Escolha de civil para dirigir o INPE e monitorar queimadas surpreende, mas não tranquiliza cientistas

Criticado por militarizar controle dos incêndios da Amazônia, governo promove nome que estava em lista tríplice do instituto. Pesquisadores elogiam, mas recebem nomeação com cautela

O Governo Bolsonaro decidiu nomear o engenheiro Clezio Marcos De Nardin para a diretoria do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), responsável pelos sistemas de monitoramento de desmatamento na Amazônia, pelos próximos quatro anos. A nomeação surpreendeu a comunidade científica, mas não a ponto de fazê-la respirar aliviada. A expectativa era que o diretor interino, o militar reformado Darcton Policarpo Damião ―à frente da entidade desde a barulhenta saída do cientista Ricardo Galvão em 2019―, assumisse definitivamente o cargo, mesmo havendo um processo de seleção formal aberto. O motivo é a cruzada que o vice-presidente general Hamilton Mourão, que lidera o plano contra a devastação ambiental no Governo, vinha empreendendo contra o INPE. A queda de braço, com o Governo negando os dados de desmatamento e focos de incêndio apontados pelo órgão, levou à saída de Ricardo Galvão em agosto do ano passado. Desde então, era Damião quem respondia pelo órgão.

Em julho, uma reestruturação eliminou o cargo de Lúbia Vinhas, coordenadora geral de Observação da Terra do INPE, o que suscitou especulações de que essa mudança teria relação com a divulgação de dados de avanço da destruição na floresta naquele mês. Essa leitura, porém, é refutada pelos próprios funcionários – Lúbia continua atuando no INPE em outra área. Seja como for, a possibilidade de que um civil, com longa carreira na instituição e escolhido em uma lista tríplice assumisse um posto estratégico, parecia distante.

Fontes ouvidas pelo EL PAÍS, no entanto, afirmam que, ao escolher um cientista, o Governo Bolsonaro tenta se livrar da acusação de militarização do monitoramento da Amazônia. E que a pressão sobre a entidade vai continuar. O vice-presidente, responsável pelo Conselho da Amazônia, defendeu recentemente a criação de uma agência de monitoramento paralela ao INPE, com o objetivo de qualificar os dados que são divulgados. “Precisamos de uma agência a exemplo do que existe nos Estados Unidos, a NRO [Escritório Nacional de Reconhecimento], subordinada ao Ministério da Defesa, e que integre todos os sistemas que temos”, afirmou durante um evento on-line do Instituto para a Reforma das Relações de Estado e Empresas (IREE).

O NRO é responsável pelo sistema de satélites que fornece informações sigilosas para agências de inteligência, como a Agência de Segurança Nacional (NSA), e não atua com dados públicos sobre incêndios florestais, por exemplo. Na prática, o trabalho do INPE é um misto do que é realizado por duas agências norte-americanas civis, a Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa) e a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOA), que divulgam os dados abertamente.

Leia na íntegra: El País