Ilha de Santa Catarina fora do mapa de proteção da Mata Atlântica?

Esta será uma das consequências caso a proposta de edição da Lei da Mata Atlântica feita pelo ministro Ricardo Salles seja acatada, alertam ONGs

A Rede de ONGss da Mata Atlântica, entidade que congrega 156 entidades de proteção ambiental do Brasil, está se mobilizando para tentar evitar mais uma ação do ministro Ricardo Salles contra o Meio Ambiente, pasta que ele administra. Salles encaminhou à Casa Civil uma proposta de edição do decreto 6.660/2008, que regulamenta a Lei da Mata Atlântica (2006). Entre outros retrocessos, o ministro propõe a retirada de áreas relevantes do ponto de vista ambiental da referida Lei. Se a proposta de Salles for efetivamente acatada e o decreto for editado pelo presidente Jair Bolsonaro, ilhas costeiras –  como  a Ilha de Santa Catarina, por exemplo –   ficarão desprotegidas, ou seja, serão excluídas da Lei da Mata Atlântica, assim como as ilhas oceânicas, restingas, manguezais e florestas ombrófilas densas, entre outros ecossistemas.

“A situação é preocupante. A Ilha de Santa Catarina, que ainda resguarda belos remanescentes de vegetação nativa, perderia a proteção conferida pela Lei da Mata Atlântica. Além disso, os refúgios vegetacionais, como o Campo dos Padres, em Urubici, áreas de serra que concentram espécies raras, também ficariam de fora. Pelas nossas estimativas, se o decreto for mesmo editado, pelo menos 10% do remanescente de Mata Atlântica do país vai perder a proteção”, diz o coordenador geral da Rede de Ongs da  Mata Atlântica e professor aposentado do departamento de Botânica da UFSC, João de Deus Medeiros. E tudo o que ainda resta de Mata Atlântica no Brasil estará vulnerável ao desmatamento, acrescenta.

Diante desse risco, a Rede está se mobilizando como pode em tempos de pandemia, por meio de uma campanha que inclui lives nas redes sociais e contatos com lideranças da sociedade para que somem forças na resistência contra essa medida. “Estamos nos antecipando para que o decreto não seja editado. O ideal é que essa proposta do ministro Salles seja engavetada”. A Rede enviou à Procuradoria Geral da República um documento técnico no qual pontua os motivos para a manutenção do atual decreto – e da atual Lei da Mata Atlântica , sem as edições propostas por Salles.

O ministro do Meio Ambiente enviou a proposta de edição do decreto à Casa Civil na segunda quinzena de abril. “É um contrassenso que o ministro do Meio Ambiente tome iniciativas como esta”, destaca o professor João de Deus. Ele explica que toda a orientação de proteção ambiental da Mata Atlântica se dá com base em dois documentos:  o decreto 6.660, publicado em 2008 para regulamentar a Lei da Mata Atlântica (2006), e o Mapa de Aplicação da Lei da Mata Atlântica, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) conforme as definições de áreas protegidas pelo próprio decreto. Eventuais mudanças no decreto, portanto, resultariam na reformulação deste Mapa – no caso das mudanças propostas por Salles, excluindo as Ilhas costeiras e oceânicas, manguezais, restingas e refúgios vegetacionais.

Sequência  de atos contra o Meio Ambiente

Recentemente, o ministro Ricardo Salles editou o Despacho 4.410 orientando o IBAMA a consolidar todas as áreas de preservação permanentes ocupadas irregularmente até 2008. Com isso vários autos de infração serão anulados e extensa área de Mata Atlântica deixa de ter sua recuperação exigida.  Três ações judiciais já foram impetradas contra este ato do ministro, uma delas do Ministério Público em conjunto com a entidade SOS Mata Atlântica. “Este, infelizmente, já é um ato consolidado. No caso da Lei da Mata Atlântica esperamos conseguir barrar a edição do decreto”, observa o coordenador da Rede.

Ele conta que desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu, as entidades que defendem o  meio ambiente perderam as oportunidades de diálogo com o governo, antes frequentes. “Antes a Rede participava das audiências, sentava com os ministros para conversar”, compara. Bolsonaro reformulou o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA),  que era “um modelo internacional desde a década de 80”, retirando os representantes da sociedade civil.

“Em 27 de maio comemoramos o Dia da Mata Atlântica, patrimônio nacional. Infelizmente estamos neste ano canalizando forças para evitar novos ataques ao bioma. E o pior é que as ameaças partem de quem tem a obrigação de protegê-lo, o Ministério do Meio Ambiente”, lamenta o coordenador da Rede.

Imprensa Apufsc