Ensino a distância: agora e no futuro

O cenário do ensino superior público, na Europa e fora dela, apresenta hoje orientações que se cruzam com tendências próprias do ensino a distância (EaD).

Por exemplo: a responsabilização política e social das instituições de ensino superiord+ a valorização das aprendizagens informaisd+ a aprendizagem ao longo da vida (ALV), como resposta à rápida mutação de conhecimentos e de requisitos profissionaisd+ a afirmação do princípio da mobilidade estudantil e da creditação transnacional das formaçõesd+ a evolução do EaD, com predominante intervenção de tecnologias da informação e da comunicação e do ensino on-line e em reded+ o desenvolvimento dos recursos educativos abertos, conduzindo à ideia de que é possível disponibilizar cursos e materiais de aprendizagem de forma gratuita e universalmente acessível via internet.

Pela importância que vem assumindo, destaco aqui, no ponto de encontro do EaD com o ensino superior, a aprendizagem ao longo da vida.

O conceito de ALV foi fixado desde 1996, num relatório do Conselho da Europa. Foram caracterizadas as ofertas para formação de adultos no ensino superior, bem como a estratificação dos grupos sociais que as integram. Dentre estes, destacam-se os públicos que buscam aperfeiçoamento profissional contínuo, tendo, em geral, qualificações acadêmicas e/ou profissionais e estando empregados.

Esses cursos, considerados de elevada qualidade e “feitos sob medida” para os participantes, dirigem-se a estudantes de reconhecido potencial acadêmico e se beneficiam do recurso da aprendizagem on-line, com privilégio da formação de comunidades de aprendizagem.

É aqui que ganham acuidade as formações que apostam no EaD servido por processos pedagógicos que têm contribuído para o retirar da nuvem de preconceitos em que esteve mergulhado nos seus primórdios.
Noutros termos: só por ignorância ou por resistência corporativa se pode desprezar um capital de experiência e inovação que, para mais, está na linha do que é hoje a tônica da nossa relação (interativa e sem fronteiras espaciais) com os outros e com o mundo.

Acredito que, no Brasil, uma sociedade por natureza aberta à mudança e propensa à criatividade, a batalha a travar seja menos árdua do que em paragens em que as universidades tardam em reconhecer o que ouvi a Manuel Castells durante a 23ª Conferência Mundial do ICDE (Internacional Council for Distance Education): que a responsabilidade da educação virtual (expressão que, para Castells, representa o sucedâneo do EaD) é uma oportunidade para o trabalho das universidades e que, num mundo em que as pessoas, ao longo das suas vidas, mudam de atividade uma meia dúzia de vezes, a premência da ALV deve obrigar as universidades a reprogramar os saberes e as competências que procuram transmitir a quem as frequenta.

E quem as frequenta já não são apenas os estudantes convencionais que na minha geração aprendiam (ou julgavam aprender) para toda a vida.

Há uma palavra-chave que rege essa mudança de paradigma: flexibilidade. Ela traduz um princípio fundamental de uma pedagogia virtual orientada para um estudante adulto, com responsabilidades profissionais, familiares e cívicas, disponível para aceder aos conteúdos e às atividades de aprendizagem de forma maleável, sem imperativos temporais ou espaciais, e, assim, a comunicação e a interação processam-se na medida em que é conveniente para quem estuda, o que configura um processo de ensino-aprendizagem assíncrono e contínuo, independentemente do tempo e do lugar onde se encontram professores e estudantes.

A esse princípio juntam-se outros três, que mencionamos aqui.

1) O princípio do centramento na aprendizagem, perspectivando um estudante ativo, empenhado e comprometido com o seu processo formativo e integrado numa comunidade de aprendizagem.

2) O princípio da interação, alargada à relação estudante-estudante, por meio da criação de grupos de discussão, sem esquecer o valor da escrita e da reflexão crítica.

3) O princípio da inclusão digital, apontando para a facilitação do acesso dos adultos que pretendam frequentar programas universitários e não tenham adquirido desenvoltura na utilização das tecnologias da informação e da comunicação.

Sendo certo que a infoexclusão é hoje sinônimo de exclusão social, a educação superior de adultos a distância contribui para a diminuição do fosso entre infoincluídos e infoexcluídos digitais. É esse também um benefício (mais um) de uma modalidade de ensino que mudará o nosso futuro, em termos que só a falta de visão, a tibieza ou a escassez de iniciativas conseguirão limitar.

Carlos Reis, 58, é professor de literatura portuguesa e reitor da Universidade Aberta, de Portugal.