Corte ou contingenciamento? Quem está certo na guerra de narrativas da educação?

Site El País ouviu especialistas para esclarecer termos que têm sido usados no debate sobre orçamento 

O governo Bolsonaro abriu caminho para uma guerra semântica ao argumentar que não fez cortes nas verbas destinadas à Educação, mas, sim, um contingenciamento, necessário para o controle das contas em um momento de baixa arrecadação.

Mas, afinal, quem está certo? É mais correto dizer que Bolsonaro fez cortes ou contingenciamento? As duas palavras têm diferença. Um cortes de verba é algo permanente: o dinheiro deixa de fazer parte do Orçamento da pasta para sempre.

No caso de um contingenciamento, a verba é congelada por um período e depois pode ser desbloqueada, caso haja uma melhora nas costas públicas. Nesse caso, o ministério da Economia distribui a quantia que deverá ser suspensa para cada pasta. Tecnicamente são intervenções diferentes para o controle de gastos em momentos de baixa arrecadação, e ambas já foram adotadas em outras gestões. “É uma prática muito comum no Brasil, principalmente nas esferas federal e estadual”, explica Cibele Franzese, vice-coordenadora de Administração Pública da FGV e ex-secretária adjunta de Planejamento do Estado do São Paulo.

Distribuídas as faturas para cada ministério, a Educação acabou sendo a pasta que mais sofreu bloqueio em termos absolutos (foram R$ 5,8 bilhões), embora a suspensão tenha sido proporcionalmente menor do que a ocorrida em outros ministérios. E como as universidades são responsáveis por grande parte da verba gasta pela pasta – grande parte do investimento no ensino básico é de responsabilidade de Estados e municípios -, foram essas as instituições que mais sofreram.

Na ponta do lápis, o orçamento anual do MEC é de R$ 149 bilhões para todos os níveis da educação. Já o montante aprovado para todas as 63 universidades federais para 2019 é de R$ 49,6 bilhões. Cerca de 85% desse valor será destinado a pagar salários, algo que o Governo não pode mexer —são os chamados gastos obrigatórios. Sobram para manobra, portanto, as chamadas despesas discricionárias, destinadas a custear gastos como água, luz, limpeza, bolsas de auxílio a estudantes etc. Foi nessa área que o MEC bloqueou 30% das verbas para cumprir o plano de contingenciamento do Governo. Olhando para o Orçamento todo, incluindo as despesas discriminatórias e as obrigatórias, o percentual de suspensão fica em 3,5%, ou “três chocolates e meio”, segundo os exemplos teatrais do ministro da Educação em um vídeo gravado com Bolsonaro no início do mês.

O Governo afirma que o recurso poderá voltar a ser liberado se a reforma da Previdência for aprovada e se a economia do país melhorar no segundo semestre. “Esse contingenciamento vai ser revertido”, afirmou Weintraub. Mas Cibele explica que, dependendo do momento em que essa verba for desbloqueada, ela pode se tornar inútil. “Se o dinheiro voltar em setembro, por exemplo, pode ser que de lá até dezembro as universidades não tenham tempo pra gastá-lo. Porque você precisa, por exemplo, abrir licitações para muitas coisas”, diz. “Pode ser que em setembro o prejuízo já tenha sido causado”. Se a economia não melhorar, também existe a possibilidade de o contingenciamento virar, aí sim, um corte. Ou seja, algo permanente.

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