“Não podemos permitir mudança às pressas que prejudique quem sustenta o Estado”, critica a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público
O relatório final produzido pelo Grupo de Trabalho (GT) criado pela Câmara dos Deputados responsável pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Reforma Administrativa apresenta mudanças estruturais baseadas em quatro eixos principais: governança e gestão, transformação digital, profissionalização e extinção de privilégios.

O GT divulgou suas propostas nesta quinta-feira, dia 2, após 45 dias de trabalho, sete audiências públicas e mais de 500 horas de reuniões técnicas. A proposta prevê uma PEC, um projeto de lei complementar (PLP) e um projeto de lei. O modelo é focado em resultados, com planejamento de metas e avaliações de desempenho.
Coordenado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), o grupo propõe medidas como a instituição de um planejamento estratégico de metas, elaborado e apresentado por presidentes, governadores e prefeitos nos primeiros 180 dias de mandato. Os objetivos devem perdurar durante toda a gestão e serão desdobrados em acordos de resultados anuais por órgãos e entidades. As avaliações periódicas dos servidores estão inclusas neste ponto da reforma, e deverão ser implantadas em todos os órgãos do setor público.
O texto mantém a estabilidade dos servidores. Ainda assim, nas fases de estágio probatório, haverá a possibilidade de exoneração para os funcionários considerados inaptos ao cargo. Já aos servidores efetivos, será estabelecida a progressão funcional e o pagamento de bônus condicionados aos resultados das avaliações.
Também são propostas mudanças nos concursos públicos, que passarão a exigir dimensionamento prévio da força de trabalho por parte do governo, através de uma metologia definida em regulamento que não foi inclusa na PEC. Os concursos deverão estabelecer prioridade para carreiras transversais, ou seja, com a contratação de profissionais qualificados para atuar em mais de um órgão. A necessidade desse tipo de admissão deverá ser comprovada pelo poder público.
Tabela única de remuneração
A criação de uma tabela única de remuneração deverá ser implementada pela União, estados e o Distrito Federal através de uma lei específica. Nela, serão definidos os números de “escadas” remuneratórias para cada cargo público, com valores entre o salário mínimo e o teto do funcionalismo – R$ 46,4 mil.
A PEC propõe ainda uma restrição aos chamados “supersalários”, aqueles acima do teto constitucional. Isso será feito através do controle de verbas indenizatórias, conhecidas como “penduricalhos”, cuja concessão rotineira e permanente será proibida. Segundo o texto, elas serão permitidas apenas em casos de natureza reparatória, destinadas a cobrir despesas esporádicas e transitórias. Essa medida não deverá incluir auxílios de alimentação, saúde e transporte.
A proposta também inclui a determinação de que todos os valores recebidos por agentes públicos sejam individualmente divulgados. Adicionais por tempo de serviço, licenças-prêmio e a conversão de afastamento não usufruído em dinheiro também serão vedados, bem como a aposentadoria compulsória como forma de sanção disciplinar. Além disso, todos os servidores terão no máximo 30 dias férias, exceto docentes e profissionais de saúde cuja exposição a fatores de risco justifique períodos superiores.
Críticas de especialistas e de entidades
Em reportagem publicada pela Folha, o consultor jurídico e professor titular da FGV Direito Carlos Ari Sundfeld analisa que o texto cria uma série de burocracias e centraliza a organização do Estado nas mãos da União. Para ele, o conjunto de textos tem uma dimensão muito grande e a discussão será de “uma complexidade gigantesca”, o que pode ter um efeito de atrasar a modificação da administração pública.
Entidades representativas do serviço público, que têm se manifestado de maneira contrária à reforma principalmente por não terem sido envolvidas nas discussões, estão sendo cautelosas ao analisar o texto apresentado. “Em breve, faremos uma análise detalhada da reforma que está sendo proposta, com a devida ponderação sobre seus aspectos políticos e negativos. No entanto, à luz do que já foi antecipado pelo próprio relator, é possível afirmar, desde já, que as expectativas não são das mais promissoras“, apontou o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público se manifestou nas redes sociais: “O relator da Reforma Administrativa aposta em aprovação neste semestre, mas pra quem será que essa “agilidade” vai servir?”. O grupo ainda afirma que estão em jogo as garantias para servidores públicos, a flexibilização excessiva de direitos já conquistados e denuncia a prioridade para ajuste fiscal em vez de valorização do serviço público. “Não podemos permitir mudança às pressas que prejudique quem sustenta o Estado. Vamos resistir e denunciar: reforma injusta não passa!”, conclui a Frente.
Tramitação
Conforme o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), em linhas gerais, a PEC deverá ser inicialmente apreciada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), depois por uma comissão especial e, posteriormente, ser votada em dois turnos no plenário da Câmara dos Deputados. Contudo, manobras regimentais podem acelerar esse processo de tramitação, como a possibilidade de apensar a proposta em fase avançada no plenário, a exemplo da PEC 32/2020, da Reforma Administrativa encaminhada pelo governo Bolsonaro.
O PLP e o PL, por sua vez, podem ser despachados para análise preliminar nas comissões permanentes ou, alternativamente, ter sua tramitação abreviada por meio da apresentação de requerimentos de urgência, que permitem o envio direto ao plenário.
Outro cenário possível, adotado com frequência na gestão do presidente Hugo Motta, é a criação de comissões especiais para discutir cada uma dessas matérias em uma única etapa antes da votação no plenário. Além disso, todas as propostas devem ser analisadas pelo Senado.
“Os próximos passos dependerão de uma combinação de fatores, como o rito de avaliação e apoio do colégio de líderes que conduzem a agenda da Casa. Combinado a isso, há limitações impostas pelo calendário legislativo e sua influência do ano pré-eleitoral, qual será a posição do governo em relação à reforma e a capacidade de mobilização dos servidores públicos diante das mudanças propostas pelo grupo de trabalho”, destaca o Diap.
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Imprensa Apufsc
Com informações da Agência Câmara
