Sem liberação de recursos pelo governo federal, UFSC atrasa pagamento de fornecedores

Em janeiro, universidade deu prioridade aos auxílios estudantis e só quitou a conta de luz nesta semana, com atraso

A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) começou o ano sem recursos suficientes para pagar despesas básicas, como a conta de luz e serviços terceirizados. Isso porque a análise da proposta de lei orçamentária (PLOA) de 2021, que define a estimativa dos Orçamentos da União para este ano, está travada no Congresso Nacional. Até que seja aprovada, o Governo Federal só poderá executar um 18 avos da previsão orçamentária a cada mês. Dessa forma, todos os órgãos federais estão com previsão de receber uma parcela bem menor de recursos. As instituições de ensino superior e técnico estão recebendo em janeiro apenas 2,22% dos recursos anuais a que têm direito.  

Em 2020, o orçamento discricionário da UFSC foi de R$ 140 milhões para o custeio e de R$ 5 milhões para investimentos, totalizando R$ 145 milhões. Neste ano, a previsão é ter apenas R$ 118 milhões para dar conta das despesas básicas. Desse montante, quase 60% estão condicionados, e os outros 40% só serão liberados para uso quando o orçamento para 2021 for homologado pelo Congresso. Segundo o secretário de Planejamento da UFSC, Fernando Richartz, a instituição tem à disposição somente 1/18 do universo de 40% dos recursos totais, o que representa R$ 2,7 milhões. “O valor que nós temos para começar o ano é muito baixo e insuficiente para fazer frente a todas as despesas que a universidade possui”, destaca.

Além disso, existe outro impasse envolvendo a liberação do recurso financeiro, que não é vinculado diretamente ao orçamento, e diz respeito ao quanto de fato é destinado para a universidade pagar as contas empenhadas do mês anterior. O Governo Federal realiza o repasse conforme o volume do que foi gasto mensalmente, porém nos últimos meses a liberação dessa verba está comprometida. O valor que a universidade tem em caixa não cobre as despesas ainda pendentes de dezembro, por exemplo. A instituição deu prioridade para o pagamento dos auxílios estudantis em detrimento de outras contas, como a de energia elétrica. A conta de energia foi paga apenas nesta semana, com atraso, mas outros fornecedores ainda não receberam os valores previstos para janeiro.

A Administração da UFSC entrou em contato com Ministério da Educação (MEC) para tentar viabilizar a liberação de mais recursos, assim como outras instituições. “Já entramos em contato com os fornecedores explicando a situação, pedindo também um pouco de paciência. Assim que o governo liberar o financeiro, vamos efetuar o pagamento”, conclui.

Caso a proposta orçamentária para 2021 seja aprovada pelo Congresso Nacional sem alterações, as universidades e institutos federais do país sofrerão um corte de 18,2% ( cerca de R$ 1 bilhão) no orçamento discricionário, aqueles direcionados para a manutenção das instituições. Nesse contexto, o orçamento da UFSC para custeio e capital será o menor da última década, em mais um ano em que a comunidade universitária continua enfrentando os impactos da pandemia. 

“O que estamos vendo é o desmonte do sistema de produção de conhecimento e de formação em nível superior, pelo menos público. Não é possível que as autoridades fiquem caladas diante de uma situação como essa”, diz Bebeto Marques, presidente da Apufsc. “O governo Bolsonaro é um desastre para todos nós.” Segundo ele, os cortes têm um efeito em cascata e representam um retrocesso enorme em relação ao patamar de produção científica e tecnológica que o Brasil alcançou.

A Apufsc e o Observatório do Conhecimento já vinham alertando para o risco desse cenário desde o ano passado quando a PLOA foi enviada ao Congresso Nacional.

Ao Valor Econômico, o secretário-executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduíno, disse que a situação é preocupante e que o orçamento das instituições deve ser revisto para garantir o pagamento das despesas ordinárias.

O Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes) também não escapou dos cortes, o que coloca em risco a manutenção de bolsas destinadas a alunos de baixa renda, como o auxílio moradia e até o Restaurante Universitário. Nas últimas semanas, depois de pressão da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), o governo liberou todo o recurso previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) para o Pnaes. Mas o problema continua, já que o corte de 18,2% ainda está mantido.

Cortes na ciência

O corte orçamentário atinge também o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), que deverá perder 34% de seu orçamento neste ano. O total previsto para a pasta é de R$ 10,4 bilhões, sendo que apenas R$ 2,8 bilhões desse valor estarão disponíveis para investimentos em pesquisa. Em 2020, o valor era de R$ 4,2 bilhões.

Para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o cenário é ainda mais alarmante. A entidade responsável pelo fomento à pesquisa terá um orçamento 38% menor.

Já o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), principal ferramenta de financiamento à Ciência, Tecnologia & Inovação (CT&I) do País, depende da derrubada dos vetos do presidente Jair Bolsonaro na Lei Complementar n.º 177, que trata dos recursos do Fundo sancionada no dia 12 de janeiro. A nova lei tem origem no Projeto de Lei Complementar (PLP) n.º 135/2020, aprovado em dezembro pelo Congresso Nacional, e coloca 90% dos recursos do FNDCT em reservas de contingência, fiscal ou financeira.

Emily Menezes