Academia Brasileira de Ciências propõe novo plano nacional de combate de lixo ao mar

Relatório propõe criação de política de promoção do uso consciente e tecnologia para minimizar o descarte inadequado

A geração de microplásticos, minúsculos fragmentos de plástico que contaminam o meio ambiente, especialmente rios e oceanos, tem se tornado um problema crescente no Brasil e no mundo. Para alertar sobre os riscos desse avanço e propor soluções, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) lançou nesta quinta-feira, dia 7, o relatório “Microplásticos: Um problema complexo e urgente”. O evento de lançamento do relatório pode ser assistido neste link. E o documento completo pode ser baixado aqui.

Elaborado por um grupo de dez pesquisadores de diferentes instituições, entre membros da ABC e convidados, o documento traz um panorama do problema gerado pelo descarte inadequado desse material e recomendações para diminuir o impacto no país.

“Enfrentar a poluição por microplásticos exige uma ação coordenada entre governo, setor produtivo, comunidade científica e sociedade. Precisamos rever estratégias nacionais e investir em educação, inovação e regulação para proteger a saúde humana e os ecossistemas”, afirma a presidente da ABC, Helena Nader.

Estimativas apontam que o Brasil contribui com até 190 mil toneladas do volume total de lixo no ambiente marinho. Estudos recentes calculam que o potencial de perda de itens plásticos para o ambiente no Brasil é de 3,44 milhões de toneladas por ano.

Material cada vez mais presente no cotidiano, o plástico traz benefícios por ser leve, durável e de baixo custo. No entanto, a abundância desse material, somada à falta de incentivo à reciclagem, acaba trazendo problemas, caso do descarte inadequado. A prática tem gerado os microplásticos, partículas de até 5 milímetros provenientes da degradação e fragmentação dos produtos plásticos, e que acabam chegando aos rios e oceanos.

Segundo dados apresentados no relatório, 80% dos resíduos plásticos que chegam ao mar e que podem se transformar em microplásticos provêm de atividades realizadas em terra, como turismo, indústria, ocupação urbana desordenada e má gestão de resíduos sólidos, permeadas por padrões insustentáveis de produção e consumo. Os outros 20% seriam originados em atividades realizadas no mar, como o transporte marítimo e a pesca.

Uma vez no oceano, os resíduos sofrem dispersão por meio de marés, correntes e ventos, gerando diversos impactos ambientais, sociais e econômicos e sendo ingeridos por animais marinhos e outros seres vivos da cadeia alimentar marítima.

Além dos impactos ao meio ambiente, estudos mostram que microplásticos já são encontrados em diferentes órgãos do corpo humano, o que pode representar sérios riscos à saúde. Recentemente, novos estudos apontaram a presença de microplásticos em placentas e cordões umbilicais de gestantes. Eles também aumentam a exposição a componentes químicos perigosos, como metais pesados, pesticidas e microrganismos.

Com o lançamento do relatório, a ABC espera ampliar a conscientização sobre o tema e apoiar formuladores de políticas públicas com informações científicas atualizadas, definições e recomendações para enfrentar os riscos da contaminação por microplásticos.

“A contaminação por microplásticos não é um problema apenas ambiental, é uma ameaça direta à saúde humana, à segurança alimentar e à economia. O relatório propõe um conjunto robusto de ações concretas, que exigem a atuação coordenada entre governo, setor produtivo e sociedade. Não podemos mais tratar os plásticos como descartáveis. É hora de assumir a responsabilidade pelo ciclo completo desses materiais, desde a produção até o descarte e a reciclagem”, afirma Adalberto Luis Val, vice-presidente da ABC para a Região Norte e coordenador do grupo de trabalho sobre microplásticos.

O documento debate caminhos que podem ser adotados para reduzir o impacto da poluição por esse material. As propostas são divididas em seis eixos, dentre elas:

  • Governança: revisão do Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar, lançado em 2019, com reforço no combate aos microplásticos; fortalecer a discussão e implementação do Tratado sobre a Poluição Ambiental por Plásticos;
  • Ciência, tecnologia e inovação: maior investimento para inovação da reciclagem no país; reuso inteligente dos produtos plásticos; substituição de polímeros sintéticos por polímeros biodegradáveis em produtos descartáveis;
  • Fomento e financiamento: criar mecanismos de avaliação de riscos de saúde e demais ações para mitigar os efeitos da poluição plástica, como usar nanotecnologia para impulsionar o reaproveitamento do material;
  • Capacitação: capacitar catadores, ajudando na qualificação da mão de obra e formalização do trabalho, e professores em escolas de nível fundamental e médio;
  • Circularidade dos plásticos: buscar mudanças na legislação para tratar do descarte apropriado e recolhimento de materiais plásticos separadamente e retirada maciça dos plásticos dos ambientes terrestres e marinhos;
  • Educação ambiental e comunicação: criar uma política governamental para estimular a educação ambiental, especialmente para trabalhadores das fábricas, empresários e o agronegócio, minimizando descarte inadequado; criar campanha sobre descarte e reciclagem de plásticos.

Além de Adalberto Val, participaram do relatório os pesquisadores Mário Barletta (UFPE), Maria Inês Tavares (UFRJ), Alexander Turra (USP), Maria Martha Bernardi (UNIP), Alexandre Borbely (UFAL), Daniela Melo e Silva (UFG), Denis Abessa (UNESP), Miriam Cristina Moravia (UFMG) e Paulo dos Santos Pompeu (UFLA).

Fonte: Jornal da Ciência