Volta às aulas em fevereiro divide opiniões e gera dúvidas em moradores das periferias de SP

Enquanto algumas famílias anseiam pela volta de forma presencial, mães e professores temem o risco de contágio, mostra reportagem da Folha

Arriscado. Esse é o adjetivo usado por Aline Bezerra da Silva, 31, moradora do Parque Santa Madalena, no distrito de Sapopemba, na zona leste de São Paulo, ao se referir sobre a possível volta às aulas em fevereiro de forma presencial da filha Melissa, 6. Em 2021, a menina vai cursar o primeiro ano do ensino fundamental em uma escola estadual.

Desempregada, a técnica em biblioteconomia divide a casa com os pais que são idosos, o que gera maior motivo de preocupação com a pandemia. “Meus pais já são idosos, minha mãe tem diabetes, pressão alta e isso me preocupa bastante”, afirma. “Apesar de todos nós sabermos que as crianças não costumam desenvolver sintomas fortes pela Covid-19, elas são e podem ser transmissoras, então a volta às aulas presenciais me preocupa”.

Aline tem acompanhado as entrevistas coletivas do governo do estado, mas afirma que os critérios de segurança e de como a organização será feita na prática permanecem confusos. “Eles falam dos cuidados que serão tomados [no plano de retorno às aulas], mas ainda não está muito claro”.

Nesta sexta-feira, 22, o governador João Doria (PSDB) adiou o retorno em uma semana, com início da volta presencial na rede estadual de ensino no dia 8 de fevereiro. Inicialmente, a previsão era para dia 1º de fevereiro, obedecendo um esquema de rodízio. Além disso, a presença não é mais obrigatória durante as fases mais restritivas da pandemia, laranja e vermelha, se aplicando apenas às fases amarela e verde.

A volta gradual vem preocupando também professores da rede pública. “Eu e a maioria dos colegas próximos mantemos a mesma opinião: se não há vacina, não há possibilidade de voltarmos ao presencial. Mesmo que você mantenha um número reduzido de alunos, esse número ao longo do ano tende a aumentar”, argumenta um educador da zona leste, que pediu para não ser identificado com receio de represálias.

Ele atua na profissão há 20 anos. Atualmente leciona em uma escola estadual da capital com alunos do fundamental 2 e do ensino médio. Durante o começo da pandemia, acompanhou de perto as dificuldades vividas por seus alunos com o ensino remoto, como falta de acesso à internet, necessidade de trabalhar para complementar a renda familiar e o desenvolvimento de doenças psicológicas. Apesar disso, considera que esse não seja o melhor momento para voltar à escola. “Não podemos ser movidos pela pressa, devemos ser movidos pela razão”, defende o docente.

Para ele, por mais que as medidas de segurança sejam tomadas, nada garante que a volta não exponha os profissionais da educação e seus familiares à doença em um momento em que há o aumento de casos do Estado e na capital. Apesar do início da campanha de vacinação contra o coronavírus, a data de imunização para professores e profissionais da educação ainda é incerta.

“O governo até o momento não garantiu a vacinação dos profissionais de educação de imediato. Não podemos fazer milagre. O aluno sai de casa, pega ônibus, vai chegar na escola, terá contato com outros colegas”.

‘Volta me ajudaria’

Apesar da preocupação com a pandemia, algumas famílias das periferias são favoráveis pela volta às aulas de forma presencial, principalmente por não terem com quem deixar os filhos devido a necessidade de sair para trabalhar, situação que pode se agravar ainda mais com o possível fim do auxílio emergencial.
É o caso de Karina Ramos de Lucena, 31, moradora do bairro Jardim Santa Tereza, na zona sul, que mora com o filho de três anos, Giovanni. “No meu caso é super importante a volta das aulas, pois me ajudará a cuidar melhor do meu filho”, conta.

Afastada desde o fechamento das escolas no ano passado do cargo de recepcionista em um colégio particular, Karina conseguiu um emprego no começo de janeiro como auxiliar de vendas em um shopping na zona sul. “Consegui uma pessoa para cuidar do meu filho, mas pago R$ 300 somente de segunda à segunda, uma semana sim e outra não”.

Quando não está com a babá, o pequeno fica na casa da avó, de forma temporária, enquanto ela está de férias. Aluno de creche pública desde os sete meses de idade, Giovanni retornará para escola tão breve possível. “Se as aulas voltarem, mandarei meu filho sim”, diz ela.

Quem também vai optar por enviar o filho à escola é a auxiliar de enfermagem Janaína de Medeiros Dias, 34, que é moradora do Parque Regina, na zona sul da capital paulista. No começo da pandemia, ela não tinha com quem deixar o filho, Pedro, 5.

“Tive que deslocar a minha mãe que mora em Belo Horizonte para vir ficar comigo para eu e meu esposo podermos trabalhar, porque a gente não parou em nenhum momento”, relembra.

Leia na íntegra: Folha de S. Paulo