos, todos os escrófulas, todos os zaragateiros, todos os pústulas, tudo e todos, aí continuam, em liberdade, usufruindo uma impunidade invejável. De todas as operações empreendidas pela Polícia Federal até 2005, que resultaram na prisão de 250 pessoas presas, somente 64 pessoas foram a julgamento e destas só duas continuam presas, um belo retrato de nosso barco à deriva.
E nós? Onde estamos? Onde estão os pseudo-intelectuais deste País? Aqueles que defendiam o PT e seu representante maior, Lulla? E nós, professores? O que fazemos? Continuamos trancados em nossas salas, olhando para nosso próprio Ego. Admirados. Exclamando: – Como é grande o meu Ego. – Aliás, de tão grande, um só professor bastaria para toda a Universidade, sim, pois seu Ego ocupa todas as salas, todos os espaços, todas as praças, todos os átrios, todos os departamentos, todos os centros, o Campus todo. Continuamos em nosso pedestal, alheios aos fatos que saltam á nossa vista. Não tomamos conhecimento que deste governo corrupto só o diálogo não interessa? É necessário muito mais que diálogo, é necessário uma ação enérgica e contundente.
E algo extremamente preocupante surge aos nossos olhos, toma de assalto nossos sentidos, embota nosso pensamento, é quando analisamos o número de professores que participaram da consulta sobre formas de greve. Não que eu esteja de acordo ou contra tal iniciativa, o que chama a nossa atenção é basicamente a falta de coletividade, é realmente cada um pensando na sua sardinha. De um total de aproximadamente 2.100 associados, apenas 325 responderam à consulta. Destesd+ 140 são do CTC, 54 do CFM, CCB com 31, CCS com 22, CCE e CFH vem logo a seguir com 19 adesões, CED com 15 e outros centros com índices bem menores de adesão. Onde estará o restante dos associados? Será que é omissão pura e simples ou é uma forma de dizer que não concordam com a discussão? Por que motivo a grande maioria dos que aderiram à petição estão ligados ao CTC? Não vai aqui crítica nenhuma aos colegas do CTC. Apenas fico pateado em não entender o que se passa. Por outro lado, os nossos colegas técnico-administrativos podem ter lutado arduamente e não terem visto todas suas reivindicações atendidas, mas eu os invejo, pelo menos lutaram, combateram o bom combate. Mostraram que deste governo corrupto, que matou a esperança e dilapida o erário público dia a dia, nada vem de graça, mas só com muita luta e perseverança.
Senhores, a hora é agora, hora de libertar as amarras da inércia, içar âncoras, estufar as velas ao vento, sentir a brisa batendo no rosto, estufar o peito e sair para a luta sem guerras ou violência.
Escrevermos, gritarmos aos quatro ventos, deixarmos claro, como o mais alvo amanhecer, que ainda precisamos de justiça, que somos educadores, que ainda somos necessários nesta messe, que ainda podemos contribuir em muito com a educação e com o desenvolvimento desta nação. Compactuo com o excelente artigo do nobre colega aposentado professor Renato A. Rabuske. Não podemos agir como na música de Zé Ramalho: Estou vendo tudo, estou vendo tudo, mas fico calado e faço de conta que sou mudo…