Os Falsificadores do Passado: Em defesa da Contra-Revolução de 31 de março de 1964

O texto da colunista Míriam Leitão, “O dia que inventou a noite -falsificadores do passado revelam virtudes para a ditadura de 64” [1],  deixa evidente a visão estreita de alguém que  talvez ressentida pelos maus-tratos sofridos ao ser detida durante o regime militar, ainda hoje não conseguiu superar o trauma, algo que parece condicionar toda a análise que ela faz de um evento de nossa história. Isso seria compreensível e passaria despercebido caso a autora do texto não gozasse de certo prestígio como colunista de um bem conhecido jornal (de linha editorial duvidosa). Pretendo mostrar que pelo menos na superfície, baseado no que ela escreveu neste texto e consciente ou não dos fatos em si, a própria Míram Leitão falsifica o passado. Antes, esclareço que meu método de análise se baseia em um critério objetivo onde tento coletar o testemunho de pessoas que viveram a época e deixaram suas impressões registradas em tempo quase-real em livros de memórias ou escritos em colunas de jornais,   não tendo sido influenciadas pela narrativa de alguns  “historiadores” que acreditando que todo discurso é subjetivo e que, portanto, não há nenhuma objetividade possível, posteriormente escreveram o que quiseram sobre o tema a revelia do que os fatos históricos objetivamente revelam.

Míriam Leitão escreve em seu texto

“Foi exatamente há 54 anos que começou a noite de 21 anos sobre o Brasil. Hoje, mais de meio século depois, o país que guarda mal sua memória é vulnerável aos falsificadores de passado e vai se espalhando a ideia de que foi um tempo sem corrupção, com segurança e com crescimento econômico. Não é verdade, na ditadura houve corrupção sem apuração e crise econômica.”

Sim, é provável que tenha havido corrupção e crise econômica, mas em que proporção? Ora, estamos falando de cerca de vinte anos de regime militar, será que foram vinte anos de crise? Será que não houve em nenhum momento crescimento econômico algum ? E se houve, o que determinou o declínio econômico dos últimos anos do regime? O texto da colunista Míriam Leitão ao deixar de lado estes questionamentos e afirmar que houve corrupção e crise econômica falsifica o passado induzindo o leitor a pensar que não houve nada além disso. Contudo, há dados que mostram o contrário. Com efeito, vejamos o que diz o historiador Agnaldo Del Nero Augusto sobre o regime militar até 1974 [2] ,

“Vivíamos o décimo ano do processo revolucionário e o sétimo de crescimento acelerado, quase dobrando nosso Produto Interno Bruto. De 1967 a 1973, o PIB aumentou 85%, com crescimento anual médio de 11%. Para se ter um parâmetro de comparação, no período entre 1956 e 1961, quando tivemos outro surto de crescimento, a média anual foi de 7.4%.”

Já um editorial do Jornal do Brasil de 31 de Março de 1974 faz  a seguinte análise dos dez anos da contra-revolução

“Vive o país, há nove anos, um desses períodos férteis em programas e inspirações, graças à transposição do desejo para a vontade de crescer e afirmar-se.

Negue-se tudo a essa revolução brasileira, menos que ela não moveu o País, com o apoio de todas as classes representativas, numa direção que já o destaca entre as nações com parcela maior de responsabilidades.

 

Os louvores e as emulações que acompanham, como se fossem moldura, a imagem do País que se projeta constituem o julgamento de mudança para melhor, e por isso mesmo irreversível, embora sujeita a reajustes eventuais no seu mecanismo de prospecção e aperfeiçoamento. O que ficou para trás está banido pelo consenso geral da nação, que se moderniza a fim de antecipar seu destino …

 

O País, que foi reformulado em 1964 na maneira de pensar e agir, ingressa hoje no ano 10 de sua nova etapa, e em muitos aspectos mostra uma face transfigurada. A obra de renovação aponta, em quase todos os setores, os frutos de um trabalho inteligente planejado e executado pela nação inteira – Governo e povo unidos no mesmo sentimento e na mesma inspiração. O crescimento econômicod+ a afirmação internacionald+ a ocupação crescente de largos espaços vazios de nosso territóriod+ a preocupação mais recente com o conteúdo social do desenvolvimentod+ tudo isso traduz a definição pragmática de um destino que desabrocha.”

 

E, aos esquerdistas mais incrédulos, o que dizer do relato de Luíz Ignácio Lula da Silva em depoimento a Ronaldo Costa Couto [3]

 

“… o regime militar impulsionou a economia do Brasil de forma extraordinária”.

Tais testemunhos e os dados concretos de crescimento econômico põe em descrédito o relato de Míriam Leitão. Ora, passados então quase dez anos da contra-revolução, vemos que as chamadas crises do petróleo de 1973 e 1979  determinaram o aumento significativo do preço do petróleo pelos países exportadores (OPEP), medida que teve efeitos negativos na economia mundial, em particular no Brasil, sendo uma das razões que levou ao início do declínio econômico, como teria levado da mesma forma qualquer outro governo na época. Ou seja, diante do cenário internacional desfavorável o questionamento que fica é: Seria a crise evitável?

 

Míram Leitão também escreve

“É triste ter que recontar os ocorridos daqueles anos do regime militar como se fosse preciso ainda convencer de que houve o que houve. Tortura, morte, desaparecimentos políticos, exílio, censura, cassação de mandatos de parlamentares pelo crime de opinião, aposentadoria forçada de ministros do Supremo e catedráticos, proibição de que estudantes frequentassem a universidade, suspensão do direito de reunião e manifestação, anulação do habeas corpus e de outros direitos constitucionais, fim das eleições diretas para presidente, governadores e prefeitos das principais cidades. Era um tempo horrível.

Hoje há um esforço deliberado de se reescrever esse passado com mentiras para convencer os jovens de que aquele foi um tempo de paz interna, contestada apenas por alguns poucos “comunistas”. Há um grupo que inclusive escolheu como seu líder o torturador símbolo Brilhante Ustra, proclamado herói de certo candidato. Houve recentemente até um assessor do candidato que propôs que as versões do torturador e de seus torturados são equivalentes. Qual dos dois lados falou a verdade? Perguntou. Ora, ora. É preciso poupar-se de todos os fatos ocorridos para ter essa dúvida, inclusive a evidência de que 40 dos torturados morreram no Doi-Codi de São Paulo comandado por Ustra. Se morreram, não foi por bons tratos.”

 

Neste trecho, Míriam Leitão menciona fatos lamentáveis como tortura, morte, etc. mas não quantifica quantas mortes em relação ao universo de pessoas detidas, e tampouco esclarece o contexto dessas mortes. Ao não considerar o contexto, Míriam Leitão induz o leitor a pensar que o regime militar foi brutal e de exceção, mas quais são as evidências que indicam isso? Ao não apontá-las, Míriam Leitão novamente falsifica o passado ao não situar os fatos num período bem delineado, aproximadamente entre os anos de 1966-1973 (?), a época da “luta armada”, quando grupos comunistas pegaram em armas para implantar no Brasil uma ditadura comunista, como se conclui da análise dos documentos dos vários grupos da luta armada [4]. Nesta época, a polícia se mostrou despreparada para desbaratar os vários grupos comunistas que usando do terrorismo demonstravam um grau de organização e disciplina com os quais os policiais não tinham conhecimento em atuar. Assim, surgem os órgãos especiais do Exército atuando na inteligência para combater e neutralizar esses grupos terroristas [5] [6]. É neste contexto que surgem os relatos de casos de tortura, tido como prática sistemática pela esquerda, e como casos isolados e sem a anuência do comando por parte dos militares. Analisemos a seguir qual possibilidade seria mais provável diante dos dados que se tem. Ora, em 20 anos de regime militar, dados apontam para cerca de 400 mortes devidas aos agentes do regime contra 120 mortes pela ação dos terroristas comunistas, o que indica um baixo número de mortes comparados com outras ditaduras na região, por exemplo, Cuba, Chile, Argentina. Esse baixo número de mortes, ainda que um fato a se lamentar, não deixa de lançar dúvidas sobre a alegação de tortura sistemática como política de extermínio do regime militar, afinal, qual a explicação razoável que justificaria um número baixo de mortes ao mesmo tempo produzindo um número excessivo de pessoas torturadas? Em que outro país isso teria ocorrido? Tomando por dado objetivo as experiências dos vários regimes comunistas e fascistas vemos que elas contabilizam um saldo igualmente elevado de mortes e de torturas (os campos de trabalhos forçados e as degradantes prisões destinadas aos presos políticos nos regimes comuno-fascistas certamente não eram uma pousada de férias). Desse modo, se mortes e tortura andam  juntas vemos que o baixo número de mortes em 20 anos do regime militar não indicaria uma prática sistemática de tortura. Convêm notar também que esse saldo de 400 + 120 mortes contempla na sua maioria mortes ocorridas em confrontos entre membros do Exército e militantes de grupos terroristas comunistas, ou seja, na sua maioria não se caracterizam como mortes sob tortura.

 

Afim de refinarmos a questão, observemos o que Míriam Leitão menciona sobre as cerca de 40 mortes supostamente ocorridas no DOI-CODI de São Paulo comandado pelo então coronel Ustra. Tal informação veio a público por meio de uma matéria publicada no jornal Correio Braziliense em 17 de outubro de 2004 sob o título “Exército contabilizou mortos no DOI-CODI”. Trata-se de um relatório confidencial de estatística do DOI/CODI/II Exército que até 30 de setembro de 1975 relatava que haviam ocorrido 47 mortes. Contudo, como explicado pelo coronel Ustra em [5], pags. 300-302,

“As manchetes em si já são tendenciosas. Induzem o leitor a pensar que as mortes aconteceram dentro do DOI e não a realidade: mortos em combate. Essa mesma imprensa deixou de publicar que, no mesmo período, só em São Paulo, os terroristas mataram entre civis, policiais e militares 53 pessoas e feriram 14 membros do DOI/II Ex.[…] Os dados estatísticos de uma tropa em combate, obrigatoriamente tem de citar a quantidade de prisioneiros, de desaparecidos, de feridos, de mortos. […]Mesmo nos casos mais evidentes, com depoimentos de testemunhas, eles negam que seus militantes tenham sido mortos em combate. Quando isso acontecia e eles morriam em ação, ou se suicidavam em plena rua, afirmavam que o preso foi ferido, não foi socorrido e foi levado para o DOI para ser morto sob tortura.”

Ainda que as versões de Míriam Leitão e do coronel Ustra se oponham, há um fato relevante neste relatório. O total de presos pelo DOI de SP apontado pelo relatório foi de 2381, e,  destes, 47 mortos em combate. Ainda que se sustente que não tenham sido mortos em combate, mas sob tortura nas instalações do DOI, é um fato concreto que em relação à proporção do número de pessoas que ali passaram teríamos uma taxa de mortos de menos de 2 %.

Não havendo razões para pensar que as outras nove unidades do DOI-CODI espalhadas pelo Brasil produzissem um percentual diferente desses 2% vemos que em média esse teria sido o suposto percentual de torturados. Ora, deixemos então que esse baixo percentual responda a questão se a tortura ocorreu como prática sistemática ou como casos isolados de alguns agentes que se excederam.

Assim, a narrativa de que o regime militar no Brasil foi brutal e sanguinário não encontra respaldo objetivo nas evidências do que é tido por regimes brutais e sanguinários. Obviamente, é compreensível que a colunista Míriam Leitão tenha suas razões para dizer o que bem desejar, mas não pode com isso falsificar o passado, tomando um passado individual que é apenas dela como sendo regra geral para todos os que foram detidos.

Míriam Leitão finaliza escrevendo

“O dia 31 de março, há 54 anos, inventou uma noite que durou duas décadas. Nela não era possível divergir, combater os crimes de poderosos, protestar contra a crise econômica. No começo da década de 1980, nos últimos anos daquela noite, o Brasil estava quebrado, com dívida externa impagável, em recessão, desemprego alto, a inflação subia estimulada pela correção monetária criada nos governos militares. Foi a democracia que tirou o país desse buraco, desarmou a bomba inflacionária, renegociou e pagou a dívida. Precisou de 10 anos para superar esse difícil legado. Nos anos seguintes, a democracia se dedicou a resgatar brasileiros da pobreza extrema.”

Mais uma vez, Míriam Leitão falsifica o passado ao ignorar a natureza do regime militar. Olhando a história do Brasil veremos que a democracia que a colunista tanto admira não é um ideal naturalmente dado e defendido por todos, mas constantemente ameaçado e solapado por diversos grupos, com destaque os comunistas. Assim, a democracia foi ameaçada em 1935 com a Intentona Comunista, cujos efeitos, dois anos mais tarde, permitiram que Vargas consolidasse suas tendências autoritárias com o Estado Novo de 1937, dissolvendo os partidos e assumindo o poder de forma absoluta, numa hábil manobra que visava impedir os Integralistas de concorrerem às eleições de 1938, já que  Plínio Salgado despontava como um dos favoritos. Depois, passando pelo golpe comunista mal-sucedido em 1964 onde os comunistas aproveitaram-se do governo fantoche de João Goulart [7], tivemos a intervenção dos militares em 31 de Março de 1964 e, como conseqüência, foi empossado pelo Congresso Nacional um governo tendo Castello Branco como presidente e cujo objetivo era sanear o país [8].

Ora, sendo um regime contra-revolucionário, o regime militar de fato se impôs pela força, contudo, tinha uma característica singular em relação aos outros regimes ditatoriais de tendência comunista ou anti-comunista, já que o poder não estava nas mãos de um grupo ou pessoa, mas de uma instituição, as Forças Armadas, que têm a missão constitucional de manter tanto a integridade territorial da nação quanto o funcionamento das suas instituições. Uma evidência de que a liberdade de expressão nunca chegou a ser totalmente suprimida era o semanário Pasquim, que mesmo tendo sido alvo da censura com a detenção de alguns de seus editores, ainda assim continuou circulando em bancas de jornais durante todo o regime militar. Em relação as universidades, embora tenha  ocorrido a expulsão de certos indivíduos, nunca houve um expurgo generalizado, a prova disso é que se hoje temos universidades e escolas contaminadas pela doutrinação marxista  isso é fruto de um trabalho sistemático e continuado de anos de militância política ideológica que nunca foi definitivamente coibida pelo regime militar. Do ponto de vista político havia um cerceamento do exercício da democracia com a supressão de eleições diretas para presidente  e governadores, mas nunca deixou de haver um exercício limitado da democracia que se manifestava em eleições legislativas com um partido de oposição ao regime militar (MDB) e outro a favor (ARENA), situação onde o povo poderia expressar seu contentamento ou descontentamento com o regime.   Havia também uma alternância de chefes militares ocupando a presidência de modo a evitar à perpetuação de um ditador no poder. Pode-se pensar que o regime militar demorou demais para retornar o poder aos civis, e isso poderia  ter sido feito com Costa e Silva, contudo, motivos de saúde não permitiram que ele completasse seu mandato e o surgimento da luta armada pelos comunistas em 1966 forçaram seu sucessor, general Emílio Garrastazu Médici, a adotar medidas excepcionais para enfrentar os comunistas. A conseqüência disso foi a continuidade do regime miltar. Já na sua fase final, esgotado os ideais da contra-revolução em face da crise econômica e da aniquilação da ameaça comunista, preparou-se uma abertura gradual de retorno a democracia com Geisel que culminou com a entrega do poder aos civis em 1985.

Finalizo, apontando alguns legados econômicos do regime militar. Se temos o pré-sal isso se deve ao reclame da soberania das 200 milhas náuticas pelo Brasil durante o regime militar, contrariando interesses internacionais. O programa nuclear brasileiro que hoje nos permite deter de forma independente os ciclos de enriquecimento de urânio surgiu durante o regime militar num acordo com WAlemanha. Depois, por pressão americana, o acordo foi rompido pela Alemanha e os militares decidiram continuá-lo sozinho, com sucesso. Se hoje temos essa matriz energética disponível deve-se a insistência do regime militar.

 

No campo da educação verificou-se vários avanços do regime militar. A título de comparação, em 1963 o governo gastava 2.1% do PIB na educaçãod+ tínhamos 132 universitários para cada 100 mil habitantesd+ das 135 mil escolas públicas, 70% eram de uma sala apenasd+ a taxa de leigos como professores do primário era de 40%d+  e, no ensino secundário, 74% das vagas provinham das escolas particulares, uma situação que negava acesso aos mais pobres. A Leis de Diretrizes e Bases da Educação de 1971 propiciou grandes melhoras nos índices da educação. Ao fim de 1974 o governo investia 4% do PIB em educaçãod+ a taxa de escolarização na faixa dos sete aos quatorze anos crescera de 53% para 81%d+ tínhamos agora 830 universitários para cada 100 mil habitantes, graças ao crescimento de 300% do número de matrículasd+ no ensino secundário passamos a ter a oferta de 70% das vagas dadas pelas escolas públicas. Merece destaque especial o Mobral, um amplo movimento de organização comunitária em todas as partes do território nacional para alfabetizar milhões de brasileiros (Ver “Educação de Massa e Ação Comunitária” de Arlindo Lopes Corrêa), que se contrapondo a “educação liberadora” construída sobre a “pedagogia do oprimido” propunha a “pedagogia dos homens livres”. Segundo Arlindo Corrêa, o número de pessoas alfabetizadas com sucesso pela pedagogia freiriana foi inferior ao número de pessoas alfabetizadas semanalmente pelo Mobral em 1974.

 

Há muitos outros aspectos positivos sobre o legado da contra-revolução de 31 de março de 1964 e o regime militar que se encontram descritos  em obras deliberadamente esquecidas pelo “mainstream” dominante de agora. Há, também, aspectos negativos que por serem obsessivamente vinculados na grande mídia, nas universidades, nas escolas etc., tendem a ser tomados erroneamente como característica única e predominante dos feitos do regime militar. Assim, tenho que concordar com a jornalista Míriam Leitão de que há falsificadores de passado, contudo discordo dela em relação a quem são os falsificadores, e devemos deixar que o público bem informado e dispondo de várias fontes decida quem são os reais falsificadores.

Acredito ter descrito alguns aspectos da nossa História tomando por base fatos objetivos que se fundamentam em relatos da época e que produz algo que tende a ser o mais próximo possível de uma descrição documental do fato ocorrido. Em contraste, é triste ver uma colunista apresentando ao público uma narrativa rasteira, pobre e apoiada por um senso comum que se mostra inverídico. Infelizmente, isso parece ser algo comum em um país onde o estudo e a busca da verdade histórica (sim, ela existe!) cede lugar a condicionantes ideológicos sem nenhum compromisso com a verdade.


Marcelo Carvalho

Professor do Departamento de Matemática

Notas

[1] https://blogs.oglobo.globo.com/miriam-leitao/post/o-dia-que-inventou-noite.html

 

[2] “A Grande Mentira”, Agnaldo Del Nero Augusto.

 

[3] “Memória viva do regime militar”, Ronaldo Costa Couto, pag. 250.

 

[4] “Imagens da Revolução”, Daniel Aarão Reis.

 

[5] “A Verdade Sufocada: a história que a esquerda não quer que o Brasil conheça”, Carlos Alberto Brilhante Ustra.

 

[6] “Projeto Orvil”, cel. Lício Maciel.

 

[7] Como evidências de que os comunistas tramavam um golpe em 1964 apresento o relato de duas figuras de destaque entre os comunistas: Luís Carlos Prestes, e Jacob Gorender.

Luís Mir em seu livro, “A Revolução Impossível”, cita nas pags. 115-130 que em janeiro de 1964 Prestes estava reunido com Krushev em Moscou relatando os planos dos comunistas tomarem o poder. Segundo Prestes,

“A luta pelas reformas de base constitui um meio para acelerar a acumulação de forças e aproximar a realização de objetivos revolucionários,

 

[…] o arcabouço institucional impede as reformas, pois elas dependem de dois terços do Congresso, tornando-as irrealizáveis, dado que ele é majoritariamente anti-reformas.

 

[…] O grande trunfo será o dispositivo militar, capaz não só de barrar um golpe ou uma reação da direita, mas, por uma ação enérgica e com o apoio das massas, desencadear o processo de reformas.

 

[…]  Implantaremos um capitalismo de Estado, nacional e progressista, que será a ante-sala do socialismo.

 

[…] uma vez a cavaleiro do aparelho do Estado, converter rapidamente, a exemplo da Cuba de Fidel, ou do Egito de Nasser, a revolução-nacional-democrática em socialista. “

 

Vejamos agora o que diz Jacob Gorender em um trecho do seu livro “Combate nas Trevas”, pags. 66-67

“Tornou-se corrente na literatura acadêmica a assertiva de que, no pré-64, inexistiu verdadeira ameaça à classe dominante brasileira e ao imperialismo. os golpistas teriam usado a ameaça apenas aparente como pretexto a fim de implantar um governo forte e modernizador.

 

A meu ver, trata-se de conclusão positivista superficial derivada de visão estática das coisas. Segundo penso, o período 1960-1964 marca o ponto mais alto das lutas dos trabalhadores brasileiros neste século, até agora. O auge da luta de classes, em que se pôs em xeque a estabilidade institucional da ordem burguesa sob os aspectos do direito de propriedade e da força coercitiva do Estado. Nos primeiros meses de 1964, esboçou-se uma situação pré-revolucionária e o golpe direitista se definiu, por isso mesmo, pelo caráter contra-revolucionário preventivo. A classe dominante e o imperialismo tinham sobradas razões para agir antes que o caldo entornasse.”

 

Em ambos os casos vemos de forma clara as intenções dos comunistas em tomar o poder em 1964.

 

Cito ainda dois eventos de suma gravidade na ótica militar que certamente definiram a intervenção militar em 1964. Ambos estão descritos em [2].

 

O primeiro refere-se ao “Comício das Reformas” realizado no dia 13 de Marçona Central do Brasil. Conta del Nero,

 

“… dezenas de faixas e cartazes conclamavam as reformas, à legalização do Partido Comunista e a entrega ao povo de armas para a luta. No palanque, ao lado dos principais líderes sindicais e comunistas, alguns deles membros do Comitê Central do PCB, alinhavam-se Jango, Arraes e Brizola. Emissoras de rádio e de televisão transmitiam para todo o País os inflamados discursos que se sucediam, preparatórios da fala do presidente. Brizola pediu a realização de um plebiscito exigindo o fechamento do Congresso Nacional e convocação de uma constituinte.

[…] Jango prometeu enviar em um prazo de 48 horas mensagem presidencial ao Congresso contendo uma série de projetos de emenda à Constituição destinados a viabilizar as reformas, dentre elas, a agrária, a eleitoral, a universitária e a tributária.

[…]Observadores mais atentos se perguntavam: Como reformar a Constituição sem maioria no Congresso? De que maneira admitir reformas tão radicais que possam solapar princípios consagrados como a propriedade privada? […] A reforma constitucional pretendida só se poderia concretizar sob um clima de pressões irresistíveis ou então sobrepondo-se o Congresso” ([3] pags.125-127)

 

O outro evento refere-se a “Rebelião dos Marinheiros” que foi o ponto culminante de uma série de insubordinações que quebravam a hierarquia militar. Conta Del Nero,

 

“… em setembro de 1963, a rebelião dos sargentos em Brasília servira como um alerta de que a estrutura militar estava abalada. A desobediência e insubordinação chegavam a níveis insuportáveis, a ponto de muitos militares não mais as aceitarem. [..] A rebelião dos marinheiros de 25 de março de 1964, no Rio de Janeiro, foi a gota d”água que congregou os militares e os levou à decisão de partirem para a ação.”” ([3]d+ pags. 127-132)

Desses dois eventos fica claro o quão arriscado e irresponsável são as atitudes dos que atentam contra as instituições da nação, pois tais atitudes invariavelmente fomentam uma ação preventiva dos militares. Tal qual 1964, a doutrina militar impõe como um dever a intervenção quando necessário for. Que 1964 sirva então como alerta à classe política e a movimentos que agem estimulando divisões e ódios.

 

 

[8] Vejamos quais foram as intenções da contra-revolução de 1964, ao menos no seu momento inicial, contada por um relato da época, no caso, a coluna do jornalista Carlos Castello Branco no Jornal do Brasil do dia 7 de Abril de 1964:

 

“Parece estar se impondo sobre a corrente revolucionária exaltada a corrente moderada, que entende e proclama que a Revolução foi feita contra o comunismo e não contra o Congresso e as liberdades públicas. É esta, de resto, a tendência normal dos movimentos vitoriosos que, cumprida sua missão, procuram acomodar-se à ordem.

A Revolução, no entanto, antes de se dissolver nos quadros constitucionais vigentes, pretende-se afirmar-se através de um ato de força que cumpra, em si mesmo, os principais objetivosdefinidos pelos chefes revolucionários.