A greve, a luta por salários e a tragédia no Rio Grande do Sul

*Por Carlos Alberto Marques

Reivindicar reajuste salarial e financiamento das universidades é justo e necessário. São perdas que se acumulam desde o último acordo em 2015. Depois disso o que houve foram medidas promovidas por dois governos cujo foco era o desmonte do setor público, a retração de políticas públicas, ataques à universidade e o arrocho salarial dos servidores públicos. Com a onda conservadora que assolou o país, as eleições levaram a uma nova conformação do congresso, o qual impõe um regime extraoficial de natureza semipresidencialista, cujo poder se expressa no controle de 1/4 do orçamento público, o que praticamente impede o governo de implementar e executar na plenitude o programa que o elegeu.

No atual contexto, com uma economia cambaleante e instável, associada à crise da economia internacional e com o enorme poder orçamental de nosso congresso nacional, o escopo declarado do governo de reconstrução nacional encontra fortes limitações e resistências orçamentárias, políticas e ideológica, dentro e fora do poder executivo. Se já temos a controversa política de austeridade fiscal (déficit zero), que limita a execução de políticas sociais, agora se somam os efeitos da tragédia ambiental, humana e econômica do Rio Grande do Sul (RS). Sem dúvida, as maiores perdas são as vidas e lares, mas também foram destruídos os setores industrial, agrícola e de serviços. Muitos trabalhadores não terão mais emprego e renda. Isso exigirá que o país faça gigantescos esforços financeiros para a reconstrução daquele estado, cujos recursos sairão do Tesouro Nacional, ou seja, da riqueza produzida por todos nós. A dimensão da tragédia exige, portanto, um sacrifício solidário urgente e novas prioridades na destinação e uso de todos os recursos de que dispomos e por vários anos – estimados em cerca de 100 bilhões de reais. Isso exigirá ainda que serviços e servidores públicos ajudem a reerguer o estado gaúcho. Cabe recordar que algo semelhante ocorreu no período da Pandemia, porém em nível nacional, quando o orçamento público foi flexibilizado e em regime de excepcionalidade. Nesse quadro, a catástrofe climática no RS passa a ser uma questão nacional e nossa solidariedade como servidores públicos terá que ser de outra dimensão, para além das campanhas de arrecadação de donativos.

Esse é, em breves palavras, o complexo contexto em que estamos metidos quando reivindicamos melhorias salarias, entre outros itens de nossa pauta. Lembrar disso não significa aceitar sua imposição, mas sim que precisamos reconhecer que ele está presente no processo negocial, na proposta que o governo apresentou e na resposta que daremos a ela, via o Proifes. Resposta essa que deve ocorrer imediatamente, por meio de uma ampla e direta consulta aos filiados feita pela Diretoria do sindicato, em conformidade com nosso estatuto.

É preciso lembrar que tudo o que fazemos reverbera muito além de nossa universidade. A Apufsc, com a filiação ao Proifes-Federação, mesmo mantendo-se um sindicato autônomo e independente, passou a ter voz ativa, respeito e reconhecimento político em todos os níveis e em vários espaços sociais e políticos. Além de interagirmos com os outros sindicatos que compõe a Federação, nos relacionamos ainda com mais de 40 entidades e associações científicas do campo educacional no Fórum Nacional Popular de Educação (FNPE). E, mais recentemente, via o Proifes, passamos a fazer parte do Fórum Nacional de Educação (FNE), composto por 65 representações, instituições e entidades de setores da educação nacional. O FNE tem a função de participar do processo de concepção, implementação e avaliação da Política Nacional de Educação, que se materializou recentemente na Conferência Nac. de Educação, com mais de 2.400 delegados/as e onde a representação da Apufsc coordenou o tema sobre Educação para o Desenvolvimento Socioambiental Sustentável. Além disso, também passamos a interagir com a Internacional da Educação (IE) (383 organizações sindicais, de 178 países) e com a Confederação de Sindicatos da Educação dos Países de Língua Portuguesa (CPLP-SE). Ao contrário da outra entidade sindical, esse é um importante diferencial do Proifes.

Mesmo a Apufsc sendo agora um sindicato autônomo e independente, sempre levou em consideração que nosso comportamento e decisões repercutem dentro e fora da universidade. Estou convicto que, especialmente nesse delicado momento, seguiremos com nosso histórico de um sindicato socialmente responsável na luta por salários e solidário com a tragédia no Rio Grande do Sul.

*Carlos Alberto Marques é professor do CED e ex-presidente da Apufsc-Sindical