Sociólogos apontam retrocessos nas políticas educacionais e científicas

Sociólogos avaliaram a conjuntura sócio-política do Brasil e observam que as propostas de redução de gastos sociais, principalmente em áreas como saúde e educação, além da ciência, representam ameaças ao modelo social inclusivo iniciado nos últimos anos no Brasil, sobretudo na área de educação. A avaliação é fruto de debate realizado nesta segunda-feira, 04, no primeiro dia da 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Porto Seguro (BA). 

O debate teve a participação dos palestrantes José Vicente Tavares dos Santos, diretor do Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados (Ilea) e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)d+ e Adalberto Cardoso, diretor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

De acordo com Santos, uma das ameaças “à agenda social inclusiva” é a proposta de emenda constitucional (PEC)  nº 241/2016, em que limita o crescimento das despesas com educação e saúde à variação da inflação do ano anterior por um período de 20 anos.

Santos também criticou a fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com a pasta das Comunicações. Para ele, esse é um sinal de desprestígio à agenda de ciência, tecnologia e inovação do País. “Isso pode refletir no desmonte desse sistema”, disse. Com essa medida, ele alerta que o Brasil deve ficar sempre dependente de produtos americanos, europeus e até mesmo chineses. Ele acredita que os impactos do encolhimento dos gastos serão sentidos em médio e longo prazos.

O diretor do Ilea destacou que nos últimos 15 anos o número de matrículas de alunos universitários saltou de 2 milhões para 7,5 milhões, enquanto que o número de universidades federais atingiu 100 unidades,  diante de políticas adotadas – ainda que alguns setores questionem  tanto a qualidade da educação como a expansão do setor privado na área educacional.

No entendimento de Santos, o aumento de matrículas no ensino superior, igualmente os investimentos em educação e na produção científica aconteceu, exatamente, no período em que houve “a ideia de modelo de sociedade inclusivo”. 

Impactos negativos em longo prazo

 

O diretor do Ilea alerta, ainda, que os sinais de encolhimento da produção de cientistas, de pesquisadores e de professores deve se refletir daqui a dez anos. “Quem vai entrar no mercado, agora são os que já foram formados. As universidades federais nos últimos seis anos recrutaram 30% de jovens de 30 a 40 anos, doutores nacionais”, disse e questionou: “Se bloquear a produção de mestres e doutores, daqui a 10 anos quem assumirá isso?”. 

O dirigente do Ilea aponta riscos para volta do que chamou de modelo colonial na ciência e a cultura. Tal cenário, segundo observa, vem sendo adotado em vários países da América Latina, “onde esse modelo de desenvolvimento inclusivo fica abalado”. “É como se todo projeto de sociedade em que o Estado intervém e redistribui recursos culturais, materiais ou de renda, estivesse ameaçado”, analisou.

Para ele, enquanto se encerra um modelo de sociedade includente, já está se delineando e se fortalecendo na América Latina outro ciclo o que chamou “de conservadorismo social e neoliberal economicamente”.

Com posicionamento semelhante, o diretor do Iesp, Abalberto Cardoso, discorreu, resumidamente, sobre os pontos políticos que contribuíram para tal cenário e disse que “o pouco que foi feito”, até agora, em termos de políticas sociais está ameaçado por “uma política de exclusão”, com impactos na educação, em direitos humanos e em setores minoritários. 

O sociólogo da UFRJ, que também é conselheiro da SBPC, observa ainda retrocessos nos direitos trabalhistas, diante de corte de orçamento da Justiça do Trabalho, cenário que, segundo avalia, representa regressão social, retrocedendo à década de 1930.

Fonte: Jornal da Ciência