Febre dos testes rápidos para furar a quarentena pode estimular o comportamento de risco

Especialistas alertam que exames não são adequados para diagnosticar a covid-19

Um exame para o novo coronavírus tão simples quanto um teste de gravidez é vendido nas farmácias brasileiras há quase dois meses. Custa entre 100 e 200 reais e atrai pessoas com algum sinal de desconforto respiratório que buscam saber se estão ou não com a covid-19.

Neste final de semana, esse tipo de teste ganhou as redes sociais, quando viralizou um vídeo de uma festa em Brasília onde os exames eram disponibilizados na entrada para avaliar quem poderia ou não entrar na festa. Se o resultado era negativo, a passagem estava liberada. Se positivo, a entrada era barrada: a interpretação mais errada e arriscada possível do resultado.

A medida que o isolamento se estende e os casos da doença crescem—nesta segunda, o país chegou a 51.271 mortes e 1.106.470 infectados— a busca por uma resposta para se saber se já foi vítima da doença também aumenta. Se espera que resultado possa ser um passaporte para uma vida menos restrita. Mas especialistas alertam que testes feitos no momento errado e com resultados mal interpretados podem levar a população a um comportamento de risco.

Os chamados testes rápidos —feitos a partir de uma amostra de sangue colhida de uma picada no dedo— não são capazes de dizer se uma pessoa está ou não infectada e transmitindo o vírus naquele momento, ressaltam especialistas. O único teste capaz de detectar a presença do novo coronavírus durante a infecção é o chamado RT-PCR, feito a partir de uma amostra respiratória do paciente com sintomas da doença e processado em laboratório. Os rápidos olham sempre para uma fotografia do passado: detectam se a pessoa já teve contato com o vírus em algum momento e se produziu anticorpos contra ele.

Por isso, a forma como foram lidos na festa em Brasília foi errada. Resultados negativos indicavam justamente que a pessoa não tinha anticorpos gerados pelo contato com o vírus e, portanto, estaria suscetível a pegar a doença. O negativo também seria o resultado de pessoas que, naquele momento, estavam infectadas com o vírus e transmitindo, ainda que sem sintomas, já que o organismo delas ainda não teriam tido tempo de desenvolver os anticorpos que seriam acusados no exame.

“[Esse tipo de teste] é jogar dinheiro fora e é uma informação que pode confundir a população”, afirma a pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, Natália Pasternak. Na festa em Brasília, dois profissionais de saúde aplicavam o teste rápido ―feito com uma gota de sangue a partir de um furo no dedo para detectar anticorpos e cujo resultado sai em alguns minutos. No vídeo, uma convidada destaca que a comemoração levava em conta os cuidados durante a pandemia e que só entravam os que tiveram o teste negativo, que ela chamou de “covid free”. “O teste rápido é feito com o sangue para ver se há anticorpos. A pessoa pode ter tido contato com o vírus há semanas [e aí testa positivo]. É um exame que olha para o passado e não serve para fazer diagnóstico”, complementa Natália.

Leia na íntegra: El País