Enquanto governo do Estado pretende investir R$ 1,2 bilhão em universidades privadas, docentes da Udesc acumulam perdas salariais de 22%

Além disso, o quadro de servidores docentes e técnicos-administrativos é considerado insuficiente pelas entidades que representam trabalhadores

O governador Jorginho Mello (PL) entregou oficialmente na última terça-feira, dia 16, o projeto que recebeu o nome de Universidade Gratuita para a Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc). A entrega teve tom de solenidade e contou com a presença dos reitores das faculdades do Sistema Acafe. O projeto, que foi uma das principais promessas de campanha do governador, pretende oferecer até 75 mil vagas gratuitas em nível de graduação a estudantes catarinenses nas universidades comunitárias que, segundo a lesgislação vigente, são instituições “de direito privado”. A expectativa do Executivo é que o programa comece no segundo semestre, atendendo cerca de 30 mil estudantes. Numa escala que começa em 2023 e vai até 2026, quando estará totalmente implementado, o Governo do Estado deve investir R$ 1,2 bilhão no programa.

O alto valor chama atenção principalmente porque será repassado a instituições de ensino privadas. De outro lado, as instituições públicas de educação superior carecem de atenção do governo. Na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), as perdas salariais da categoria docente chegaram a 22%, além de 135% no vale-alimentação. Além disso, o quadro de servidores docentes e técnicos-administrativos é considerado insuficiente pelas entidades que representam trabalhadores.

Governador Jorginho Mello entregou projeto de lei à Alesc (Foto: Vicente Schmitt/Agência AL)

“O pano de fundo desse projeto é a política privatista. Você vai sufocando a universidade pública por falta de investimentos e de política salarial”, avalia Douglas Ladik Antunes, presidente da Aprudesc.

Em novembro de 2022, o Conselho Universitário (Consuni) da Udesc – órgão superior com função normativa, consultiva, deliberativa e decisória – aprovou o relatório da Comissão Especial Temporária constituída para avaliar as perdas salariais e o plano de carreiras dos servidores. O levantamento da Comissão apontou o prejuízo dos trabalhadores da universidade, que há seis anos sofrem com o congelamento salarial.

Segundo a Associação dos Professores da Udesc (Aprudesc), a defasagem do Valor Referencial de Vencimento (VRV) chega a 22%, e do vale-alimentação atinge 135%. Além disso, o plano de carreira também está defasado, impedindo a progressão de servidores. A entidade também afirma que o quadro de pessoal é insuficiente.

Douglas Ladik Antunes, presidente da Aprudesc, explica que o projeto Universidade Gratuita ainda não foi pauta de debate entre docentes porque a entidade passa por um período de transição, mas demonstra preocupação com o assunto. Ele conta que o Conselho Universitário da Udesc aprovou a reposição em 22% no salário e mais o vale-alimentação na reunião do dia 25 de abril, mas os reajustes ainda não tramitam na Alesc. “Passamos as duas últimas gestões inteiras da Udesc sem reajuste salarial. Tivemos uma reposição ano passado, quando a defesagem estava perto de 31% e mais de 100% de desafasagem no auxílio-alimentação. Isso vai se agravar agora e é um problema”, explica. Nesta quarta-feira, dia 24, uma assembleia será realizada pela Aprudesc para discutir o assunto.

Udesc foi criada em 1965 (Foto: Ricardo Wolffenbüttel/Secom SC)

Em 2021, a Alesc aprovou o Projeto de Lei Complementar (PLC) 29/2021 que concedeu reajuste de 19% aos servidores da Udesc. No Consuni, o valor que havia sido aprovado era de 23%. Foram impactados 2.449 funcionários, entre ativos, inativos e temporários. A reposição entrou em vigor em 1º de janeiro de 2022. O valor atual do VRV é de R$ 429,92.

O Sindicato dos Técnicos da Udesc (Sintudesc) também tem se manifestado sobre a situação: “A desvalorização dos trabalhadores atingiu um patamar que exige a mobilização da sociedade catarinense e a união e luta da categoria em defesa dos direitos dos técnicos e professores responsáveis pela qualidade do ensino oferecido pela instituição”.

Recorde de estudantes, falta de profissionais

Em janeiro, a Udesc encerrou as inscrições para o Vestibular de Verão 2023 com o maior número de inscritos de sua história. Segundo dados da universidade, 15.790 pessoas disputaram as 1.625 vagas disponibilizadas para o primeiro semestre letivo com o objetivo de participar de um dos 49 cursos presenciais oferecidos pela instituição. Mas de acordo com a Aprudesc, em 2022 eram 1.120 docentes na universidade – número considerado baixo. “A gente pede concurso público para professores e técnicos-admistrativos. A relação técnico/professor na Udesc é 0,6. Não se abre novos concursos sob justificativa da falta de orçamento, mas para direcionar recursos para privadas, tem”, pontua Antunes.

Em 2022, o governo do estado anunciou a abertura de concuso público para preenchimento de 30 vagas para técnicos universitários e 60 vagas para professores da Udesc.

No último vestibular, Udesc teve 15.790 pessoas inscritas (Foto: Ricardo Wolffenbüttel/Secom SC)

Instalação de centro em Caçador gera polêmica

Em junho do ano passado, a Alesc aprovou o Projeto de Lei Complementar (PLC) 16/2022, do Poder Executivo, que altera a lei sobre o Plano de Carreiras dos servidores da Udesc para criar novos cargos de professor, de técnicos e de funções de confiança para viabilizar a instalação do Centro de Educação Superior do Meio-Oeste (Cesmo) da Udesc em Caçador. Apesar da aprovação por unanimidade, a proposta recebeu críticas.

A deputada Luciane Carminatti (PT) afirmou que o texto encaminhado pelo Executivo difere bastante do que foi aprovado pelo conselho universitário da Udesc. “Fizemos todas as tentativas para reverter isso, já que o texto que saiu do conselho universitário tratava de situações referentes aos servidores da Udesc”, disse a parlamentar. “Não está havendo respeito à autonomia da universidade”, completou a deputada, que disse ainda que “estamos criando um campus, mas prejudicando os 12 outros campus instalados em outras nove cidades.”

O líder do Governo na ocasião, deputado José Milton Scheffer (PP), afirmou a inclusão de outros itens no PLC poderia ferir a legislação eleitoral. “O projeto era mais amplo, são reivindicações justas na valorização das carreiras. Mas está se cumprindo o compromisso do governo em levar a Udesc para a região de Caçador.”

Outro lado

A assessoria de imprensa da Apufsc-Sindical entrou em contato com o governo do Estado para saber se existe a previsão de reajuste para servidores da Udesc e de contratação por meio de concurso público. Por meio da assessoria de imprensa, a Secretaria de Estado da Educação respondeu que as respostas devem ser dadas pela própria Udesc. Na quarta-feira, dia 17, a Apufsc questinou a universidade sobre o assunto, mas não obteve respostas até o momento.

Stefani Ceolla
Imprensa Apufsc