Brasil precisará de décadas para reconstruir sua ciência após cortes, avaliam pesquisadores

No fim de março, corte de 42% em ciência e tecnologia agravou cenário

Em meio a uma crise sanitária de escala global, no momento em que profissionais de saúde e cientistas se tornam protagonistas no combate à pandemia e na busca de soluções para frear o gigantesco número de mortes causadas pelo coronavírus, o governo brasileiro, na contramão do mundo, anuncia cortes que afetam diretamente cientistas que estão mobilizados na procura por uma cura para a covid-19. Após sucessivos congelamentos de despesas, redução de bolsas de pesquisa e uma falta de incentivo em geral para a ciência nos últimos meses, o cenário voltou a se mostrar preocupante com o anúncio, no final de março, de um corte orçamentário de 42% em ciência e tecnologia.

Enquanto a pandemia de covid-19 exige que a ciência brasileira mobilize seu conhecimento no combate ao coronavírus, o governo anunciou que congelaria R$ 29,58 bilhões das despesas previstas para este ano em razão da revisão do cenário econômico, com menos crescimento e menor arrecadação. As principais entidades científicas e de Ensino Superior do país criticaram, em carta conjunta, o congelamento das despesas para investimento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) anunciado pelo governo federal em plena pandemia, apontando que, nesse cenário, serão necessários muitos anos para reestruturar a ciência brasileira.

“Se essas restrições orçamentárias não forem corrigidas a tempo, serão necessárias muitas outras décadas para reconstruir a capacidade científica e de inovação do país”, definiu um texto assinado por entidades como a Academia Brasileira de Ciências, o Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e Tecnologia e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entre outras.

A sociedade em geral, no entendimento dos pesquisadores, apoia a ciência: na quinta-feira (7), foi promovida a Marcha Virtual Pela Ciência, evento que abordou como o conhecimento científico tem ajudado a enfrentar a pandemia de covid-19, defendendo o apoio à pesquisa como uma das saídas para a crise. Durante a mobilização, houve até um alento inesperado: o ministro do MCTIC, Marcos Pontes, anunciou, em vídeo, a liberação de mais R$ 352 milhões em recursos para projetos de pesquisa, inovação e infraestrutura no combate a pandemias.

Mas as organizações científicas, apesar de exaltarem a disponibilização recursos, apontam que isso é muito pouco perto dos bilhões de reais em cortes já anunciados. Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), avalia que esse corte prejudica a formação de pesquisadores que poderiam contribuir para áreas críticas ao progresso do país, citando exemplos práticos, como o desenvolvimento de remédios que permitam enfrentar epidemias ou tecnologias para aumentar a segurança de barragens.

“Para combater a crise econômica, o governo prefere reduzir a relação entre a dívida e o PIB. Outros países apostam no aumento do PIB, e isso significa dar recursos para a ciência e a tecnologia”, diz Davidovich.

Leia na íntegra: Zero Hora