Conselheiros da Capes denunciam ataque à pós-graduação pública dentro da própria Capes

Segundo conselheiros, houve pressão de “nomes do governo” para flexibilização dos critérios de avaliação dos programas de pós-graduação para favorecer a iniciativa privada

 

Reportagem da Adufrj, associação dos docentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, publicada no último sábado (29) denuncia o ataque à pós-graduação pública  relatado por conselheiros  da Capes.  As pessoas ouvidas pela Adufrj  participaram da última reunião do Conselho Superior da Capes, em  Brasília, no dia 19 de junho.

Na reunião, representantes do MEC deixaram clara a aproximação com integrantes da  iniciativa privada, que tiveram espaço para defender suas prioridades.  Mais de um dos conselheiros ouvidos relataram que houve uma pressão para que os critérios de avaliação dos programas de pós-graduação fossem flexibilizados.  O objetivo seria favorecer o recebimento de mais bolsas de apoio à pós-graduação pelas instituições privadas de ensino.

A pauta original da reunião, que era a apreciação de recursos para a abertura de novos programas, foi completamente ignorada para dar lugar a outras questões. Entre estas, chegou a ser solicitada a aprovação de um curso mesmo sem a comprovação de corpo docente, contou uma das fontes ouvidas. Mas esse pedido acabou sendo retirado da pauta.

“Eles queriam que a Capes aceitasse apenas a promessa de que haveria a contratação de corpo docente”, relatou a fonte. A mesma pessoa relatou que os representantes do MEC falavam abertamente em adotar um sistema no qual os programas de pós-graduação fizessem as suas próprias avaliações.

Ao serem questionados sobre os cortes na Educação, os representantes do MEC responderam de forma agressiva e repetiram o discurso do governo:  a defesa da aprovação da reforma da previdência, da estabilidade econômica,  e a prioridade da educação básica em relação ao ensino superior, entre outros argumentos. “Foi uma reunião tensa”, contou à Udufrj  um dos conselheiros, que preferiu não ser identificado.

 

O orçamento minguante da Capes

 

O tom do discurso governamental aumenta o receio da comunidade científica com os rumos da Capes, que sofre com um orçamento decrescente, nos últimos anos. De acordo com o Portal da Transparência, a agência executou R$ 7,65 bilhões em 2015d+ R$ 5,06 bilhões em 2016d+ R$ 3,94 bilhões em 2017d+ e R$ 3,33 bilhões em 2018. A assessoria da Capes divulga números diferentes, mas também em queda, nos dois últimos períodos: R$ 4,68 bilhões em 2017 e R$ 3,83 bilhões ano passado.

Para este ano, o orçamento aprovado é de R$ 4,25 bilhões, mas só foi executado R$ 1,58 bilhão até agora. E já há um contingenciamento anunciado da ordem de R$ 300 milhões. “Bimestralmente, a partir dos Relatórios de Avaliação de Receitas e Despesas, conforme a necessidade, o Governo Federal procede ao contingenciamento ou à liberação de recursos orçamentários”, informou a assessoria da Capes, por e-mail.

Das mais de 98 mil bolsas concedidas no mês de abril à pós-graduação, os dois congelamentos de 2019 atingiram cerca de 6% das cotas da Capes (6.198 bolsas). A assessoria da Capes registrou que, por enquanto, o impacto é zero. “O congelamento refere-se à entrada de novos bolsistas”, registrou a agência de fomenta.

“Temos pontuado o impacto negativo do ajuste para a Educação. Mas o  governo nega que houve cortes”, disse ao telefone a representante da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG), Flávia Calé, que também esteve na reunião do dia 19. Ela avalia que há uma mudança significativa de tom no comando da Capes.

“Estamos acompanhando com cuidado porque o caminho que será tomado pela pós-graduação brasileira não está explícito. O que está claro mesmo é uma pressão maior do setor da Educação privada nos temas e na agenda da Capes”, disse Calé. “Percebemos uma maior participação e atenção à representação do ensino privado. E um avanço da flexibilização para a pós stricto sensu pelo ensino à distância”, exemplificou. “Parece que a Capes aderiu à política do MEC e do governo. A gestão anterior tinha mais cuidado em preservar um projeto de pós”.

Atas restritas

A assessoria da agência de fomento não disponibilizou as atas dos três encontros deste ano, solicitadas pela reportagem da Adufrj. “As atas das reuniões são confeccionadas em até 30 dias após a realização de cada reunião e são submetidas para aprovação do Conselho Superior na reunião subsequente. Somente após a aprovação pelo Conselho Superior é que a ata fica disposição para consulta na sede da Capes, em Brasília”, escreveu a assessoria da Capes.

Confira: Adufrj