Sancionada em 2024, a Lei 14.874 dispõe sobre a pesquisa com seres humanos e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos
A regulamentação da Lei de Pesquisa Clínica deve ser publicada até setembro, segundo o Ministério da Saúde. O processo é aguardado pelo setor produtivo e pela comunidade científica e deve promover alterações na adoção da classificação de risco para análise de pedidos na atuação da Instância Nacional de Ética em Pesquisa e no funcionamento do sistema de registros. Quem explica é a professora Rossana Francisco, do Departamento de Obstetrícia e coordenadora do Escritório de Pesquisa Clínica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Do que se trata?
A Lei 14.874, sancionada em 2024, dispõe sobre a pesquisa com seres humanos e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos. Ela institui o Marco Regulatório da Pesquisa Clínica no Brasil, estabelecendo normas para a realização de estudos com medicamentos, vacinas, dispositivos médicos e outros produtos para a saúde. O texto define diretrizes para as etapas desses estudos, desde a submissão e análise dos protocolos até a condução, acompanhamento e encerramento das pesquisas, com o objetivo de garantir a proteção dos voluntários e a integridade científica dos dados obtidos. Além de reforçar a obrigatoriedade de avaliação ética e científica rigorosa, a lei prevê mecanismos para acelerar a aprovação de estudos sem comprometer a segurança dos participantes.
Ela determina a criação de um sistema de classificação de risco, o credenciamento de comitês de ética conforme sua capacidade técnica e a obrigação de manter o fornecimento de medicamentos experimentais a voluntários beneficiados, mesmo após o fim do estudo. Dessa forma, a legislação pretende equilibrar proteção e eficiência, estimulando a participação do Brasil em pesquisas de ponta e ampliando o acesso da população a novas terapias e tecnologias de saúde. A regulamentação viabiliza que esses fundamentos sejam colocados em prática: “Todos aguardavam a regulamentação, a gente ainda vai passar um tempo de transição, mas acredito que vai trazer grandes avanços para o nosso país”, afirma a professora.
Os avanços
A lei trará maior agilidade para tratamentos clínicos de pacientes que estão testando medicamentos em fase de desenvolvimento, porém, sem comprometer a segurança do indivíduo. “Vamos pensar um medicamento que comprovadamente traga um benefício para um paciente, mas é um medicamento que ainda está na fase 3 de desenvolvimento. Antes, a pesquisa acabava e não havia uma certeza por quanto tempo esse patrocinador, essa indústria farmacêutica deveria fornecer esse medicamento para o participante da pesquisa. Então acabava a pesquisa, mesmo que tivesse sido benéfico, poderia ser que esse voluntário não recebesse mais essa medicação”, explica Rossana.
Além disso, a maior agilidade nos tratamentos, pela diminuição de prazos de aprovação, fará com que o Brasil participe mais desses estudos de desenvolvimento de novos medicamentos. Em muitas situações, o País era deixado de fora dessas pesquisas devido à demora das aprovações nas instâncias éticas, o que prejudicava diretamente a população, pela limitação e demora no acesso aos remédios.
As pesquisas, ao serem feitas, são obrigadas a passar pelo Comitê de Ética em Pesquisa e depois pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). “Agora, nessa instância nacional, a Conep deixa de existir. Muitas vezes era aprovado no Comitê de Ética, já estava tudo certo, mas o tempo de tramitação para ir até o Conep, ser avaliado novamente, passar numa reunião do Conep e retornar com a aprovação, às vezes uma aprovação sem nenhuma mudança, ou seja, demorava muito para que a gente conseguisse avançar nesses estudos’.’
A lei estabelece comitês de ética em pesquisa credenciados que possam avaliar as pesquisas com risco menor, e outros comitês que possam avaliar as pesquisas de risco baixo, médio e alto risco. Esses comitês de ética geralmente são locais, e mais estruturados, com uma experiência maior, assim aumentando a velocidade sem diminuir a qualidade.
Existem riscos?
O aumento da agilidade, contudo, não compromete a segurança dos pacientes, por outro lado, aumenta. “Trazer essa possibilidade da utilização do medicamento por até cinco anos, após o término do estudo, é muito importante. Porque não é justo um voluntário participar de uma pesquisa, ter um ganho na sua saúde com aquele medicamento novo, e na hora que acaba o estudo ter que voltar para o medicamento anterior. Então traz mais justiça e possibilidades para as pessoas também”, finaliza a professora.
Fonte: Jornal da USP
