MPF se manifesta pela primeira vez sobre escolas militarizadas

Segundo a recomendação do MPF da Bahia, essas escolas não devem mais interferir nos hábitos pessoais dos alunos, como corte de cabelo ou uso de maquiagem

O Ministério Público Federal (MPF) da Bahia  recomendou na última sexta-feira (26) que escolas públicas militarizadas não interfiram mais em coisas como corte de cabelo, cor das unhas e maquiagem dos estudantes ou os impeça de namorar e se manifestar politicamente.  Esta é primeira manifestação do Ministério Público sobre escolas militarizadas e vale apenas para o estado da Bahia, embora passe a ser uma referência nacional.

Desde o ano passado, 63 escolas públicas de 58 cidades baianas foram militarizadas. No país, há 203 escolas chamadas pelo governo federal de cívico-militares, distribuídas em 23 Estados e no Distrito Federal. No total, 192 mil alunos estudam nesse modelo de parceria.

Para o MPF, as interferências nos costumes pessoais resultam de visão “autoritária” e restringem a liberdade de expressão das crianças e adolescentes. “As escolas públicas são para comunidade geral, alunos com diferentes vocações e personalidades, não se pode suprimir as individualidades. Os alunos necessariamente não querem ser militares, podem querer ser artistas, por exemplo”, diz o procurador do MPF da Bahia Gabriel Pimenta.

Os regimentos de algumas escolas proíbem até que os alunos frequentem locais de jogos eletrônicos, usem óculos esportivos e namorem se tiverem usando uniforme. Há também registros de controle das redes sociais dos estudantes e do tipo de publicação que eles levam para a escola.

Segundo a recomendação do MPF, com essas proibições, as escolas violam a Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente e as convenções internacionais que “preveem educação com base no pluralismo, tolerância, direitos humanos, valorização de diversos saberes”. “Desconheço estudos e educadores que achem que penteado e cor de esmalte de um aluno vão interferir na qualidade do ensino”, completa o procurador. A recomendação atinge escolas baianas apenas, mas é importante por ser a primeira manifestação do Ministério Público sobre escolas militarizadas no País.

Os órgãos oficiais têm até 15 dias para informar as medidas adotadas para o cumprimento da recomendação, que foi endereçada para os prefeitos, os diretores de escolas municipais e também ao governador da Bahia, Rui Costa (PT), por causa da participação da PM. Procurado, o governo da Bahia informou que não se manifestaria porque ainda não foi notificado oficialmente. Caso a recomendação não seja cumprida, o modelo pode ser questionado na Justiça, avisa o MPF.

Modelo recente

O modelo de escola militarizada tem crescido no País e faz com que uma escola municipal ou estadual passe a ter administração compartilhada entre a secretaria da educação local e a Polícia Militar. A ideia é semelhante ao que o governo Jair Bolsonaro anunciou este mês como prioridade para o MEC, que pretende investir R$ 40 milhões para implementar 108 escolas do tipo até 2023, com 100 mil alunos.

 

O modelo, contudo, é diferente das escolas do Exército, que são 13 no País, e têm a função de formar quadros militares. As escolas cívico-militares também não são como os colégios da Polícia Militar, que existem em alguns Estados, e são totalmente geridos pela PM.

Como o modelo é recente, não há estudos conclusivos mostrando melhor desempenho dos alunos em escolas que foram militarizadas. Na coletiva de imprensa sobre o programa, o MEC apresentou um slide que dizia que as escolas cívico-militares tinham Ideb – índice de desenvolvimento da educação básica – superior às escolas públicas civis, mas questionado pelo jornal Estadão, não soube explicar como foram calculados os dados.

Em geral, a justificativa da gestão compartilhada com a PM é a de trazer mais segurança e disciplina para as escolas em áreas de risco social. Em Goiás, já há 60 escolas estaduais militarizadas, com avaliação positiva do governo. Elas têm fila de espera e as vagas são decididas por sorteio. Entre as regras, há a proibição de “mascar chiclete”, “sentar-se no chão estando uniformizado” ou “usar óculos com lentes ou armações de cores esdruxulas, mesmo sendo de grau, boné, tiaras, ligas coloridas ou outros adornos”.

Confira: Estadão