A UFSC contra a internacionalização

*Por Alessandro Pinzani

Numa época em que se fala tanto em internacionalização e inserção nos circuitos internacionais de produção do conhecimento, é de admirar o fato de que a administração central da UFSC obstaculize com força a participação de docentes e TAEs em atividades internacionais.

Antigamente, os pedidos de afastamento para participar de eventos de curta duração no exterior eram encaminhados, após aprovação pelo superior direto (no caso dos docentes, a chefia de departamento), para o Gabinete da Reitoria, que os publicava no DOU. Agora, eles passam pelo Departamento de Desenvolvimento de Pessoal (DDP) da PRODEGESP. Lá, são analisados como pedidos de ações de desenvolvimento e capacitação e, portanto, submetidos à regra que prevê um interstício de 60 dias entre uma ação e outra. Em outras palavras, se um docente participar de um congresso no exterior, por exemplo, no dia 15 de setembro, deverá esperar até o dia 15 de novembro para participar de outro.

Ora, participar de um congresso ou ministrar um minicurso em outra universidade, seja ela brasileira ou estrangeira, não constitui, obviamente, uma atividade de desenvolvimento ou capacitação. No segundo caso, em particular, é evidente que o capacitador é o próprio docente que oferece o curso. Apesar disso, o DDP insiste em sua leitura e, quando solicitado a indicar a base legal para sua visão, remete a uma página do site do Governo Federal, onde são elencadas as atividades de capacitação. Entre elas, há, com efeito, a participação em congressos (mas não a ministração de cursos!); só que o elenco das atividades em questão se refere, explicitamente, a atividades que acontecem “com supervisão, orientação ou tutoria”. Isso, evidentemente, não é o caso de um docente que seja convidado a apresentar um trabalho em um congresso internacional.

Em uma troca de e-mail que tive com o setor, o DDP defende, contudo, que “para fins da legislação de ação de desenvolvimento considera-se treinamento regularmente instituído qualquer ação de desenvolvimento promovida ou apoiada pelo órgão ou pela entidade (art. 18, § 3º do Decreto 9991/19). Destaca-se que a mera autorização para participação do servidor enquanto em exercício configura o apoio pelo órgão”. Dito de outra forma, segundo o DDP, atividades de pesquisa, ensino e extensão que aconteçam fora da UFSC devem ser consideradas ações de desenvolvimento e, portanto, deveriam obedecer à regra do interstício de 60 dias. Note-se que isso, em teoria, afeta também a participação em eventos no país. O DDP reconhece que, neste caso, “a diferença é que não é formalizado processo pela Coordenadoria de Capacitação para as ações no país, devendo ser formalizado o processo conforme orientações e procedimentos dentro de cada unidade administrativa/acadêmica”. Ou seja, se, em vez de limitar-se a buscar a permissão da chefia imediata, os docentes que pretendem participar de eventos no país tivessem que passar pelo DDP, teriam que respeitar o interstício de 60 dias. Isso implica que, segundo o DDP, há uma constante violação da lei federal por parte das chefias de departamento da UFSC, uma vez que os docentes que participam de eventos no país deveriam também respeitar o interstício de 60 dias (cada ação que recebe a autorização da UFSC é uma ação de desenvolvimento para o DDP).

Parece-me, em suma, que o problema não está no que a lei exige, uma vez que a lei menciona explicitamente o que são atividades de capacitação e desenvolvimento, apontando para a necessidade de que elas aconteçam “com supervisão, orientação ou tutoria”. O problema está na interpretação altamente peculiar que o DDP dá da lei e do que significa “apoio” institucional (a lei citada pelo DDP não fala genericamente de apoio ou autorização, mas fala explicitamente de apoio a ações “de desenvolvimento”, mostrando que, mais uma vez, o problema está na maneira como o DDP define tais ações).
De fato, outras universidades federais não interpretam a lei de forma tão peculiar e continuam concedendo afastamento para participar de eventos de curta duração no exterior, na compreensão de que não se trata de ações de desenvolvimento e capacitação. Na realidade, órgãos da UFSC têm a mesma compreensão, uma vez que a participação em tais eventos deve ser registrada no SIGPEX como atividade docente, não como atividade de capacitação. A mão direita não sabe o que faz a mão esquerda, evidentemente.

O DDP afirma que sua postura se deve a uma indicação recebida pela administração central. Cito mais uma vez um e-mail enviado pelo setor: “Por orientação da Gestão Superior da UFSC, todos os processos de afastamento que forem submetidos à análise da CCP/DDP/PRODEGESP devem ser analisados sob o olhar de ações de desenvolvimento e, portanto, devem cumprir o interstício previsto na IN nº 21/2021”.
Seria interessante que a gestão superior da UFSC (imagino que isso indique a Reitoria) explicasse à comunidade da UFSC quais foram as razões que a levaram a tomar esta decisão, que compromete gravemente as atividades de internacionalização, pesquisa e ensino de docentes e TAEs.

*Alessandro Pinzani é professor do Departamento de Filosofia da UFSC