*Por Gilson Silva Jr
Recentemente recebi várias mensagens via whatsapp sobre os relatórios da Comissão da Verdade e Memória (CMV) da UFSC e a proposta de alterar o nome do campus, sob alegação que o ex-reitor homenageado colaborou com a ditadura.
No site da CMV (https://memoriaedireitoshumanos.ufsc.br/) consta que a primeira comissão foi criada pela RN 48/Cun/2014, de 16/12/2014. Prevista para durar um ano, teve seus trabalhos prorrogados até dezembro de 2016. Na seção “sobre”, tem algumas informações a respeito da primeira comissão, composta por 5 professores com formação ao mesmo tempo sólida e eclética no Brasil e no exterior 1) biblioteconomia e ciência da informação (Brasil), 2) engenharia elétrica (França), 3) em engenharia elétrica e informática (Brasil e França), 4) direito e história do direito (Brasil e Itália), 5) história (Brasil), além de um doutorando com formação em história e pedagogia (Brasil) e um bolsista com graduação em biblioteconomia e uma segunda graduação em história em curso (Brasil). Uma equipe claramente
qualificada para o trabalho.
Notícia de 03/10/2018 no site do CFH informa que o relatório final da CMV foi entregue à UFSC em 14/05/2018, 17 meses depois do fim dos trabalhos da comissão.
Notícias da UFSC de 31/03/2023 informa que o CUn da UFSC aprovou a criação de uma segunda comissão para dar encaminhamento às recomendações apresentadas no relatório final da CMV da UFSC, cujo relatório contém 12 recomendações ao próprio CUn e à administração da Universidade, que serão analisadas pela nova comissão com vistas à sua implementação. Uma das recomendações debatidas no CUn foi a de reavaliação, pelo Conselho Universitário, “das homenagens dadas anteriormente àqueles que praticaram comprovadamente denunciações e perseguições durante a ditadura civil-militar”. Não encontrei no site da CMV os membros desta segunda comissão e a respectiva portaria de criação.
Notícia vinculada pela APUFSC em 27/03/2025 vai além, e informa que “Entre estas pessoas, está o ex-reitor João David Ferreira Lima, que dá nome ao campus da UFSC na Trindade. Assim, entre os
pedidos da comissão, está a proposta de revogação do nome do campus.” A mesma notícia informa ainda que “A documentação que comprova o comprometimento do ex-reitor Ferreira Lima com as violações de direitos humanos durante a ditadura militar, e a não defesa de seus administrados, professores, servidores e estudantes em situações perigosas, não o habilita mais em receber uma homenagem unânime e pacífica de parte da UFSC, tendo seu nome associado ao campus”. E a mesma notícia tem anexo um relatório com as recomendações das comissões, no qual tem no anexo II uma proposta de resolução normativa (RN) que “estabelece normas para vedar a concessão e define procedimentos para deliberar sobre a revogação de títulos e homenagens a pessoas que cometeram graves violações de direitos humanos ou colaboraram em sua execução.”
Cabe perguntar se de fato há elementos que justifiquem mudar o nome do campus. Cabe perguntar também quais foram as contra-razões da família Ferreira Lima, através do seu representante legal.
Nos últimos 10 anos, não me lembro de receber informações de eventos para debater tal tema e o andamento dos estudos, provavelmente porque esse não é meu tema de interesse, logo não
faço parte deste clube. Mas recentemente me enviaram cartazes digitais convidando para debater as recomendações das comissões, particularmente da segunda comissão. Uma foi no CFH, dia 15/04/2025, 14h, auditório do bloco E; outra no CSE, dia 24/04/20205, 14h, na espremida sala dos conselhos, térreo do bloco F. Interessante ser sempre às 14h, logo depois do almoço. Estranho isso chegar a um público mais amplo somente 10 anos depois do início dos trabalhos.
Importante resgatar a cronologia dos eventos desde 2015, local, data e hora, capacidade das salas e auditórios, como foi divulgado, que público atingiu, apresentar os comprovantes de divulgação dos eventos em torno do tema nos últimos 10 anos.
Além disso, as fontes que consultei têm uma coisa em comum: nada falam sobre quanto custou os trabalhos da comissão. Neste contexto, seria importante saber qual era o orçamento inicial e ter prestação de contas detalhada dos trabalhos das duas comissões. Em particular, quantas pessoas trabalharam, quantos meses trabalharam, quantas horas de trabalho dedicaram, quais os outros custos além do trabalho dos membros da comissão, e demais informações correlatas, como passagens aéreas, hospedagem, custo dos livros que compilam os resultados dos trabalhos da CMV.
Esta informação (custo dos trabalhos da CMV) é particularmente importante em um momento de aperto orçamentário, conforme entrevista do Magnífico Reitor, na quarta-feira, 09/04/2025, ao programa Conversas Cruzadas, da Rádio CBN Floripa, quando falou sobre o preocupante cenário orçamentário da instituição.
https://noticias.ufsc.br/2025/04/reitor-fala-da-situacao-orcamentaria-da-ufsc-na-radio-cbn-floripa/
Em suma, dado os rumos que os trabalhos da primeira comissão tomaram sob o comando da segunda comissão, e a quantidade de dúvidas que paira sobre os encaminhamentos finais, creio que é fundamental ter cautela, sob pena de cometer equívocos que ao invés de reparar supostos erros do passado, podem criar novos embaralhos e degradar biografias dos que fizeram bastante pela UFSC e não estão mais entre nós. Me parece fundamental que o trâmite no CUn seja suspenso, que tenha mais debates e outras leituras sobre o acervo, o relatório, as conclusões, as recomendações, a proposta de RN, o rol de dúvidas, os esclarecimentos, as releituras, a prestação de contas, as contra-razões da família Ferreira Lima, o relatório do relator do caso no CUn, tudo disponibilizado para consultas no site da CMV para que sejam devidamente apreciados.
Logo é preciso revisar, sem pressa e com serenidade, os estudos e as recomendações das CMV da UFSC.
*Gilson Silva Jr é professor da graduação e pós-graduação em Economia da UFSC
Artigo recebido às 10h39 do dia 24 de abril de 2025 e publicado às 13h12 do dia 24 de abril de 2025