Ao comando!

Não se envergonhe de perguntar, camarada!

Não se deixe convencer

Veja com seus olhos!

O que não sabe por conta própria

não sabe

Verifique a conta

É você que vai pagar

Ponha o dedo sobre cada item

Pergunte: o que é isso?

Você tem que assumir o comando!

(Bertold Brecht)

OS DILEMAS DA REPRESENTAÇÃO

O recente debate sobre Regimento ocorrido na Apufsc não foi meramente burocrático. O novo Regimento aprovado consagra o Conselho de Representantes como o coração pulsante de uma Apufsc renovada. O CR, ao possibilitar que nossa diversidade se expresse, é um importante instrumento que poderá viabilizar um sindicalismo que de fato ausculte o conjunto dos professores. É nossa esperança que assim romperemos com o vanguardismo, com a ação política equivocada, separada da comunidade da qual emergiu, reconciliando a gestão sindical com a vontade coletiva.

O P. Philippi sintetizou de forma incisiva o papel que deverá desempenhar o CR na nova dinâmica da Apufsc: o CR fará “o que hoje fazem as AG”s. Com algumas diferenças: i) no CR estão representantes e não indivíduosd+ ii) num CR legítimo é possível a discussão o que é IMPOSSÍVEL numa AG legítimad+ iii) com um CR forte é possível à Apufsc decidir com os neurônios de seus associados e não com os fígados, ideologias e sentimentos de meia-dúzias”.

Através do CR não recorreremos repetidamente ao desgastado assembleísmo (preservando as assembléias gerais para verdadeiras e decisivas ocasiões), e minimizaremos a doença fatal do aparelhismo. Não se usará mais de instrumentos democráticos para fazer chantagens coletivas, prática que debilita o poder político originário da nossa comunidade universitária. Ou seja: decisões cruciais serão realizadas por referendos e/ou em AG com quórum qualificado. As demais serão de competência do CR, uma forma de participação que exprime uma cidadania ativa, pois exige uma permanente consulta e interlocução com todos os colegas.

Uma Apufsc renovada minimizará a tomada de decisões feita entre as paredes da sala de reuniões da Diretoria (além de torná-las transparentes ao máximo), pois terão maior peso os processos de decisão fundados tanto em formas de democracia direta, quanto representativa. Assim, os que mandam, mandarão obedecendo, exercerão delegadamente o poder da comunidade (E. Dussel, 20 teses de política. Buenos Aires: CLACSOd+ São Paulo: Expressão Popular, 2007).

Porém, dois mitos corroem a função da representação: a idéia da plena participação (que nega a mediação representativa), e a da total passividade (que fetichiza o poder do representante, que passa a auto-afirmar-se autisticamente). Ora, como a democracia direta nem sempre é possível, a mediação da representação é necessária, e “uma certa passividade é inevitável”, alerta Dussel. É preciso compreender que a democracia real resulta da permanente tensão destes mitos, oscila entre o ideal da participação e a entropia democrática.

Neste sentido, a consulta constante aos colegas por parte dos representantes, mesmo que muitas vezes sem aparente retorno algum, é de grande valor. O ato de consultar os representados, bem como a transparência e a prestação de contas, são mecanismos de controle que instituem a confiança, possibilitam a comunidade exercer poder de correção e pressão, desenvolvendo o sentimento de que o sindicato pertence a todos.

O representante, ao manter um fluxo contínuo de informações para os demais colegas, gera um poder de controle permanente. Disto nutre-se um cidadão vigilante, remédio para o mau funcionamento das instituições, para o inacabamento do ideal democrático, para a insuficiência da legitimidade advinda dos lentos e periódicos ritmos da democracia eleitoral.

Porém, o consentimento silencioso, o apoio passivo, são sintomas duma perda do sentido do interesse geral, duma fuga dos intelectuais universitários do espaço público (e até mesmo dos seus gabinetes de trabalho: muitos, cada vez mais, trabalham em casa). Não há nenhum demérito em se buscar os legítimos interesses particulares. Mas, se a eles nos restringirmos, nossa universidade ficará à deriva, nas mãos dos oportunistas de plantão.

Se cada um apenas procura seus propósitos privados, nossas potências individuais se anulam, produzem impotência (Dussel). Para fazer face ao individualismo desagregador, e gerarmos a maior potência da sinergia coletiva, não nos resta alternativa senão buscar insistentemente a construção de espaços comuns (virtuais e reais), formas voluntárias de associação que conjuguem a necessária interação comunitária com a irrenunciável liberdade individual, permitindo ao ser humano completar e expressar plena e criativamente sua individualidade, aperfeiçoar-se ainda mais.

Caso contrário, o sindicalismo, que deve produzir resultados, levará a prevalecer a perspectiva do acionista, já revelada no final do séc. XIX por Machado de Assis: o acionista não quer perder tempo com assembléias, nem se importa com os divisores (administradores). Quer apenas os dividendos. Mas estes, no mundo sindical, apenas surgem quando há uma mínima unidade, advém da força coletiva. Se ela não houver, os esperados resultados não virão…

É positivo que a Apufsc se concentre mais nas questões de interesse concreto e imediato do conjunto dos professores, como acompanhar ativamente as negociações salariais ou do Plano de Saúde (e não apenas denunciar e criticá-las, bloqueando-as). Isto não significa se alienar dos grandes temas nacionais, mas apenas priorizar nossa realidade enquanto categoria profissional, articulando-a, quando for o caso, com outras dimensões sócio-políticas.

Como nossa corporação é financiada por uma comunidade maior, a capacidade de levar as lutas sindicais para além das questões corporativas vai depender de vários fatores, muitos dos quais transcendem a nós mesmos. Porém, há uma condição sine qua non para isto: que o sindicato responda, antes de tudo, às demandas corporativas, seja representativo da maioria da categoria.

O FIM DO CONTRA-MOVIMENTO

O imenso esforço de renovação da Apufsc contribui para o fortalecimento da nossa instituição mater, a UFSC, pois desarma uma bomba que há muito tempo apenas alimentava metástases pela UFSC, coágulos irracionais que pouco se coadunam com a realidade universitária.

O novo Regimento propiciará uma crucial inversão de polaridade, que progressivamente mudará a “cultura” daqueles que se dedicam ao sindicato, a cultura míope do confronto a todo custo, que apenas faz crescer fraturas internas e mina a confiança necessária para que lutemos juntos.

Ora, numa AG cada um vota segundo sua consciência. Até agora, poucos militantes iam para uma AG e, sem buscar dialogar e convencer os demais, decidiam pela Greve (ou qualquer coisa). A ampla maioria, se quisesse interferir, tinha que se esforçar e se mobilizar para derrubá-la, gerando um contra-movimento (como o incrível “comando local contra a greve”). Como resultado, além deste fluxo contrário ao que deveria ser o fluir normal das águas sindicais, tivemos as últimas esvaziadas paralisações de meia dúzia, aprofundando o descrédito do “movimento” docente.

Agora, a vanguarda que estiver convencida da oportunidade de uma greve terá que se mobilizar para vencer a inércia da sua tribo. Ou seja: uma greve ocorrerá se, e somente se, houver, de fato, MD, mobilização. Somente se um amplo conjunto de professores aderir e participar é que uma greve fará sentido. E isto se faz dialogicamente através da capilaridade do CR.

*Assinam os professores:

Marcelo Carvalho (CFM-MTM), Sinesio S. Ostroski (CSE-CAD), Raul Burgos (CSE-SSO), Héctor Ricardo Leis (CFU-SPO), Armando Lisboa (CSE-CNM), (Fernando Milman (CFM-FSC), Gerônimo W. Machado (CSE-APO), João Carlos Fagundes (CTC-EEL), José Fletes (CTC-INE), Paulo C. Philippi (CTC-EMC), Remy J. Fontana (CFH-SPO), Marcos Aurélio Silva (CFH-GCN), Pedro A. Vieira (CSE-CNM), Marcio Campos (CCJ), Mário Teixeira (CCS-CLM), Hans Michael van Bellen (CSE-CCN), Nestor Roqueiro (CTC-DAS), Humberto Ramos Roman (CTC-ECV), Ricardo V. Silva (CFH-SPO), Gustavo Caponi (CFH-FIL), Sandra Caponi (CCS-SPB), Armen Mamigonian (CFH-GCN), José Messias Bastos (CFH-GCN), Roberto de Oliveira (CTC-ECV), António F. C. da Silva (CTC-EMC), Clóvis Montenegro de Lima (CED-CIN), Antonio Kanaan (CFM-FSC), María del Carmen Cortizo (CSE-SSO)