Previdência Complementar preocupa servidores

Os servidores públicos federais estão intensificando a campanha contra a aprova­ção do Projeto de Lei 1992/07, que institui o regime de previdência complementar no serviço público e cria a Fundação de Previ­dência Complementar do Serviço Público (Funpresp). Em carta enviada aos parla­mentares, assinada por 59 entidades, no inicio do mês de maio, os autores afirmam que a aprovação do projeto significa “fragi­lizar o serviço público e suas carreiras, além de sobrepor o interesse privado (financeiro) ao interesse do Estado e da sociedade”. A matéria encontra-se na Comissão de Traba­lho, Administração e Serviços Públicos da Câmara dos Deputados, onde chegou a ser colocada na pauta de votação do dia cinco de maio, mas foi retirada devido a pressão dos servidores.

O PL foi apresentado em 2007 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a justificativa de que o regime de previdência dos servidores federais é responsável por um déficit orçamentário de R$ 52 bilhões. O PL prevê que o futuro servidor público seja tratado como um trabalhador da ini­ciativa privada, que é regido pela CLT. Ele vai se aposentar com o teto do INSS e o Funpresp será o responsável pela formação dessa poupança. De acordo como secretá­rio de previdência complementar do Mi­nistério da Previdência Social, Jaime Mariz, o novo regime fará com que o empregado e o empregador contribuam. “Essas duas contribuições vão formar essa poupança que será responsável pelo pagamento das pensões e aposentadorias. Caso o servidor queira receber um pouco mais, ele contri­bui um pouco mais. Dessa forma, poderá não só garantir a equivalência salarial da ativa como uma aposentadoria maior, desde que forme uma poupança suficiente para tal”, justifica Mariz.

Pelo projeto original, somente quem ingressar no serviço público depois da aprovação da lei vai se enquadrar no novo modelo e receberá por duas fontes: a apo­sentadoria básica, paga pela União e limi­tada ao teto do regime geral de previdência social, hoje em R$ 3.689,66, e a comple­mentar, a cargo de uma entidade fechada de previdência. Os servidores enquadrados no novo esquema deverão pagar uma alíquota de 11% sobre o teto do regime geral e 7,5% sobre a parcela que exceder esse limite. A União também deverá contribuir com 7,5% para a entidade fechada. A proposta faculta a adesão dos atuais servidores à previdência complementar.

Na carta encaminhada aos parlamen­tares, os servidores afirmam que a Cons­tituição de 1988 foi originalmente escrita segundo um modelo em que o servidor público deve servir e proteger o Estado. “Por assim ser, delegados, policiais, procuradores, promotores, magis­trados, auditores, advogados públicos, médicos, professores, dentre outros servi­dores, não podem deixar de cumprir suas atribuições públicas por qualquer razão, nem mesmo pelo risco que representam às suas vidas e de seus familiares, sob pena de responderem administrativa e criminalmente.

Em contrapartida, a Constituição as­segura um regime especial aos servidores públicos civis e membros de Poder, de caráter administrativo, o qual, de um lado, garante estabilidade e aposentadoria com proventos integrais, mas de outro esses servidores contribuem para a previdência pública sobre a totalidade de suas remune­rações, sujeitam-se ao “teto” remuneratório constitucional, não têm direito a Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), participação nos resultados da organização, dentre outros direitos assegurados apenas aos trabalhadores da iniciativa privada. Para equiparar os dois grupos no plano previdenciário – servidores públicos civis/ membros de poder e trabalhadores do setor privado – o Governo alega a existência de um deficit da ordem de R$ 52,7 bilhões, sem explicitar a origem desse número, o que é bastante questionável”.

Para o presidente do Proifes, Gil Vicente, o projeto, da forma em que está, prejudica fortemente os servidores e, em conseqüên­cia, fragiliza os correspondentes serviços prestados à população, ameaçando direitos e podendo levar ao sucateamento da ad­ministração pública, ao abrir espaço para a privatização do regime de previdência própria dos servidores com a transferên­cia para o mercado financeiro – e sob seu controle – dos recursos provenientes dos descontos dos contracheques dos servido­res, não sendo razoável, por essas razões, que um projeto dessa magnitude e impacto seja votado sem prévia e ampla discussão junto à sociedade civil que, assim como os servidores, será severamente afetada.

Em Nota Técnica, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), afirma que há diversas la­cunas e questionamentos de ordem legal envolvendo o PL, “os quais geram dúvidas e insegurança aos serviços públicos”.

De acordo com o texto, a matéria apre­senta incompatibilidade entre as motivações que levaram o Poder Executivo a apresentá­-lo e o verdadeiro impacto econômico e s o c i a l decor rente da institui­ção da Fun­presp.

“Em termos econômicos e financeiros não haverá redução de despesas para o governo a curto e médio prazo. Primeira­mente porque a União poderá aportar até R$ 50 milhões a título de adiantamento de contribuições futuras, necessário ao regular o funcionamento inicial da Entidade. Em segundo lugar, porque a União deixaria de contar com a contribuição do servidor no valor que excedesse ao teto do INSS e teria, obrigatoriamente, aportar recursos equivalentes”, esclarece a nota.

De acordo com o Sindifisco, os títulos da dívida pública são negociados no mer­cado financeiro. Os recursos garantidores da Funpresp também serão aplicados no mercado financeiro, mais especificamente em fundos de investimento contratados por meio de licitações, de acordo com o parágrafo 1º do artigo 15 do PL. Assim, recursos públicos e dos servidores públicos serão direcionados para estes fundos de investimento, controlados por instituições do mercado financeiro, que investirão nos papéis seguros emitidos pelo próprio governo, os títulos da dívida pública. Recursos públicos e de servidores serão reemprestados ao próprio governo, o qual pagará juros altos por isso.

Esta terceirização da gestão do Fundo, argumenta o Sindifisco, afronta o princípio constitucional da eficiência, previsto na CF, preconizador da busca pela melhor atuação do agente público e da melhor organização da Administração Pública. “Repassar a ter­ceiros a gestão da entidade é incompatível com os princípios que norteiam o funcio­namento das atividades administrativas do Estado”, destaca a nota.

“O PL também é permeado por lacunas que maculam por completo sua viabilidade jurídica como, por exemplo, a inobser­vância da obrigatoriedade de criação da previdência complementar dos servidores públicos exclusivamente por intermédio de Lei Complementar e a alteração da natureza jurídica estipulada pela CF para a Funpresp”, finaliza o texto.