Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência: professora da UFSC conta sua história e como inspira as novas gerações

Gabriela Kaiana Ferreira, ex-diretora da Apufsc-Sindical, é coordenadora do projeto Meninas na Ciência

Nesta terça-feira, dia 11, é comemorado o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2015 com o objetivo de incentivar a participação feminina na ciência e na tecnologia, bem como reconhecer seu papel fundamental na área. Para marcar a data, a Apufsc-Sindical conversou com a professora e pesquisadora Gabriela Kaiana Ferreira, do Departamento de Física da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), coordenadora do projeto de extensão Meninas na Ciência e ex-diretora do sindicato.

Como foi a sua trajetória até se tornar pesquisadora?

Eu me formei em licenciatura em Física em 2009, no curso da Universidade do Estado de Santa Catarina. Eu considero que, no início, eu gostava muito de ciências, mas física não era minha primeira opção, mas pela razão das circunstâncias da época, fiz o curso de Física. Em 2010 eu entrei no mestrado em Educação Científica e Tecnológica na UFSC, continuei desenvolvendo o mesmo projeto que eu desenvolvia na minha iniciação científica, foi uma continuação. Tive a alegria de ser orientada pelo meu supervisor, meu orientador, da iniciação científica [José Francisco Custódio]. Ele também veio da Udesc para a UFSC, e a gente começou nossa trajetórias, ele como professor e eu como estudante, no mesmo ano na UFSC. E também desenvolvi minha pesquisa de doutorado sob a supervisão desse mesmo professor,
que é meu colega de trabalho hoje.

Inicialmente, eu trabalhei com motivação para aprender, com afetividade no ensino de Física, que era o o tema que a gente trabalhava, que eu me identifiquei e eu gostei muito de estudar desde a minha iniciação científica. E é um tema que me atrai, que me mantém conectada com a ciência, conectada com as pessoas, conectada com a divulgação científica, conectada com os projetos até hoje.

Na época, não era um tema muito, como é que eu posso dizer, conhecido. Nas áreas da educação dos anos iniciais, ou em outras áreas da educação, talvez fosse mais conhecido, mas essas aplicações no ensino de ciências, no ensino de Física, não eram muito aplicadas na pesquisa. Então, posso dizer que tive uma ótima orientação e consegui aprender muito nessa área, e desenvolvo, ainda. A minha prática está repleta do que eu estudei na pesquisa naquela época, está imbuída dessas coisas, desses temas que eu estudei, até hoje. Atualmente, estou fazendo o meu pós-doutorado na University of South Florida. Agora estou estudando um tema que é uma continuação do meu tema de doutorado, que é a natureza da ciência, as crenças epistemológicas de professores, e estou envolvendo, também, questões sociocientíficas e a questão do gênero na ciência. Das mulheres na ciência.

Quais foram suas principais motivações durante esse percurso?

A minha paixão pela pesquisa cresceu lá na Udesc, nasceu e cresceu quando eu era uma estudante de graduação, por conta do grupo de ensino de Física que me levou para a área do ensino. Mas o envolvimento em congressos, os eventos acadêmicos, já desde a graduação, foram tornando isso mais forte em mim. E entender como que as pessoas pensam, as crenças das pessoas, as crenças epistemológicas, os objetivos que elas têm com a aprendizagem, o que elas entendem por ciência, a formação de professores, todos esses assuntos me motivam, e é o que eu onde eu tenho me aprofundado hoje.

Quais foram as maiores dificuldades e como você as encarou?

Foi muito difícil, eu passei muitos desafios durante o curso, mas eu acho que uma das principais coisas que me fez continuar foi o suporte que eu tive dos meus supervisores de estágio, professores de estágio, professores da prática de ensino de Física, professoras de Física. É claro, a gente sempre lembra, eu, pelo menos, tento rememorar, lembrar, trazer as lembranças comigo dos professores que me auxiliaram a completar esse curso. Eu acho que eles foram muito importantes para minha trajetória acadêmica. Acho que eu posso dividir em dois desafios: as barreiras externas e as barreiras internas.

As barreiras externas são, basicamente, que no curso de Física eu estudava só com homens, eu não me sentia representada naquele espaço, eu duvidei muito que aquilo fosse para mim, porque eu levava a coisa muito a sério e muitas vezes eu não via o resultado que eu esperava. Eu tive uma reprovação numa disciplina que me fez duvidar muito da minha capacidade à época.

E, paradoxalmente, a única disciplina em que eu reprovei foi na de Física I, que foi lecionada pelo meu orientador, que foi meu orientador de iniciação científica, mestrado, doutorado, e a primeira disciplina que eu lecionei na vida foi Física I. Então eu acho que eu já superei esse trauma, mas foi uma grande dificuldade entender o que era meu processo de aprendizagem, porque eu não tava aprendendo, e porque eu não conseguia mostrar o que eu estava aprendendo na época. Durante o mestrado e doutorado, acho que, relacionando tanto as barreiras internas e externas, no mestrado eu acho que eu fiquei, por muito tempo eu achei que eu tinha que olhar só para a minha pesquisa, e aí eu não avançava, muitas vezes, e eu ficava muito triste, muito decepcionada com isso.

Eu acho que se eu fosse dar uma sugestão para as pessoas hoje, e eu geralmente dou essa sugestão para as pessoas, é: diversifiquem suas atividades, façam coisas que deixam vocês felizes. Acho que é importante a gente destacar isso na ciência, na construção, na formação do pesquisador enquanto um pesquisador, de que é importante ele exercer várias áreas da vida dele. Vida pessoal, social, o bem-estar, com o corpo, com a saúde, com a mente, com todas essas áreas. Eu só fui entender isso no finalzinho do meu doutorado.

Então foram anos, anos, até conseguir entender isso. E não porque eu não tivesse pessoas ao meu redor que me servissem de, talvez, exemplo, mas porque essas barreiras internas de que a gente às vezes acha, principalmente as mulheres, que a gente se dedica e nunca é o bastante, nunca é o suficiente, acho que foram minhas principais barreiras e desafios que eu tive que enfrentar. Meu supervisor, meu orientador de mestrado e doutorado, nessa trajetória de formação de pesquisa, ele sempre me deu um suporte imenso. É o professor doutor José Francisco Custódio, do Departamento de Física. Ele sempre me deu muitos conselhos, me alertou para muitas coisas, me guiou nesse caminho. Até hoje eu respeito muito ele, e trabalho com ele, é meu colega, e a opinião dele para mim é muito valiosa em todas as áreas da minha vida. E também meus pais, minha família me deu um suporte imenso. Eles sempre compreenderam qual é a importância da formação, do estudo, da educação, e como isso podia transformar nossa vida, a vida da nossa família, e eles sempre apostaram nisso, desde o início. Então, esse suporte externo me permitiu que eu encarasse os desafios internos, superasse parte deles e conseguisse avançar.

Como era o cenário quando você decidiu ir para essa área das exatas? Tinham outras mulheres que eram referência para você?

Quando eu decidi entrar para a área das exatas, eu, na verdade, tinha o desejo de ser professora de Biologia, fiz o vestibular, não passei. Foi a primeira tentativa na UFSC, não passei. Passei em segundo lugar, se eu não me engano, na universidade particular, na Univille, mas não tinha condições de fazer o curso, meus pais não tinham condições de sustentar e pagar faculdade, tudo mais, a gente estava passando por uma situação muito difícil. Então, comecei a trabalhar e fazer cursinho para tentar de novo a UFSC. Chegou a metade do ano, não estava muito afim de continuar o cursinho, estava bem desanimada, e resolvi fazer o vestibular de licenciatura em Física da Udesc, o vestibular de inverno, metade do ano, e passei e comecei a fazer. Estudava para o cursinho, para tentar passar em Biologia, mas estava lá na Física, estudando e tal, vi que era um curso muito puxado, então eu tive que tomar a decisão de ficar na Física. Como eu disse, Física não era minha primeira opção, eu nem era, nem me sentia, assim, boa em Física, mas eu queria muito ser professora, e para isso eu tinha que fazer uma licenciatura numa universidade pública, né? Então eu não tive nenhuma grande referência de mulher cientista, infelizmente não tinha muito acesso a isso. Eu não lembro, de fato, assim, de uma referência quando eu era adolescente, sabe? Não lembro mesmo. Às vezes até penso que eu queria ter esse poder de voltar, assim, nesse dia, em algum dia que eu realmente tenha conhecido alguém que tenha me inspirado. E eu acho que vendo hoje as minhas alunas e as minhas orientandas, como elas elas se inspiram quando elas vêem alguém conquistando algo, uma história de uma cientista e tudo mais, eu vejo o quão felizes elas ficam, e quão motivadas elas ficam, e eu queria sentir essa mesma coisa lá atrás. Mas enfim, né, passado. Acho que eu não tive, mas acho que a minha referência foram professoras que me motivaram a querer ser professora, né? No geral, professoras mulheres que foram ótimas e que, não exatamente nas ciências, ou Matemática, ou exatas, mas professoras. Então, aí estou.

Você é uma professora jovem e já se tornou uma grande referência na inserção de meninas na ciência. Por que e como você se aproximou dessa questão? O que motivou a criação de um projeto como o Meninas na Ciência?

Eu sempre penso muito sobre isso. Eu sempre fui a estudante na escola que levantava a mão e que queria responder todas as perguntas da professora ou do professor. E eu lembro de uma cena que a professora de Ciências, ela era muito rígida, muito, muito rígida, e ela fez algumas questões e tal, e ela tinha levado uma caixa de chocolate Bis para a gente, para que quem acertasse a questão fosse recompensado. E como eu sempre levantava a mão e respondia, pensei: “Ué, chegou minha hora de brilhar. Vou responder essas questões e vou ganhar Bis.” Então eu lembro de eu levantando o dedo, e ela não me chamando, porque ela sabia que eu ia responder correto, eu imagino hoje, né? E na época também imaginava isso, eu acho. E ela não me deu oportunidade de responder nenhuma questão naquela aula, e isso ficou marcado para mim de um tanto. Eu sempre fui uma muito estudiosa na escola, muito, muito, muito. Eu me cobrava para isso, eu me cobrava porque eu queria ser a melhor estudante e tudo mais. E isso me fez alcançar lugares e espaços importantes, porque se não fosse minha dedicação, o meu compromisso, comprometimento desde criança, e eu já sabia desde criança que eu queria ser professora de Ciências, eu não teria, talvez, alcançado alguns lugares. Não todos, mas alguns, ou teria sido outra história, né?

Na graduação era a única menina, lá na terceira, quarta fase, já era a única menina da turma. Então eu comecei a pensar: mas por quê? Por que eu sou a única? Por que eu senti isso quando era criança? O que me fazia ficar tão preocupada em responder correto? Eu só competia na escola no tema de Ciências, eu lembro que meus principais adversários eram os meninos. Então, por que eu sempre tenho que competir com esses homens?

Então, isso são coisas que, em algum momento, não sei dizer exatamente quando, mas em algum momento me despertou que, bom, se eu sei que o caminho tem alguns obstáculos para questão das meninas, para as meninas na Ciência, para o interesse delas e tudo mais, por que eu não ajudo elas? Eu superei várias coisas, eu conheço alguns caminhos, por que eu não posso oferecer uma orientação, uma mentoria para elas também?

Gabriela participou online da entrega das medalhas do projeto Meninas na Ciência no ano passado (Foto: Natan Balthazar/Apufsc)

Como foi o desenvolvimento do projeto? Como foram os primeiros passos para colocar em prática?

Em 2018, se eu não me engano, eu era professora, concursada também, na UFPR [Universidade Federal do Paraná] e tinha um grupo de mulheres com quem eu trabalhava, muito envolvido com vários projetos de extensão. E a gente propôs um projeto que chamava As Sensacionais, a gente até submeteu a edital do CNPq e tal, mas logo depois eu passei no concurso da UFSC e voltei para Santa Catarina. Então, no meu retorno para cá, eu pensei: eu tenho que ter um projeto, porque eu comecei nesse grupo lá no Paraná, já estava motivada com isso, eu não posso deixar essa ideia morrer, né? Então eu comecei a orientar, propus esse projeto, comecei a aprender como é que faz esse tipo de atividade na prática. Eu acho que uma coisa importante de dizer é que, no início, eu não não tinha ideia do que eu podia fazer e onde eu podia chegar. Eu propus o projeto, imaginei várias atividades presenciais. Em 2020 começou a pandemia, nada podia ser feito presencial, tive que adaptar todas as ideias para o Instagram, nem sei se eu tinha Instagram, acho que eu tinha mas não era ativa em rede social. Então eu tive que aprender tudo isso e entender como é que poderia ser um projeto como esse. Não só eu, né? Mas a gente consegue olhar para o grande número de projetos de meninas e mulheres na ciência que existem hoje, e como esses projetos todos, grande parte deles, tiveram uma trajetória parecida. Os que surgiram antes de 2020 tiveram que se adaptar. Muitos surgiram durante os anos de 2020 e 2021, então tem exemplos de projetos no Brasil inteiro, bem fortalecidos na questão das meninas na ciência, mostrando o quão importante é.

Como as atividades são pensadas e elaboradas?

Depende muito das demandas, né? Com o passar dos anos, a gente conseguiu aprender, perceber quais eram as atividades que tinham maior impacto, maior procura, e que valia a pena a gente dedicar nossos esforços e nosso tempo. O projeto Meninas na Ciência é um projeto de extensão que também tem se tornado um projeto de pesquisa. E hoje, basicamente, a gente oferece algumas atividades de palestras, minicursos, oficinas para as escolas. Essas oficinas sempre são sob demanda, a gente não vai até a escola oferecer, porque a gente já fez isso e a tarefa, a atividade de divulgação nas escolas é muito trabalhosa. A gente geralmente tem uma bolsista, e eu, e voluntárias, né? Mas assim, ir nas escolas é passar semanas indo nas salas, nas turmas, fazendo a divulgação. E como o projeto já tem alguma visibilidade, a gente tem mais procura recentemente, né? Então, tenho parceria, por exemplo, com o curso de Pedagogia da Udesc. Todo semestre eu dou uma aula aberta, sou convidada para dar uma aula aberta. Aí as alunas da Pedagogia, sabendo do projeto, acabam entrando em contato nos semestres seguintes para gente fazer alguma oficina e tal. A gente já fez parceria com o curso de Pedagogia da UFSC, também. Estudantes estagiárias da UFSC da Pedagogia solicitaram que a gente contribuísse com um minicurso sobre uma oficina de telescópios para estudantes, em que elas estavam fazendo estágio, por exemplo, com o tema Explorando o Universo. Também palestras para os cursos de graduação, geralmente licenciaturas, como na Matemática e na Física. Isso são as atividades mais formativas. Aí as atividades para as estudantes consistem em alguns programas. No Caça Asteroides, a gente já fez dois anos com ótimos resultados. Esse ano a gente vai ter que fazer uma organização diferente, porque tem um alto número de participantes se inscrevendo. Essa é uma atividade, assim, fundamental. Outra atividade que a gente está prometendo, planejando, para esse ano, são as oficinas de jogos para professores e estudantes. Essa oferta não é uma demanda, mas parte de um recurso que a gente recebeu, que a gente tem direito a gastar dentro do edital da Proex PPG, no PPG com as escolas. Então a gente está produzindo material, mandando imprimir, e esse material vai compor os kits de jogos que a gente vai levar até as escolas. O Meninas na Ciência também está participando de dois projetos que a gente submeteu ao edital do CNPq Meninas e Mulheres na Ciência, e a gente foi contemplada. Um, que é o principal que o Meninas na Ciência participa, é o Elas Protagonistas da UFSC, em que a gente vai dar minipalestras online. E a produção de material didático ou extra didático, né? Como por exemplo, a produção do livro no passado, que a Apufsc apoiou o lançamento.

Lançamento do livro “Minas brilhantes: a história de Estrela”, na sede da Apufsc (Foto: Stefani Ceolla/Apufsc)

Esse ano a gente está escrevendo outra história, e a ideia, a intenção, é que seja transformado em um livro. Então, as atividades do Meninas na Ciência envolvem esses treinamentos, práticas científicas, visitas às escolas, curso de formação para professores e, enfim, atividades para as meninas, estudantes e para professores ou futuros professores. Então, não é nada estático. Tudo vai depender da demanda.
Esse ano a gente também está prevendo uma masterclass de Física de Partículas. Professora Tatiana da Silva está na coordenação junto comigo, do Departamento de Física. As atividades estão em constante mudança, mas a gente está dando preferência, priorizando, as atividades que já têm algum sucesso, como Caça Asteroides, a divulgação das atividades nas redes, as visitas e palestras e, claro, tudo depende de quanto que a equipe tem de recurso intelectual e de tempo para investir, né? Porque a gente tem essa questão também: para começar a aprender uma coisa nova, para aplicar no projeto Meninas na Ciência, a gente precisaria de mais de 20, 30 horas por semana. E eu acho que é isso que torna tão bonito o projeto, que a gente consegue ir se adaptando ao que está acontecendo.

Qual o impacto que você consegue enxergar do projeto na formação dessas meninas?

Eu não tenho uma ferramenta para avaliar isso. É tão orgânico que não é algo que está no meu horizonte parar e avaliar, entende? Até porque, se eu pudesse, se eu tivesse só desenvolvendo o Meninas na Ciência, coordenando o Meninas na Ciência e não tivesse mais nenhuma outra atividade, com certeza eu ia me dedicar a elaborar ou pensar em instrumentos de avaliação para esse tipo de atividade. Mas, por enquanto, eu gosto mais da ideia de que está dando certo.

A gente tem muitos relatos de meninas que dizem: “nossa, o projeto me ajudou muito, me ajudou a encontrar meu lugar no mundo, a entender quem eu sou”, coisas que a gente não tem nem condições de avaliar, não é o objetivo, não está lá na lista de objetivos do projeto, mas que para mim, enquanto ser humano, é algo que vai muito além, que eu não posso nem mensurar.

Porque não é meu objetivo dizer isso, mas eu sinto que tem impactado. Relatos que eu posso compartilhar: as estudantes da graduação, por exemplo, que trabalham ou trabalharam como bolsistas ou voluntárias do projeto, algumas delas já estão no mestrado, e o relato delas, de algumas delas, pelo menos, assim, das cinco, seis bolsistas que a gente já teve, e voluntárias, voluntárias ativas, mais umas seis, sete voluntárias ativas, dessas 12 meninas, umas oito falaram, compartilharam que elas não desistiram do curso por conta do Meninas na Ciência. Ou, que o Meninas na Ciência trouxe para elas algo que o curso de Física em nenhum momento conseguiu trazer, que era esse lugar, esse espaço, se sentir bem, de compartilhar coisas, podir falar, se abrir, ter um objetivo em comum. Então, isso elas mesmas podem repetir para vocês. A gente já deu entrevista e elas já falaram isso, entrevistas para as mídias da cidade, então, acho que isso é um impacto bacana que eu posso compartilhar com relação à formação das estudantes de graduação e de mestrado que participam do projeto, futuras professoras ou professoras. Com relação às meninas que participam das atividades, não da equipe, mas das atividades, a gente tem conseguido mostrar para elas que é possível elas participarem de atividades científicas e serem reconhecidas. Aprender, entender parte da ciência ou parte de como a ciência é feita, e também receber reconhecimento. Ano passado a gente teve 20 medalistas, a gente teve um alto número de inscritas, formamos 11 equipes que participaram de 16 campanhas. Dessas 11 equipes, em 16 campanhas, quatro equipes encontraram asteroides, detectaram candidatos a asteroides e então foram premiadas. Então veja, né, os pais recebendo essa notícia que suas filhas são medalhistas do Ministério da Ciência e Tecnologia, é algo realmente incrível. E, inclusive, tem um efeito na sequência. Algumas estudantes de uma escola social da cidade que participaram do projeto também foram contempladas com uma viagem de estudos para a Nasa no ano de 2026. Então elas estão em processo de preparação, aprender inglês, fazer o visto. Coisa que foi uma repercussão. Não é o projeto que vai levar elas, não é o MCTI, não. É a escola em que elas estudam, uma escola privada, mas que tem essa essa unidade social. A escola vai oferecer essa oportunidade para elas e é um reflexo também do projeto Meninas na Ciência. Não é um resultado, mas é um reflexo, né? Então eu posso dizer que há um impacto, não sei medir, dizer, mas há impacto. A gente também tem muita procura na Sepex. Ano passado a gente teve lista de presença, chegou a 300 nomes. Isso deixa a gente bem feliz.

Como vê o cenário atual das mulheres na ciência, até em comparação ao momento em que você entrou para a vida acadêmica? E como você enxerga os caminhos futuros dessa presença?

Eu gosto de ter uma visão otimista sobre o que a gente está construindo, sobre os caminhos que a gente está trilhando e os objetivos que tem alcançado, tanto no projeto que eu coordeno, quanto em outros projetos, de outras instituições, não só no Brasil, mas ao redor do mundo. Então, acho que muita coisa mudou, a gente está construindo na sociedade uma compreensão de que sim, as mulheres podem conquistar os espaços de ciência, elas podem estar presentes. É aceitável e natural que estejam, que tenham esse interesse.

Acho que a gente está construindo, colaborando, para a construção de crenças mais otimistas e positivas sobre a presença das mulheres em vários espaços, inclusive os de ciência. E espaços que não são só o espaço privado da casa, né? Como, muito antigamente, a gente guardava essa crença, né? Mas sim espaços que são públicos também. E a ciência é um desses espaços.

No entanto, eu também sou realista, e quando a gente olha para os números, pensando em números de pesquisas, surveys internacionais, que relatam em que ponto estamos nesse caminho, né, para o objetivo da diversidade, equidade, igualdade, inclusão, a gente ainda está muito longe, muito, de conquistar essa plena igualdade ou equidade. Então, acho que a importância desse tipo de projeto é justamente essa, porque a gente não pode baixar a guarda, né? A gente não pode simplesmente aceitar que ah, agora temos, por exemplo, não sei, aumentamos em x% o a presença de mulheres na ciência, “ah, tá bom.” Não, não tá. Não tá, porque a gente sabe que nossos direitos, os direitos das mulheres, ou das populações sub-representadas, ou das minorias sub-representadas em vários espaços, seja na política, na economia, na educação, nas áreas de ciência, eles estão sempre ameaçados. A gente luta pelos direitos porque eles nunca estão garantidos, né?

Pensando nisso, qual a importância da existência de uma data como essa?

Eu vejo projetos como o Meninas na Ciência como de extrema importância, assim como a data de hoje, o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência, completando agora dez anos. São super importantes para que a gente tenha isso em mente, a educação de qualidade, a igualdade de gênero, enfrentar disparidades, desigualdades, reduzir essas desigualdades, é sempre um objetivo que a gente tem que ter no nosso horizonte. Então essa data é importante, projetos como o Meninas na Ciência são importantes. Temos vários exemplos, na história, de que vieram outras mulheres antes da gente, né? Elas também tiveram que lutar muito, tiveram que ser resilientes para conquistar seus espaços e tudo mais, e a gente está fazendo a nossa parte.

::: “A História de Estrela” está disponível para compra no site da Editora Inverso. Confira mais informações no no Instagram do projeto Meninas na Ciência

Laura Miranda
Imprensa Apufsc